Peça de teatro adaptada pelo algarvio Júlio Dantas

From Wikipédia de Autores Algarvios
Revision as of 21:47, 6 November 2024 by Admin (talk | contribs)

Jump to: navigation, search

Júlio Dantas

Camoes Julio-Dantas AutoDeElReiSeleuco1.pngCamoes Julio-Dantas AutoDeElReiSeleucop2.pngCamoes Julio-Dantas AutoDeElReiSeleucop15 .png

Camoes Julio-Dantas AutoDeElReiSeleucop16.pngCamoes Julio-Dantas AutoDeElReiSeleucop17.pngCamoes Julio-Dantas AutoDeElReiSeleucop18.pngCamoes Julio-Dantas AutoDeElReiSeleucop19 .png


MARTIM, vendo rir LANÇAROTE
Que salgado moço, este! — Anda cá. — Zombaste de mim?

ROMÃO, a LANÇAROTE
Como te chamas tu?

LANÇAROTE
Eu nunca me chamo.

MARTIM
Donde és natural?

LANÇAROTE
Donde quer que me acho.

MARTIM
Pergunto-te onde nasceste.

LANÇAROTE
Nas mãos das parteiras.

ROMÃO
Em que terra?

LANÇAROTE
Toda a terra é uma; e mais, eu nasci em casa assobradada, varrida daquela hora, que não havia palmo de terra nela.

MARTIM Bem varrido de vergonha que tu me pareces. Dize: de quem és filho?

LANÇAROTE
Eu?

MARTIM
É para ver com que disparate respondes.

LANÇAROTE
A falar verdade, parece-me a mim que sou filho de um meu tio.
ROMÃO
De teu tio?

MARTIM
E isso como?

LANÇAROTE
Como? Isto, senhor, é adivinhação que vossas mercês não entendem. Meu pai era clérigo; os clérigos sempre chamam aos filhos, sobrinhos; e daqui me ficou a mim ser filho de meu tio.

MARTIM, rindo
Ora te digo que és gracioso.

LANÇAROTE E ainda vossas mercês me não ouviram uma trova. Faço-as tão bem como o Chiado.

ROMÃO
Tu?

LANÇAROTE
E canto-as à viola.

MARTIM, dando-lhe uma viola que está sobre um tamborete
Ora assenta-te aqui. — Vamos lá ouvir uma trova, enquanto não chegam as figuras do Auto.

LANÇAROTE, tomando a viola
Aí vai uma, feita à moça Briolanja, minha dama. — Assoem vossas mercês os engenhos, senão não entendem nada.

Cantando:
Por amor de vós, Briolanja, Ando eu morto, Pesar de meu avô torto...

ROMÃO
Mas que culpa tem teu avô dos desfavores de tua dama?
LANÇAROTE
Pois, senhor, se eu houver de pesar dalguém, não pesarei antes dos meus parentes que dos alheios? — Ora ouçam vossas mercês a volta.

Cantando:
Vossos olhos tão daninhos
Me trataram de feição,
Que não há em meu coração
Nem um trapo para atar dois reis de cominhos.
Meu bem, ando sem focinhos,
Por vós morto,
Pesar de meu avô torto...