Lawrence, D. H. - Livro Proibido
- Lawrence, D. H. (1885 - 1930)
David Herbert Lawrence foi um romancista, contista, poeta e ensaísta inglês. Com um estilo único e altamente controverso foi autor de autor de uma obra provocatória. Hoje, encontramos em edições recentes muitos dos seus livros, entre as quais está "O Amante de Lady Chatterley", que já é um clássico da literatura.
- O Amante de Lady Chatterley
Obra maior da literatura mundial, este clássico da literatura foi um dos livros mais censurados por todo o mundo e proibido durante décadas em muitos paises por alegada obscenidade. Em portugal terá sido censurado em 1970, mas hoje faz parte das listas do Plano Nacional de Leitura sendo recomendado para maiores de 18 anos.
- Excerto 1
Ela continuava imóvel como se estivesse adormecida. Foram dele a atividade e o orgasmo; ela não podia lutar mais. Até o aperto dos seus braços à volta do corpo de Connie, o enérgico movimento de que ela só começou a despertar quando ele acabou e ficou sobre ela, quase ofegante.
Então perguntou a si mesma, vagamente, porquê? Por que é que aquilo era necessário? Por que é que tinha retirado de cima dela uma grande nuvem e lhe dera paz? Seria real? Seria isto real?
Todavia, o seu espírito atormentado de mulher moderna não se deixava tranquilizar. Seria real? Sabia que entregar-se àquele homem era uma realidade; mas sabia também que, tentando conter-se, não seria nada. Estava velha, tinha milhões de anos. E já não conseguia aguentar sozinha a sua carga. Era necessário alguém tomá-la também.
O homem jazia numa imobilidade misteriosa. Que é que ele estaria a sentir? Que é que ele estaria a pensar? Ela não sabia. Ele era um estranho, não o conhecia. Teria de esperar, porque ela não ousava interromper a sua misteriosa quietude. Continuava abraçado a ela, o seu corpo húmido sobre o dela, muito próximo. Totalmente desconhecido. E, apesar de tudo, tranquilo. A sua quietude era serena. Teve consciência disso quando finalmente ele despertou e se afastou dela. Era como um abandono. No escuro, puxou-lhe o vestido até aos joelhos, e por momentos parecia que estava a ajustar as próprias rupas. Depois abriu calmamente a porta e saiu.
Connie viu a lua pequena e muito brilhante que espargia por cima dos carvalhos o seu esplendor. Rapidamente, levantou-se e arranjou-se. Depois caminhou em direção à porta da cabana.
Todo o bosque estava mergulhado na sombra, era quase noite cerrada; no entanto, o céu estava claro como cristal, mas não irradiava claridade.
Ele avançou para ela por entre a penumbra com o rosto levantado como uma mancha pálida.
- Vamos? – perguntou ele.
- Aonde?
- Acompanho-a até ao portão.
Ele resolvia as coisas à sua maneira. Fechou à chave a porta da cabana e seguiu-a.
- Não está arrependida, pois não? – perguntou, enquanto caminhava ao lado dela.
- Não! Não. Você está?
- Arrependido por isso? Não. – Mas pouco depois, acrescentou: - Mas há tudo o resto!
- Qual resto?
- Sir Clifford, as outras pessoas. Todas as complicações.
- Porquê complicações? – perguntou ela, desiludida.
- É sempre assim. Tanto para si como para mim. Há sempre complicações.
Ele continuava a andar com passo firme na escuridão.
- Está arrependido? – perguntou ela, de novo.
- De certo modo – respondeu, olhando para o céu. – Pensei que tudo isso tivesse acabado para mim. Agora recomecei.
- Recomeçou o quê?
- A viver.
- A viver! – repetiu ela, com um estremecimento estranho.
- A vida é isto, não se pode evitar. E quando se evita, mais vale morrer. Por isso não pude evitar mais.
Ela não concordava inteiramente, mas, no entanto…
- É o amor – disse ela, num tom alegra.
- Ou seja o que for – respondeu ele.
Continuaram a atravessar o bosque escuro, em silêncio, até chegarem quase ao portão.
- Mas não me detesta, pois não? – perguntou ela, ansiosa.
- Não, não…,
E subitamente, abraçou-a de novo com força, com a paixão que os tinha unido.
- Não, para mim foi bom, foi bom! E para si?
- Para mim também – respondeu ela, com alguma falsidade, porque tinha estado pouco consciente de tudo.
Ele beijou-a suavemente, com uma ternura apaixonada.
- Se ao menos não houvesse outras pessoas no mundo – disse, lúgubre.
- Excerto 2
“E assim gosto da minha castidade neste momento, porque é como a paz que sobrevém ao amor. Gosto de levar uma vida casta, como as campânulas brancas gostam da neve. Gosto da castidade que é o momento de paz no nosso amor, e que é uma chama branca, muito branca. E quando a Primavera chegar, quando passarmos a viver junto, então poderemos, ao fazer amor, tornar a pequena chama brilhante. Agora é impossível. Agora temos de ser castos, e é bom ser casto, é como um rio de água fria na alma. Gosto da castidade que corre agora entre nós. É água fresca da chuva. Como é possível desejar permanentemente as cansativas aventuras? É terrível ser-se apenas D. Juan e não se ter paz no amor; ser-se como a pequena chama acesa, incapaz de ser casto como ao pé de um rio.
Bem, tantas palavras só porque não te posso tocar. Se pudesse dormir abraçado a ti, a tinta ficaria no tinteiro. Podemos ser castos estando juntos, como podemos sê-lo fazendo amor. Mas, por agora, temos de viver separados, e creio que é realmente mais sensato. Oh! Mas não tenho a certeza.
Não faz mal, não faz mal, não vamos sofrer por isso. Eu acredito realmente na chama e nesse deus cujo nome não sei, mas que não consentirá que se apague. Dentro de mim há tanto de ti que só é pena não poderes estar aqui inteira.
Não te preocupes com Sir Clifford. Se não tiveres notícias dele, não te preocupes. Ele não pode fazer-te mal. Limita-te a esperar, a esperar que ele decida ver-se livre de ti. E, se não for assim, saberemos libertar-nos dele. Mas não, ele acabará por expulsar-te da sua vida como uma criatura abominável.
E, neste momento, não consigo sequer parar de te escrever.
Estamos já muito próximos um do outro. Mas uma grande parte de nós está no outro. É preciso vivermos isso e prepararmo-nos para o nosso encontro. John Thomas despede-se de Lady Jane, um pouco triste, mas cheio de esperança!”