Difference between revisions of "Lefebvre, Henri - Livros Proibidos"

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*'''Henri Lefebvre''' (1901 — 1991)
 
Filósofo, marxista e sociólogo francês. Estudou filosofia na Universidade de Paris, onde se graduou em 1920. Escreveu mais de 70 livros dos quais destacamos "Direito à Cidade" e "A Revolução Urbana". Nos seus livros fez análises do marxismo no século XX à luz dos textos do próprio Marx, mantendo intenso debate com grandes filósofos da época, como Sartre. Em Portugal teve quatro livros censurados entre os quais "O Pensamento de Lenin" (censurado em 1969) e "Marx" (censurado em 1974).<br />[[File:Lefebvre.jpg|40px]] [[File:Henri-Lefebvre-livro-marx.jpg|36px]]
 
  
* Livro Proibido - '''Encontros - Antologia de Autores Modernos''', capítulo '''''Notas breves sobre alguns lugares tornados comuns.'''''<br />
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*'''Henri Lefebvre''' (1901 — 1991)<br />
Nesta Antologia de 1949 foram publicados alguns textos de Henri Lefebvre dos quais reproduzimos alguns excertos.<br />
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Filósofo, marxista e sociólogo francês. Estudou filosofia na Universidade de Paris, onde se graduou em 1920. Escreveu mais de 70 livros dos quais destacamos "Direito à Cidade" e "A Revolução Urbana". Nos seus livros fez análises do marxismo no século XX à luz dos textos do próprio Marx, mantendo intenso debate com grandes filósofos da época, como Sartre. Em Portugal teve quatro livros censurados entre os quais "O Pensamento de Lenin" (censurado em 1969) e "Marx" (censurado em 1974).<br />
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* Livro Proibido - '''Encontros - Antologia de Autores Modernos''' <br />
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Nesta Antologia de 1949 foram publicados alguns textos de Henri Lefebvre dos quais reproduzimos alguns excertos.<br />
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'''Excerto 1'''(em francês)'''''Notes Brèves Sur Quelques Lieux Devenus Communs'''''<br />
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*'''Extrait 1'''<br />
Les Nombres n'ont pas perdu leur prestige mystique.Par une confusion digne de l'an mil, la plupart des artistes et des écrivains, entre 1880 et 1900, se rangèrent parmi les « fins de siècle » et les « décadents ». Par la même confusion, ceux qui apparurent après l'Exposition de 1900 sur la scène littéraire se donnèrent aisément une allure de rénovateurs. Pour le public, pour eux-mêmes, ils représentaient le « nouveau siècle ». La décadence cessait d'être à la mode.<br />Elle cessait d'être à la mode au moment précis où commençait véritablement la décadence, l'agonie convulsive de la civilisation dite « moderne ».Paisiblement mûrie dans la tranquillité et le bonheur de l'autre avant-guerre, la génération des «nouveau-siècle» est arrivée cependant à dominer la période tourmentée et à véhiculer ses « valeurs » jusqu'à ce jour (1945) — de sorte qu'en France, « spirituellement », on assiste depuis près d'un demi-siècle à la plus stupéfiante continuité, guerres et défaites et victoires apparaissant jusqu'ici comme des épisodes qui ne troublent ni l'âme des philistins, ni celle des esthètes.<br />
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'''Notes Brèves Sur Quelques Lieux Devenus Communs'''<br />Les Nombres n'ont pas perdu leur prestige mystique.Par une confusion digne de l'an mil, la plupart des artistes et des écrivains, entre 1880 et 1900, se rangèrent parmi les « fins de siècle » et les « décadents ». Par la même confusion, ceux qui apparurent après l'Exposition de 1900 sur la scène littéraire se donnèrent aisément une allure de rénovateurs. Pour le public, pour eux-mêmes, ils représentaient le « nouveau siècle ». La décadence cessait d'être à la mode.<br />Elle cessait d'être à la mode au moment précis où commençait véritablement la décadence, l'agonie convulsive de la civilisation dite « moderne ».Paisiblement mûrie dans la tranquillité et le bonheur de l'autre avant-guerre, la génération des «nouveau-siècle» est arrivée cependant à dominer la période tourmentée et à véhiculer ses « valeurs » jusqu'à ce jour (1945) — de sorte qu'en France, « spirituellement », on assiste depuis près d'un demi-siècle à la plus stupéfiante continuité, guerres et défaites et victoires apparaissant jusqu'ici comme des épisodes qui ne troublent ni l'âme des philistins, ni celle des esthètes.
  
'''Excerto 1'''(em português)<br />
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*'''Excerto 1'''<br />
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'''Notas breves sobre alguns lugares tornados comuns.'''<br />Os números não perderam o seu prestigio místico. Por uma confusão digna do ano mil, a maioria dos artistas e dos escritores, entre 1880 e 1900, enfileirou entre os «fim do século» e os «decadentes». Por a mesma confusão, aqueles que surgiram na cena literária após a exposição de 1900, puderam facilmente tomar ares de renovadores. Para o público, para si próprios, representavam o «novo século». A decadência deixava de estar na moda.<br />Deixava de estar na moda no momento preciso em que começava verdadeiramente a decadência, a agonia convulsa da civilização chamada «moderna». Amadurecida, sossegadamente, na tranquilidade e na felicidade do outro ante-guerra, a geração do «novo século» chegou, entretanto, a dominar o período atormentado e a transportar os seus «valores» até aos nossos dias (1945)- de modo que em França, «espiritualmente» assiste-se, após quase meio século, à  mais assombrosa continuidade ; guerras, derrotas e vitórias aparecem até aqui como episódios que não perturbam nem a alma nem dos filisteus nem a dos estetas.(Pág. 59-60)
  
Os números não perderam o seu prestigio místico. Por uma confusão digna do ano mil, a maioria dos artistas e dos escritores, entre 1880 e 1900, enfileirou entre os «fim do século» e os «decadentes». Por a mesma confusão, aqueles que surgiram na cena literária após a exposição de 1900, puderam facilmente tomar ares de renovadores. Para o público, para si próprios, representavam o «novo século». A decadência deixava de estar na moda.<br />Deixava de estar na moda no momento preciso em que começava verdadeiramente a decadência, a agonia convulsa da civilização chamada «moderna». Amadurecida, sossegadamente, na tranquilidade e na felicidade do outro ante-guerra, a geração do «novo século» chegou, entretanto, a dominar o período atormentado e a transportar os seus «valores» até aos nossos dias (1945)- de modo que em França, «espiritualmente» assiste-se, após quase meio século, à mais assombrosa continuidade ; guerras, derrotas e vitórias aparecem até aqui como episódios que não perturbam nem a alma nem dos filisteus nem a dos estetas.(Pág. 59-60)<br />
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*'''Excerto 2'''<br />
 
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  '''Notas breves sobre alguns lugares tornados comuns.'''<br />O poeta desdobra-se, insuportavelmente, pois “eu é um outro”, e sabe-o. Mas ele torna a encontrar, ao nível da vida elementar, sensível e na confusão – na nevrose mantida – uma espécie de unidade informe. “Inefável tortura”, acrescenta a carta bem conhecida, pois o poeta “procura mesmo, esgota em si todos os venenos” e todas as formas de sofrimento e de loucura. (Rimbaud Carta de 15 de Maio de 1871). É ao nível do real quotidiano que se opera a alquimia que o transmuda em poesia por meio das palavras. E nos “Chants de Maldoror”, é bem da aproximação imprevista de dois objetos familiares – por exemplo um guarda-chuva e uma máquina de costura sobre uma mesa de dissecção – que surge o efeito da surpresa, o choque simultaneamente intelectual e nervoso, no qual Lautréamont descobre aquilo a que chama ainda a beleza.
*Excerto 2 -
 
O poeta desdobra-se, insuportavelmente, pois “eu é um outro”, e sabe-o. Mas ele torna a encontrar, ao nível da vida elementar, sensível e na confusão – na nevrose mantida – uma espécie de unidade informe. “Inefável tortura”, acrescenta a carta bem conhecida, pois o poeta “procura mesmo, esgota em si todos os venenos” e todas as formas de sofrimento e de loucura. (Rimbaud Carta de 15 de Maio de 1871). É ao nível do real quotidiano que se opera a alquimia que o transmuda em poesia por meio das palavras. E nos “Chants de Maldoror”, é bem da aproximação imprevista de dois objetos familiares – por exemplo um guarda-chuva e uma máquina de costura sobre uma mesa de dissecção – que surge o efeito da surpresa, o choque simultaneamente intelectual e nervoso, no qual Lautréamont descobre aquilo a que chama ainda a beleza.
 
 
                  
 
                  
*Excerto 3  
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*'''Excerto 3'''<br />
  A antiga sabedoria sabia que a velhice é um mal pior que a morte. Os nossos metafísicos que tanto nos falam do “outro – diferente do ser” (para imitar uma vez mais o seu palavreado), não nos falam muito da velhice. É que este pensamento nada tem de excitante ou do outro mundo. É apenas uma triste realidade; e, no entanto, este pensamento diz-nos o que temos a vencer, imediatamente e em cada um de nós, ainda que sejamos muito jovens, e em todos os instantes da vida quotidiana. Sabe-se, muito bem, por outro lado, que a velhice não tem necessidade de procurar o pensamento da morte, que vem só por si, sem nada trazer. Mas se a juventude sente a necessidade de pensar na morte para estimular o desejo de viver; só ela se proclama com orgulho, julgando-se carregada de verdade pelo simples facto de ser juventude – e se, ao mesmo tempo, ela emurchece com o pensamento obsidiante da morte, então é preciso lamentá-la por essa velhice prematura!<br />A filosofia aliou-se, portanto, com a literatura nesta grande conspiração contra a vida quotidiana do homem.
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  '''Notas breves sobre alguns lugares tornados comuns.'''<br />A antiga sabedoria sabia que a velhice é um mal pior que a morte. Os nossos metafísicos que tanto nos falam do “outro – diferente do ser” (para imitar uma vez mais o seu palavreado), não nos falam muito da velhice. É que este pensamento nada tem de excitante ou do outro mundo. É apenas uma triste realidade; e, no entanto, este pensamento diz-nos o que temos a vencer, imediatamente e em cada um de nós, ainda que sejamos muito jovens, e em todos os instantes da vida quotidiana. Sabe-se, muito bem, por outro lado, que a velhice não tem necessidade de procurar o pensamento da morte, que vem só por si, sem nada trazer. Mas se a juventude sente a necessidade de pensar na morte para estimular o desejo de viver; só ela se proclama com orgulho, julgando-se carregada de verdade pelo simples facto de ser juventude – e se, ao mesmo tempo, ela emurchece com o pensamento obsidiante da morte, então é preciso lamentá-la por essa velhice prematura!<br />A filosofia aliou-se, portanto, com a literatura nesta grande conspiração contra a vida quotidiana do homem.
 
                  
 
                  
 
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  • Henri Lefebvre (1901 — 1991)

Filósofo, marxista e sociólogo francês. Estudou filosofia na Universidade de Paris, onde se graduou em 1920. Escreveu mais de 70 livros dos quais destacamos "Direito à Cidade" e "A Revolução Urbana". Nos seus livros fez análises do marxismo no século XX à luz dos textos do próprio Marx, mantendo intenso debate com grandes filósofos da época, como Sartre. Em Portugal teve quatro livros censurados entre os quais "O Pensamento de Lenin" (censurado em 1969) e "Marx" (censurado em 1974).

  • Livro Proibido - Encontros - Antologia de Autores Modernos

Nesta Antologia de 1949 foram publicados alguns textos de Henri Lefebvre dos quais reproduzimos alguns excertos.
Encontro-Antologia-de-Autores-Modernos-censura-excerto.jpg

  • Extrait 1
Notes Brèves Sur Quelques Lieux Devenus Communs
Les Nombres n'ont pas perdu leur prestige mystique.Par une confusion digne de l'an mil, la plupart des artistes et des écrivains, entre 1880 et 1900, se rangèrent parmi les « fins de siècle » et les « décadents ». Par la même confusion, ceux qui apparurent après l'Exposition de 1900 sur la scène littéraire se donnèrent aisément une allure de rénovateurs. Pour le public, pour eux-mêmes, ils représentaient le « nouveau siècle ». La décadence cessait d'être à la mode.
Elle cessait d'être à la mode au moment précis où commençait véritablement la décadence, l'agonie convulsive de la civilisation dite « moderne ».Paisiblement mûrie dans la tranquillité et le bonheur de l'autre avant-guerre, la génération des «nouveau-siècle» est arrivée cependant à dominer la période tourmentée et à véhiculer ses « valeurs » jusqu'à ce jour (1945) — de sorte qu'en France, « spirituellement », on assiste depuis près d'un demi-siècle à la plus stupéfiante continuité, guerres et défaites et victoires apparaissant jusqu'ici comme des épisodes qui ne troublent ni l'âme des philistins, ni celle des esthètes.
  • Excerto 1
Notas breves sobre alguns lugares tornados comuns.
Os números não perderam o seu prestigio místico. Por uma confusão digna do ano mil, a maioria dos artistas e dos escritores, entre 1880 e 1900, enfileirou entre os «fim do século» e os «decadentes». Por a mesma confusão, aqueles que surgiram na cena literária após a exposição de 1900, puderam facilmente tomar ares de renovadores. Para o público, para si próprios, representavam o «novo século». A decadência deixava de estar na moda.
Deixava de estar na moda no momento preciso em que começava verdadeiramente a decadência, a agonia convulsa da civilização chamada «moderna». Amadurecida, sossegadamente, na tranquilidade e na felicidade do outro ante-guerra, a geração do «novo século» chegou, entretanto, a dominar o período atormentado e a transportar os seus «valores» até aos nossos dias (1945)- de modo que em França, «espiritualmente» assiste-se, após quase meio século, à mais assombrosa continuidade ; guerras, derrotas e vitórias aparecem até aqui como episódios que não perturbam nem a alma nem dos filisteus nem a dos estetas.(Pág. 59-60)
  • Excerto 2
Notas breves sobre alguns lugares tornados comuns.
O poeta desdobra-se, insuportavelmente, pois “eu é um outro”, e sabe-o. Mas ele torna a encontrar, ao nível da vida elementar, sensível e na confusão – na nevrose mantida – uma espécie de unidade informe. “Inefável tortura”, acrescenta a carta bem conhecida, pois o poeta “procura mesmo, esgota em si todos os venenos” e todas as formas de sofrimento e de loucura. (Rimbaud Carta de 15 de Maio de 1871). É ao nível do real quotidiano que se opera a alquimia que o transmuda em poesia por meio das palavras. E nos “Chants de Maldoror”, é bem da aproximação imprevista de dois objetos familiares – por exemplo um guarda-chuva e uma máquina de costura sobre uma mesa de dissecção – que surge o efeito da surpresa, o choque simultaneamente intelectual e nervoso, no qual Lautréamont descobre aquilo a que chama ainda a beleza.
  • Excerto 3
Notas breves sobre alguns lugares tornados comuns.
A antiga sabedoria sabia que a velhice é um mal pior que a morte. Os nossos metafísicos que tanto nos falam do “outro – diferente do ser” (para imitar uma vez mais o seu palavreado), não nos falam muito da velhice. É que este pensamento nada tem de excitante ou do outro mundo. É apenas uma triste realidade; e, no entanto, este pensamento diz-nos o que temos a vencer, imediatamente e em cada um de nós, ainda que sejamos muito jovens, e em todos os instantes da vida quotidiana. Sabe-se, muito bem, por outro lado, que a velhice não tem necessidade de procurar o pensamento da morte, que vem só por si, sem nada trazer. Mas se a juventude sente a necessidade de pensar na morte para estimular o desejo de viver; só ela se proclama com orgulho, julgando-se carregada de verdade pelo simples facto de ser juventude – e se, ao mesmo tempo, ela emurchece com o pensamento obsidiante da morte, então é preciso lamentá-la por essa velhice prematura!
A filosofia aliou-se, portanto, com a literatura nesta grande conspiração contra a vida quotidiana do homem.
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