Difference between revisions of "Camões e a Algarvia"

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Mário Lyster Franco
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== '''Mário Lyster Franco''' - ''Camões e a Algarvia'' ==
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Camões e a Algarvia
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''Camões e a Algarvia'', da autoria de [https://wikialgarve.pt/autoresalgarvios/index.php/Lyster_Franco,_M%C3%A1rio Mário Lyster Franco], é uma palestra sobre Camões, proferida originalmente em 1945 e 1946 e só publicada anos depois.(1978)
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mobo5 be prettibio...
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* '''Excertos de ''Camões e a Algarvia''''':<br />
Escrita hã bem mais de trinta anos, proferida, primeiro, em Dezembro de 1945, no Sarau do 479 anivérsãrio do Ginásio Clube Farense e, depois, em 29 de Novembro de 1946, na Socie-dade Nacional de Belas Artes, em Lisboa, no fecho da I Exposi-ção Bibliográfica e de Artes Tlásticas do Algarve, realizada na capital, -esquecida no fundo de uma gaveta e sópublicadano "Correio do Sul" dez anos depois, lembraram-se agora os amigos do GRUPO DE ESTUDOS ALGARVIOS de que podia haver interesse em dar a esta palestra aquela divulgação livresca ou mais prò-priamente opuscular, que mais natural seria então tivesse ti-do
 
Isso decerto melhor desculparia certas ingenuidades e fan tasias, a talVez que demasiada brevidade que o A. lhe deu e õ deixar em branco alguns pormenores, defeitos que, porventura, destinando-a a ser ouvida, tomou então por qualidades ede que - sabe-se lá! - talvez sem grande esforço, destinada que vai ser à leitura, pudesse expurga-la agora! Publica-se, no entanto, na sua pureza original. E fácil se torna reconhecer assim que o A. entende que, no revesti-la ago rada erudição que então não teve, por mais certa e brilhante
 
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que ela fosse, não haveria honesto proceder. Teria, de resto, que efectuar leituras e investigações e que embrenhar-Se em problemas que talvez então o tivessem in-teressado mas de que, face a outras preocupações do espirito, se sente de todo afastado no presente. Sem quebra do respeito que merece o labor do falecido Mes tre, julga saber, por exemplo, que 9,qqnceitO,...tofiliano _clã inspiração de Os LuSiadas por D. Francisca de Aragão nunca alcançou perfeito beneplácito dos historiadores e dos críti-cos, tido como mais ou menos sempre foi por cronológicamente inaceitável, e se reconhece que podia fàcilmente desenvolver-o tema como numerosas transcrições poéticas, que dariam ã pli-blicação mais substância, mais conteúdo e maior volúme e afi-velariam mais profundamente não s6 a paixão camoneana,
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'''1. Excerto 1 (Prelúdio)'''<br />
Mas, porém, a que cuidados,
 
mas também a de toda a vasta côrte dos poetas aduladores da "algarvia", confessa que jã não teve paciência para o fazer. De tudo quanto escreveu e deixa escrito, julga,pensa,cal-cula que só talvez apenas o problema que esboçou a volta de Disparates da índia, em que Camões, como que ao geito de re-vindicta, não teve dúvida em malquistar-se com o tio da sua idolatrada, seja o aue permanece por esclarecer definitiva-mente e pode interessar ainda qualquer investigador que nanja ele. Mas, seja como for! Se teve então apenas a pretensã de apresentar a sua palestra, primeiro, como que emgalanteiFait diversa para abrir uma noite de baile e, depois, como simples-diversificação, mais ou menos poética, do fechar de uma expo-sição, não e agora, trinta anos depois, que vai transforma-la e desenvolvê-la, imbuindo-a, decerto que inütilmente, da se-riedade de uma comunicação académica... Camões, mesmo saneado como foi, não precisa - graças a Deus! - da sua achega para 0 imortalidade que possui. E de D. Francisca de Aragão, a quem os próprios herdeiros,não obstan-te as altas posições de que disfrutavam, como quesanearmntam bém não lhe respeitando as últimas vontades, ficará para sem= pre, pelos tempos fora, a recordação, cheia de graça, de uma formosissima donzela que foi o encanto das gentes do seu tem-po. E hoje, tal como outrora, haverá sempre uma mulher bonita para ser o enlevo de qualquer poeta e, apesar de tudo,' vamos lá, um pobre diabo como eu que, com muita ingenuidade então e sem pretensões agora, se disponha a recordar o facto, "Amizade-amorosa", um misto de amor, de amizade, de admi-
 
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ração, de apreço e de ternura, perante a impossibilidade de um enlace, que mais podia Camões ter procurado e encontradona lindíssima quarteirense? Isso chegou para seu consolo! "Camões e a Algarvia"! Pois então?
 
Faro, Junho de 1978
 
M. L. F.
 
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Se, nodiz-e-r---€1-e-;eo-f-iloBrágá,522Amor foi o mó vel principál do.s_pens,amentos e actos" de Camões,sJ-foraffl-Fas as mulheres que Camões amou, concordé="' mos em que ele foi sempre e principalmente - aparte um ou outro triunfo passageiro que lhe não deixou sulcos no coração -, o poeta dos grandes amores in-felizes. Audacioso, valentaço e brigão, ainadaque por a-pregoados pergaminhos e pela fama de bom versejador que alguns amigos dedicados lhe criavam tivessem si do admitido na corte e na roda das boas familias,d: gente "bem" da sua época, o certo e que os venerá-veis papás de então, austeros, rabujentos e barbu-dos como nenhuns outros, viam principalmente nele o "Trinca-fortes" aventureiro e aventuroso, já sabiam que fazer versos - por mais belos e harmoniosos que eles fossem -, não era, positivamente, uma carreira e estavam longe de considera-lo um bom, ou mesmo, apenas, um razoável, um aceitável partido. Por outro lado, parece que o Poeta não devia nada à formosura. E certo que só mais tarde perdeu um olho, mas era ruivo, barbirralo ao tempo dos grandes amores, musculoso, algo desageitado e enor-
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''A modos de prelúdio... <br />Escrita há bem mais de trinta anos, proferida, primeiro, em Dezembro de 1945, no Sarau do aniversário do Ginásio Clube Farense e, depois, em 29 de Novembro de 1946, na Sociedade Nacional de Belas Artes, em Lisboa, no fecho da I Exposição Bibliográfica e de Artes Plásticas do Algarve, realizada na capital, esquecida no fundo de uma gaveta e só publicada no "Correio do Sul" dez anos depois, lembraram-se agora os amigos do GRUPO DE ESTUDOS ALGARVIOS de que podia haver interesse em dar a esta palestra aquela divulgação livresca ou mais propriamente opuscular, que mais natural seria então tivesse tido.<br />Isso decerto melhor desculparia certas ingenuidades e fantasias, a talvez que demasiada brevidade que o A. lhe deu e o deixar em branco alguns pormenores, defeitos que, porventura, destinando-a a ser ouvida, tomou então por qualidades e de que - sabe-se lá! - talvez sem grande esforço, destinada que vai ser à leitura, pudesse expurgá-la agora!<br />Publica-se, no entanto, na sua pureza original. E fácil se torna reconhecer assim que o A. entende que, no revesti-la agora da erudição que então não teve, por mais certa e brilhante que ela fosse, não haveria honesto proceder.(...)<br />In: '''"Camões e a Algarvia!"''' <br />Faro, Junho de 1978 ''
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MARIO LYSTER FRANCO
 
me, de nariz volumoso e adunco, de olhar e vestes sombrias. Quase todos os seus panegiristas não sitam mesmo em chamar-le feio. O encanto,parece que vinha nele apenas da conversa, mas essa não era de molde a limpressionar igualmente todas. Feio e pobre ainda que rico de bravura, de audácia e, sobretudo, de talento, suponho que nada surpreende que a suavi da nos surja cheia de amores mal correspondidos é' cbtitrariados, ou mesmo de amores impossíveis, o que ingénua é mais sério ainda, desde a íngenua priminha, a "me nina dos olhos verdes" das juvenis andanças coiM: bras, o "singular esmalte de beleza", a Belisa das elegias, das éclogas e dos primeiros sonetos, até â decantada e ainda hoje desconhecida Natércia, que tantos cabelos brancos havia de fazer aos seus bió-grafos. E se está hoje por completo posta de parte a lenda manifestamente infeliz, anti-patriótica e derrotísta, criada talvez com intuitos politicos,da sua indigência, e mesmo parece que essa outra bem maís formosa e romântica de ter chegado a erguer os olhais para a própria Infanta D. Maria, a tradição gorosa dos seus amores infelizes mantem-se atra-v, s da história, transparece segura dos seus versos justifica-lhe inteiramente vários passos mais des-concertantes da vida e ë dada como ponto assente. Procurando reconstituir o tipo ideal da Mulher qué o Poeta teria desejado para si, que o Poeta te-ria sonhado, procurando estabelecer o cânon do que teria sido à Eva camoneana, Júlio Dantas, mestre da "Arte de Amar" e nosso comprovinciano a muitos titu los ilustre, dissertou um dia, no Teatro Lírico do Rio, sobre as "Mulheres que Camões amou". O intuito desta ë forçosamente mais restrito. Dos milhentos a mores do Épico, importa-nos, neste momento, apenas focar um. É esse o meu propósito e a ele me circuns crevo, visto que não desejo esquecer, antes de mais nada, que torna mister prender apenas a vossa aten-~ çao durante alguns minutos.
 
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CAMOES E A ALGARVIA
 
Pertencente a uma velha família fidalga, espa-lhada por vários pontos do Pais e mesmo do Algarve, onde os então alcaides-mores de Silves e de Lagos se riam seus parentes e em cujo Morgado de Boina,de um outro parente seu e segundo o parecer desse camoni-anista mago e bruxo que é o nosso queridoMário Saa, teria vindo refugiar-se em 1546, por virtude daque-les amores na Lusa-Atenas a que já fiz referência,o Poeta, "fidalgo cavaleiro da Casa Real" como apare-ce referido num documento descoberto por Juromenha, foi, a certa altura, recebido no Paço. Honraria ambicionada por todos os vates e mes-mo, mo, como e natural, por toda "a gente da epoca,pare-ce não ter sido estranha â satisfação desse desejo de Camões, uma outra apaixonada sua, senhora casada de alta estirpe e de indiscutível seriedade, que te ria achado desse modo a forma airosa e hábil de se ver livre da assiduidade comprometedora daquele ami go de seu marido e que, diga-se, antes de mais nada não ë ainda a mulher que nos interessa. Essa, a algarvia que andou na vida de Camões,se gue-se-lhe na ordem cronológica dos variadissimos a-mores e surge-nos assim logo depois. Era astro de primeira grandeza na Córte que o Poeta passará frequentar e, considerada uma das maiores belezas do seu tempo, naturalissimo era tam bém que todo esse brilho o deslumbrasse. De resto, já o mesmo acontecera com outros poe-tas de segunda plana: Pedro de Andrade Caminha, ri-val do Épico em várias emergências, que lhe dedicou pela vida fora, algumas centenas de poesias em por-^ tugues e castelhano, que já então lhe consagrara a-quele melífluo soneto em que se confessa ... "num puro amor todo desfeito." ... e em cujo ciúme se podem certamente filiar muitas das suas atitudes infelizes e até o epigrama que a
 
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'''2. Excerto 2 (Início)'''
  
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Se, no dizer de Teófilo Braga, o "Amor foi o móvel principal dos pensamentos e atos" de Camões, se foram muitas mulheres que Camões amou, concordemos em que ele foi sempre e principalmente - aparte um ou outro triunfo passageiro que lhe não deixou sulcos no coração -, o poeta dos grandes amores infelizes.<br />Audacioso, valentaço e brigão, ainda que por apregoados pergaminhos e pela fama de bom versejador que alguns amigos dedicados lhe criavam tivessem si do admitido na corte e na roda das boas famílias: gente "bem" da sua época, o certo e que os veneráveis papás de então, austeros, rabugentos e barbudos como nenhuns outros, viam principalmente nele o "Trinca-fortes" aventureiro e aventuroso, já sabiam que fazer versos - por mais belos e harmoniosos que eles fossem -, não era, positivamente, uma carreira e estavam longe de considera-lo um bom, ou mesmo, apenas, um razoável, um aceitável partido.<br />
  
MÁRIO LYSTER FRANCO CAMõES E A ALGARVIA
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'''3. Excerto 3'''
Camões dedicou:
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"Tu dizes que o poeta> há de ter fúria"; D. Manuel de. Portugal, amigo dedicado de Camões, a quem ela inspira nada menos á-é qúai-.-e-ri-ta e cinco pá-ginas de poesias de um cancioneiro manuscrito que e-xiste na Biblioteca Nacional; J:21gelumor que largamente se lhe refere no livro quarto da sua fa-mosa "Diana"; D. António de Almeida, vedor da casa da Rainha; D. Jorge de Menezes e sabe Deus quantos mais, cujos nomes, se pairaram algures sob os olhos azuis da musa singular, nem sequer tiveram a dita de chegar até aos nossos dias. A tudo e a todos a beldade algarvia tinha fica-do insensível. Dir-se-ia que o seu fino espirito sa bia distinguir pródigiosamente o trigo do joio e pa rece ter sido com grande surpreza da cõrte e espan-to de toda a gente, que.essa mulher singular,até en tão inacessível, toda beleza, toda graça, tota periorídade e desdem, que mais parecia uma deusa des cida pelo seu próprio pé do próprio Olimpo, consi-derada, depois da Rainha e das Infantas, a mais al-ta figura feminina do paço, se rendeu aos galan-teios do Poeta, entretendo e mantendo com ele, não, talvez um amor material e arrebatado prõPriamentedi to, mas uma `"terna amizade-amorosa" na feliz expres sao de Júlio Dantas, um amor mixto de adoração, de ,admiração e de ternura, que o acompanhou durante su cessivos anos e que, pela unção espiritual que prir-; cipalmente o caracteriza, constitui uma das mais bJ las paginas da vida, atribulada de Camoes. Foi isto, foi este carinho, Èoi esse amor-amiza de, amor-adoração, amor-ternura, talvez que sem arre batamento, sem encontros comprometedores e sem loU= curas, mas também, muito possivelmente, pela primei ra vez correspondido de um modo leal.e frang9 e tao necessário ao desconforto do seu viver, que o Épico
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D. Francisca de Aragão era filha de Nuno Rodrigues Barreto, alcaide-mor de Faro e vedor da fazenda do Algarve e veio ao mundo em 1536 ou 37,na casa apalaçada da Quinta de Quarteira que seu pai, com aqueles cargos, herdara de seus maiores. Por sua mãe era bisneta do rei D. João II, de Aragão, e Filipe II de Castela tratava-a por sobrinha. Muito nova veio D. Francisca para Lisboa, tendo entrado, com 12 ou 13 anos apenas, ao serviço da Rainha D. Catarina.<br />(...)Formosíssima, "loira, viva, esperta e azougada" no dizer de outro dos seus biógrafos, admirada e estimada por todos - ainda que, certamente, invejada por algumas - logo ela obteve na corte uma situação privilegiada e nela sua, vida decorreu serena e calma, aparte o delicioso romance mantido com Camões, (...)  que lhe deu a principal coroa de glória, e as inflamadas paixões que despertou em todos os vates da época(...).<br />
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encontrou,na algarvia. E esta a Opinião mais rigorosamente fundamenta-da e temos que concordar que nao e pouco. No entanto, repare-se que Teofilo Bragavaimais longe. Para ele, CamõeS tao loucamente apaixonado estava pela nossa'comprovinciana, que ela não é a-penas a Musa inspiradora da maior parte das . suas "Rimas". Ela não é apenas a "Categorizada:-Dama" em quem José Maria Rodrigues pretendeu ver a Infanta D. Maria e cuja lenda ficava dessa forma desfeita. Ela é bem alguma coisa de muito. mais,pois que o Poe ta, inebriado pela sua beleza e deslumbrado pelõ brilho da situação que ela. disfrutava,reconhece que "para merecer essa mulher ideal:era preciso crear u ma obra que se impuzesse a atenção do Mundo".E quan do a Rainha percebe que a sua dama predilecta,esti= mada como uma filha, vai perdendo aquela serenidade olimpica em que sempre se mantivera, vitima do "aba lo amoroso" que o Poeta lhe provocara e faZ afastar. estera o Ribatejo,'"parece que essa paixão empol-gante, em que o Poeta se elevou ao mais extraordina rio lirismo - é Teófilo que está falando - se trans formou inteligentemente numa singela amizade,por um estimulo mais alto". O Poeta, pouco tempo depois, regressa a Cõrte. O perigo,passado o momento crucial, estava conjura-dó. Nestas coisas -de amor ou se triunfa logo ou não se vence nunca e a que fôra e é ainda a sua grande -paixão, calda já .na'realidade da grande diferença social, restituída a augusta serenidade que cáracte ri'za todo o aeu viver, transformando habilIdosameri= te o amor arrebatado. com amizade pura, "pela conver saçao leda asuave.,.. sugeriu aquele .genia_creador, anEpopeia dó "PeitolLusitano". E os galanteioa_das-lumbrantes foraM-SUbstituldoa pelaa-rdealizaçao da Epopeia dos DesabbríMentós Maritimoa;.' para 'a qual os -cronistas e os eruditos chamavam a atençao, dos poetas",
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'''Resumo detalhado e estruturado da conferência de Mário Lyster Franco:'''
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'''1.''' Camões e os seus amores infelizes<br />
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Segundo Teófilo Braga, o amor foi o grande motor da vida de Camões.<br />
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Apesar de ter amado muitas mulheres, os seus amores foram, em geral, infelizes.<br />
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Camões era visto como um aventureiro e brigão, o que não agradava às famílias nobres da época.<br />
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Além disso, não era considerado bonito: ruivo, de nariz adunco e aparência desajeitada, seu principal atrativo era o seu trato e o talento poético.
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As suas paixões foram desde a juventude, em Coimbra, até musas enigmáticas, como a Natércia, inspiradora de muitos de seus versos.<br />
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'''2.''' A presença de D. Francisca de Aragão na vida de Camões<br />
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D. Francisca de Aragão era uma nobre algarvia, considerada uma das mulheres mais belas e influentes da corte de D. João III e D. Sebastião.<br />
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Diferente de outros poetas que a cortejavam, Camões conseguiu cativá-la, embora sua relação tenha sido descrita mais como uma "terna amizade-amorosa" do que um romance arrebatado.<br />
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O amor entre os dois teria sido intenso, mas sem comprometer a reputação da dama, que ocupava uma posição de destaque na corte.<br />
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Para Teófilo Braga, a relação com D. Francisca foi um grande estímulo para Camões: ele percebeu que precisava de criar uma obra grandiosa para estar à altura dela, o que teria levado à escrita de Os Lusíadas.<br />
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'''3.''' A separação de Camões e D. Francisca<br />
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A Rainha D. Catarina, ao perceber o envolvimento da sua dama de companhia com Camões, decidiu afastá-lo da corte, enviando-o para o Ribatejo.<br />
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O romance, transformou-se assim em amizade e respeito mútuo.<br />
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O afastamento do poeta não só evitou escândalos como também o direcionou para o seu grande projeto épico.<br />
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'''4.''' A vida de D. Francisca após Camões<br />
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D. Francisca permaneceu solteira até os 40 anos, quando casou com D. João de Borja, embaixador da Espanha e filho de São Francisco de Borja.<br />
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Tornou-se condessa de Mayalde e Ficalho, acompanhando o marido em missões diplomáticas.<br />
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Faleceu em 1615, desejando ser sepultada em Lisboa, mas acabou sendo enterrada em Valladolid.<br />
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'''5.''' Uma possível ligação entre D. Francisca e as perseguições a Camões na Índia<br />
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O autor levanta a hipótese de que as dificuldades enfrentadas por Camões na Índia não tenham sido apenas resultado das suas sátiras, mas também da ligação com D. Francisca.<br />
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O governador da Índia na época, D. Francisco Barreto, era tio de D. Francisca.<br />
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Pode-se especular que ele tenha perseguido Camões por este ter ousado envolver-se com a sua nobre sobrinha.<br />
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O autor sugere que esta questão ainda não foi explorada a fundo pelos estudiosos e apresenta-a como uma possível nova interpretação dos infortúnios do poeta.<br />
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'''''Mário Lyster Franco (1902-1984)'''<br />
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O Arquivo Distrital de Faro destaca, como documento do mês, o registo de nascimento de um ilustre farense, que dedicou toda a sua vida à divulgação e promoção da região e da cultura algarvia, tanto no Algarve como no resto do país.<br />
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'''Mário Augusto Barbosa Lyster Franco''', filho de '''Carlos Lyster Franco''', pintor e professor no Liceu de Faro e de Maria das Dores Dias Barbosa, doméstica, moradores na rua de S. Francisco, nasceu às 16h30m, do dia 19 de Fevereiro de 1902, na freguesia da Sé, em Faro.<br />
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Formado em direito, dedicou a sua vida à defesa dos interesses da região, à divulgação e promoção da história e da cultura algarvia, participando e organizando conferências, publicando jornais, livros e revistas. Como autor, a sua obra reparte-se entre a arqueologia, a história e a literatura, num total de trinta títulos publicados.<br />
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Foi presidente da Câmara Municipal de Faro durante dois mandatos (1932-34 e 1937-39). Defendeu o turismo como fonte de desenvolvimento regional, sendo o “Guia Turístico do Algarve”, editado em 1940 e 1944, pela Revista Internacional, um exemplo da propaganda regionalista e um incentivo ao turismo da região algarvia.<br />
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Colaborou ao longo da vida em vários jornais nacionais e regionais como redator, tendo assumido, em 1946, a direção do semanário «Correio do Sul», órgão da imprensa algarvia que dirigiu durante mais de quarenta anos.<br />
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A partir de 1980, dedicou -se à elaboração da obra «Algarviana – Subsídios para uma Bibliografia do Algarve e dos Autores Algarvios», obra de investigação de carácter enciclopédico, fonte de utilidade científica e literária, fruto de décadas de investigação, publicando o 1º volume, em 1982 (letras A e B), numa edição da Câmara Municipal de Faro, dois anos antes do seu falecimento, que ocorreria em Camarate, região de Lisboa, a 20 de Agosto de 1984, ficando por publicar, até hoje, os restantes volumes desta obra de referência da região do Algarve.''<br />
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In:<br />https://adfar.dglab.gov.pt/2018/02/02/mario-lyster-franco-1902-1984/<br />2 de Fevereiro de 2018<br />

Latest revision as of 16:55, 12 February 2025

Mário Lyster Franco - Camões e a Algarvia

Lysterfoto.png Lyster Franco, Mário - Camões e a Algarvia - capa.jpg Lyster Franco, Mário - Camões e a Algarvia - palestra Faro.png

LysterJornalAlgarvio.png Lysternotícia.pngLyster Franco, Mário - Camões e a Algarvia - palestra Lisboa.png
Camões e a Algarvia, da autoria de Mário Lyster Franco, é uma palestra sobre Camões, proferida originalmente em 1945 e 1946 e só publicada anos depois.(1978)

  • Excertos de Camões e a Algarvia:

1. Excerto 1 (Prelúdio)

A modos de prelúdio...
Escrita há bem mais de trinta anos, proferida, primeiro, em Dezembro de 1945, no Sarau do aniversário do Ginásio Clube Farense e, depois, em 29 de Novembro de 1946, na Sociedade Nacional de Belas Artes, em Lisboa, no fecho da I Exposição Bibliográfica e de Artes Plásticas do Algarve, realizada na capital, esquecida no fundo de uma gaveta e só publicada no "Correio do Sul" dez anos depois, lembraram-se agora os amigos do GRUPO DE ESTUDOS ALGARVIOS de que podia haver interesse em dar a esta palestra aquela divulgação livresca ou mais propriamente opuscular, que mais natural seria então tivesse tido.
Isso decerto melhor desculparia certas ingenuidades e fantasias, a talvez que demasiada brevidade que o A. lhe deu e o deixar em branco alguns pormenores, defeitos que, porventura, destinando-a a ser ouvida, tomou então por qualidades e de que - sabe-se lá! - talvez sem grande esforço, destinada que vai ser à leitura, pudesse expurgá-la agora!
Publica-se, no entanto, na sua pureza original. E fácil se torna reconhecer assim que o A. entende que, no revesti-la agora da erudição que então não teve, por mais certa e brilhante que ela fosse, não haveria honesto proceder.(...)
In: "Camões e a Algarvia!"
Faro, Junho de 1978


2. Excerto 2 (Início)

Se, no dizer de Teófilo Braga, o "Amor foi o móvel principal dos pensamentos e atos" de Camões, se foram muitas mulheres que Camões amou, concordemos em que ele foi sempre e principalmente - aparte um ou outro triunfo passageiro que lhe não deixou sulcos no coração -, o poeta dos grandes amores infelizes.
Audacioso, valentaço e brigão, ainda que por apregoados pergaminhos e pela fama de bom versejador que alguns amigos dedicados lhe criavam tivessem si do admitido na corte e na roda das boas famílias: gente "bem" da sua época, o certo e que os veneráveis papás de então, austeros, rabugentos e barbudos como nenhuns outros, viam principalmente nele o "Trinca-fortes" aventureiro e aventuroso, já sabiam que fazer versos - por mais belos e harmoniosos que eles fossem -, não era, positivamente, uma carreira e estavam longe de considera-lo um bom, ou mesmo, apenas, um razoável, um aceitável partido.

3. Excerto 3

D. Francisca de Aragão era filha de Nuno Rodrigues Barreto, alcaide-mor de Faro e vedor da fazenda do Algarve e veio ao mundo em 1536 ou 37,na casa apalaçada da Quinta de Quarteira que seu pai, com aqueles cargos, herdara de seus maiores. Por sua mãe era bisneta do rei D. João II, de Aragão, e Filipe II de Castela tratava-a por sobrinha. Muito nova veio D. Francisca para Lisboa, tendo entrado, com 12 ou 13 anos apenas, ao serviço da Rainha D. Catarina.
(...)Formosíssima, "loira, viva, esperta e azougada" no dizer de outro dos seus biógrafos, admirada e estimada por todos - ainda que, certamente, invejada por algumas - logo ela obteve na corte uma situação privilegiada e nela sua, vida decorreu serena e calma, aparte o delicioso romance mantido com Camões, (...) que lhe deu a principal coroa de glória, e as inflamadas paixões que despertou em todos os vates da época(...).


Resumo detalhado e estruturado da conferência de Mário Lyster Franco:

1. Camões e os seus amores infelizes

Segundo Teófilo Braga, o amor foi o grande motor da vida de Camões.
Apesar de ter amado muitas mulheres, os seus amores foram, em geral, infelizes.
Camões era visto como um aventureiro e brigão, o que não agradava às famílias nobres da época.
Além disso, não era considerado bonito: ruivo, de nariz adunco e aparência desajeitada, seu principal atrativo era o seu trato e o talento poético. As suas paixões foram desde a juventude, em Coimbra, até musas enigmáticas, como a Natércia, inspiradora de muitos de seus versos.

2. A presença de D. Francisca de Aragão na vida de Camões

D. Francisca de Aragão era uma nobre algarvia, considerada uma das mulheres mais belas e influentes da corte de D. João III e D. Sebastião.
Diferente de outros poetas que a cortejavam, Camões conseguiu cativá-la, embora sua relação tenha sido descrita mais como uma "terna amizade-amorosa" do que um romance arrebatado.
O amor entre os dois teria sido intenso, mas sem comprometer a reputação da dama, que ocupava uma posição de destaque na corte.
Para Teófilo Braga, a relação com D. Francisca foi um grande estímulo para Camões: ele percebeu que precisava de criar uma obra grandiosa para estar à altura dela, o que teria levado à escrita de Os Lusíadas.

3. A separação de Camões e D. Francisca

A Rainha D. Catarina, ao perceber o envolvimento da sua dama de companhia com Camões, decidiu afastá-lo da corte, enviando-o para o Ribatejo.
O romance, transformou-se assim em amizade e respeito mútuo.
O afastamento do poeta não só evitou escândalos como também o direcionou para o seu grande projeto épico.

4. A vida de D. Francisca após Camões

D. Francisca permaneceu solteira até os 40 anos, quando casou com D. João de Borja, embaixador da Espanha e filho de São Francisco de Borja.
Tornou-se condessa de Mayalde e Ficalho, acompanhando o marido em missões diplomáticas.
Faleceu em 1615, desejando ser sepultada em Lisboa, mas acabou sendo enterrada em Valladolid.

5. Uma possível ligação entre D. Francisca e as perseguições a Camões na Índia

O autor levanta a hipótese de que as dificuldades enfrentadas por Camões na Índia não tenham sido apenas resultado das suas sátiras, mas também da ligação com D. Francisca.
O governador da Índia na época, D. Francisco Barreto, era tio de D. Francisca.
Pode-se especular que ele tenha perseguido Camões por este ter ousado envolver-se com a sua nobre sobrinha.
O autor sugere que esta questão ainda não foi explorada a fundo pelos estudiosos e apresenta-a como uma possível nova interpretação dos infortúnios do poeta.


Mário Lyster Franco (1902-1984)
O Arquivo Distrital de Faro destaca, como documento do mês, o registo de nascimento de um ilustre farense, que dedicou toda a sua vida à divulgação e promoção da região e da cultura algarvia, tanto no Algarve como no resto do país.
Mário Augusto Barbosa Lyster Franco, filho de Carlos Lyster Franco, pintor e professor no Liceu de Faro e de Maria das Dores Dias Barbosa, doméstica, moradores na rua de S. Francisco, nasceu às 16h30m, do dia 19 de Fevereiro de 1902, na freguesia da Sé, em Faro.
Formado em direito, dedicou a sua vida à defesa dos interesses da região, à divulgação e promoção da história e da cultura algarvia, participando e organizando conferências, publicando jornais, livros e revistas. Como autor, a sua obra reparte-se entre a arqueologia, a história e a literatura, num total de trinta títulos publicados.
Foi presidente da Câmara Municipal de Faro durante dois mandatos (1932-34 e 1937-39). Defendeu o turismo como fonte de desenvolvimento regional, sendo o “Guia Turístico do Algarve”, editado em 1940 e 1944, pela Revista Internacional, um exemplo da propaganda regionalista e um incentivo ao turismo da região algarvia.
Colaborou ao longo da vida em vários jornais nacionais e regionais como redator, tendo assumido, em 1946, a direção do semanário «Correio do Sul», órgão da imprensa algarvia que dirigiu durante mais de quarenta anos.
A partir de 1980, dedicou -se à elaboração da obra «Algarviana – Subsídios para uma Bibliografia do Algarve e dos Autores Algarvios», obra de investigação de carácter enciclopédico, fonte de utilidade científica e literária, fruto de décadas de investigação, publicando o 1º volume, em 1982 (letras A e B), numa edição da Câmara Municipal de Faro, dois anos antes do seu falecimento, que ocorreria em Camarate, região de Lisboa, a 20 de Agosto de 1984, ficando por publicar, até hoje, os restantes volumes desta obra de referência da região do Algarve.

In:
https://adfar.dglab.gov.pt/2018/02/02/mario-lyster-franco-1902-1984/
2 de Fevereiro de 2018