Gomes, Manuel Teixeira - Livros Proibidos

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TeixeiraGomesfoto.jpg Gomes, Manuel Teixeira - Maria Adelaide - capa.jpgGomes, Manuel Teixeira - Maria Adelaide - censura-autorizado-.jpg Gomes, Manuel Teixeira - Novelas Eroticas - capa.jpg

  • Manuel Teixeira Gomes (1860, em Vila Nova de Portimão - Argélia 1941)
Escritor, diplomata, negociante. Foi eleito Presidente da República no dia 6 de agosto de 1923, tendo tomado posse em 5 de outubro, tendo-se exilado na Argélia após o golpe da Ditadura Militar de 1926. Dedicou-se à escrita, tornando-se um ponto de referência no panorama literário português. Escreveu, entre outros, os livros Cartas a Columbano (1932), Novelas Eróticas (1935), Regressos (1935), Miscelânea (1937), Carnaval Literário (1939), Ana Rosa (1941) e Londres Maravilhosa (publicado em 1942, já a título póstumo).No conjunto das suas obras, destacam-se as suas rememorações de episódios eróticos ou de viagem, sobretudo as que escreveu sob a forma de novela. Alguns dos seus livros, como Maria Adelaide (1938) e Novelas Eróticas foram alvo da censura durante o Estado Novo.
  • Livros Proibidos - Novelas Eróticas e Maria Adelaide
O livro Novelas Eróticas (1935) foi autorizado pela censura salazarista só em 1960, aquando da edição da Portugália, mas “sob a condição de apenas ser publicado em tiragem fora do mercado”. Já o romance Maria Adelaide, publicado pela Seara Nova em 1938, seria proibido pelo próprio diretor dos Serviços de Censura, sem revelar motivos pelos quais a camponesa Adelaide não poderia ser personagem de ficção em Portugal. Os sublinhados são inequívocos: passagens eróticas, descrições do corpo feminino, contexto social de pobreza, etc. O livro viria a ser autorizado em 1957.[1]
  • Excerto 1 - A Cigana” in Novelas Eróticas in *Novelas Eróticas, 1989, 3ª ed. (1ª ed. em 1934), , pág. 69.
Tenho ainda nos dedos a impressão que me deixou a pele tépida daquele corpo delicioso, à medida que o ia explorando; e nos lábios, na face, a doçura dos seios agudos e prodigiosamente elásticos… Logo começou o grande duelo de amor, no qual cada um de nós se empenhava em dar melhores provas de valor e resistência. Não sei como, numa das “reprises” acudiu-me a ideia de que era o corpo da minha casta companheira da tarde que eu cingia nos braços, e isso me incutiu novo e estranho ardor. Notou-o a cigana e disse:
- Que amoroso eres, querido.
Entretanto outra ideia me germinava no cérebro, que eu repelia como se fosse um crime, um sacrilégio, mas que acabou por me dominar completamente. Se a minha noiva estivesse no lugar da cigana! Como eu lhe fazia expiar, no seu corpo delicado, de rosas e açucenas, contra terra dura, todos os tormentos que os seus caprichos, os seus desdéns, a sua maldade, me haviam infligido! Ali, contra a terra dura, apertada nos meus braços, que lhe esmagariam a carne, como se fossem de aço, nos espasmos da luxúria. Ali… Mas a cigana, assustada, exclamou:
- Pero que te passa, niño… Que malo eres… me haces daño. Si, que me matas…- e logo, desfalecida: - Alma de mi vida…que me muero…
Acordei já com o sol alto, julgando que a cigana ainda me beijava. Era um cão perdigueiro que me lambia a cara. A cigana desaparecera…
(…) Júlia era com efeito o seu nome, mas no Algarve salvo o amante ninguém mais o sabia. Chamava-se agora Marta, e havia razões especiais que a impediam de usar o outro nome. Ela era natural do Porto e fora, novinha, atirada para a desgraça, de onde o José Cravo a libertara, livrando-a ao mesmo tempo dum mau passo em que involuntariamente caíra, e a obrigara a mudar de nome. Ouvindo-me chamar-lhe Júlia imaginou que eu a conhecera nalguma casa mal afamada, e não se atrevera a resistir, do que já estava arrependida, pois sempre fora fiel ao amante, a quem devia gratidão; além disso ele era capaz de a matar, só que suspeitasse da traição.
Enquanto falava parecia estudar-me o rosto a preceito; por fim o sorriso voltou-lhe aos lábios e começou a olhar-me com simpatia. Disse-lhe então que tencionava ir passar dois ou três dias aos Pegos Verdes, na semana em que entrávamos, e lá teríamos ensejo de conversar largamente sobre o passado e o presente, mas na certeza de que eu não desistia, fosse qual fosse o risco de continuar os deliciosos momentos daquela manhã, salvo se ela sentisse por mim qualquer invencível repugnância e se negasse terminantemente a satisfazer o meu desejo. Protestou com veemência contra a ideia da “invencível repugnância” e para o provar beijou-me na boca, mas entrevia tanto empeço para renovar os nossos encontros que os julgava impossíveis.
- Mas tu podes voltar aqui ao escritório.
- Não sei; isto foi um acaso; e já me ia esquecendo o motivo que cá me trouxe. O meu homem aqui manda esta continha do pedreiro que trabalhou no “monte” e que ele não quis dar ao Sagreira porque não se entendem…
(…)Os meus beijos de despedida foram de fogo, mas ficou-me a impressão de que aqueles com que ela correspondia não eram menos ardentes…
  • Livro Maria Adelaide
"Maria Adelaide" é um romance de amor, onde a paixão devoradora, o cheiro sensual e forte a desejo permanente e gritado, o namoro cortês e “branco” se evidenciam. O eixo deste romance é o nascimento da paixão, a agonia e o fim da relação entre Maria Adelaide, filha do povo, e Ramiro D’Arge, burguês algarvio. No início, o leitor é sub-repticiamente informado de que as duas personagens não reuniam condições comuns para um desenlace feliz.
Esta belíssima obra literária possui todos os matizados, todas as cores que o olho humano distingue. O ouro da costa algarvia, o sol de inverno ligeiramente frio, através dos “pincéis” deste grande epicurista são amplamente oportunos. Manuel Teixeira-Gomes dissolve e recria na escrita, de forma insuperável, as paisagens e as vidas que emocionam e comovem. Esta obra é um deslumbre para os sentidos. O autor preocupa-se em escrever não só para o leitor académico, mas essencialmente para o grande público, dando a conhecer as múltiplas facetas do homem que procura captar a vida pulsante e a paixão que o animara.
  • Excerto 3 - Maria Adelaide
(…) o boticário comunicou-me que a família de Maria Adelaide espalhava por toda a parte que em Lisboa eu lhe dava maus tratos, abandonando-a dias inteiros, no cacifo onde a metera, em companhia de uma velha alcoviteira, enquanto que eu corria pelos teatros e restaurantes caros com mulheres de má vida, minhas antigas relações do tempo de estudante.
Pode calcular-se em que disposição de espírito eu voltaria a casa! Ela lá estava, feita num molhinho, ao canto da cama, e se para ela olhei foi somente para verificar que estava realmente tão abatida e transfigurada que não parecia a mesma.
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