Difference between revisions of "Filipe, Daniel - Livro Proibido"

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'''DANIEL FILIPE (1925 – 1964)'''
 
'''DANIEL FILIPE (1925 – 1964)'''
  
'''Daniel''' Damásio Ascensão '''Filipe''' nasceu em Cabo Verde, Ilha da Boavista, em 11 de Dezembro de 1925 e morreu em Lisboa, a 6 de Abril de 1964.
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'''Daniel''' Damásio Ascensão '''Filipe''' nasceu em Cabo Verde, Ilha da Boavista, em 11 de Dezembro de 1925 e morreu em Lisboa, a 6 de Abril de 1964.<br />Combatente contra a ditadura de Salazar, perseguido e torturado pela PIDE, é um poeta nascido em Cabo Verde e que faz parte da história da Literatura Portuguesa do século XX.<br />Obras publicadas: Missiva (1946), Marinheiro em Terra (1949), O Viageiro Solitário (1951), Recado para a Amiga Distante (1956), A Ilha e a Solidão (1957), O Manuscrito na Garrafa (romance, 1960 - censurado pela PIDE), A Invenção do Amor (1961), Pátria, Lugar de Exílio (1963).
Combatente contra a ditadura de Salazar, perseguido e torturado pela PIDE, é um poeta nascido em Cabo Verde e que faz parte da história da Literatura Portuguesa do século XX.
 
Obras publicadas: Missiva (1946), Marinheiro em Terra (1949), O Viageiro Solitário (1951), Recado para a Amiga Distante (1956), A Ilha e a Solidão (1957), O Manuscrito na Garrafa (romance, 1960 - censurado pela PIDE), A Invenção do Amor (1961), Pátria, Lugar de Exílio (1963).
 
  
  
'''A Invenção do Amor'''
 
Em todas as esquinas da cidade
 
nas paredes dos bares à porta dos edifícios públicos nas
 
janelas dos autocarros
 
mesmo naquele muro arruinado por entre anúncios de apa-
 
relhos de rádio e detergentes
 
na vitrine da pequena loja onde não entra ninguém
 
no átrio da estação de caminhos de ferro que foi o lar da
 
nossa esperança de fuga
 
um cartaz denuncia o nosso amor
 
  
Em letras enormes do tamanho
 
do medo da solidão da angústia
 
um cartaz denuncia que um homem e uma mulher
 
se encontraram num bar de hotel
 
numa tarde de chuva
 
entre zunidos de conversa
 
e inventaram o amor com carácter de urgência
 
deixando cair dos ombros o fardo incómodo da monotonia
 
quotidiana
 
  
Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração e
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'''A Invenção do Amor'''<br />
fome de ternura
 
e souberam entender-se sem palavras inúteis
 
Apenas o silêncio A descoberta A estranheza
 
de um sorriso natural e inesperado
 
 
 
Não saíram de mãos dadas para a humidade diurna
 
Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente
 
embora subterraneamente unidos pela invenção conjunta
 
de um amor subitamente imperativo
 
 
 
Um homem uma mulher um cartaz de denúncia
 
colado em todas as esquinas da cidade
 
A rádio já falou A TV anuncia
 
iminente a captura A polícia de costumes avisada
 
procura os dois amantes nos becos e avenidas
 
Onde houver uma flor rubra e essencial
 
é possível que se escondam tremendo a cada batida na porta
 
fechada para o mundo
 
É preciso encontrá-los antes que seja tarde
 
Antes que o exemplo frutifique Antes
 
que a invenção do amor se processe em cadeia
 
 
 
Há pesadas sanções para os que auxiliarem os fugitivos
 
  
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Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração e<br />
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Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente<br />
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A rádio já falou A TV anuncia<br />
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Esta é a primeira canção do seu primeiro disco "Portugal Angola - Chants de Lutte" de 1964 e reeditada no LP "Meu País" de 1970. Poema do seu grande amigo e poeta, Daniel Filipe.
 
Esta é a primeira canção do seu primeiro disco "Portugal Angola - Chants de Lutte" de 1964 e reeditada no LP "Meu País" de 1970. Poema do seu grande amigo e poeta, Daniel Filipe.
  
Meu país meu pais
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Meu país meu pais<br />
Do céu límpido calmo
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Do céu límpido calmo<br />
De campos cultivados
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De campos cultivados<br />
De praias e montanhas.
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De praias e montanhas.<br />
 
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É para ti meu canto
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É para ti meu canto<br />
A minha esperança.
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A minha esperança.<br />
 
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Ouço a tua voz triste
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Ouço a tua voz triste<br />
Oh, meu país sem culpa
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Oh, meu país sem culpa<br />
Ouço-a nos dias mornos
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Ouço-a nos dias mornos<br />
No amanhecer cinzento.
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No amanhecer cinzento.<br />
 
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E é para ti meu canto
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E é para ti meu canto<br />
A minha esperança.
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A minha esperança.<br />
 
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Meu país onde a traição domina
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Meu país onde a traição domina<br />
E o medo assoma nas encruzilhadas
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E o medo assoma nas encruzilhadas<br />
Meu país de prisões e covardias
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Meu país de prisões e covardias<br />
E de ladrões de estradas.
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E de ladrões de estradas.<br />
 
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Meu país de operários
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Meu país de operários<br />
Cavadores, marinheiros
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Cavadores, marinheiros<br />
Meu país de mãos grossas
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Meu país de mãos grossas<br />
Plebeu, sensual, resistente.
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Plebeu, sensual, resistente.<br />
 
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É para ti meu canto
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É para ti meu canto<br />
A minha esperança.
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A minha esperança.<br />
 
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Para ti meu país
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Para ti meu país<br />
Levanto a minha voz sobre o silêncio
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Levanto a minha voz sobre o silêncio<br />
Desta noite de angústias
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Desta noite de angústias<br />
E de medos.
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E de medos.<br />
 
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Nada pode calar
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Nada pode calar<br />
O nosso riso aberto
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O nosso riso aberto<br />
Ei-lo que invade
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Ei-lo que invade<br />
A terra portuguesa
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A terra portuguesa<br />
E vozes juvenis formam o coro.
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E vozes juvenis formam o coro.<br />
 
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Por isso é para ti meu canto
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Por isso é para ti meu canto<br />
A minha esperança.
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A minha esperança.<br />
 
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Já ouço passos,
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Já ouço passos,<br />
Veem na distância
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Veem na distância<br />
Desfraldando bandeiras e cantando
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Desfraldando bandeiras e cantando<br />
E é para ti oh! meu país liberto
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E é para ti oh! meu país liberto<br />
O seu canto de esperança e claridade.
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O seu canto de esperança e claridade.<br />
 
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Para saber mais sobre Luís Cília aceda a www.luiscilia.com.
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Para saber mais sobre Luís Cília aceda a: www.luiscilia.com.

Revision as of 12:51, 16 April 2024


DANIEL FILIPE (1925 – 1964)

Daniel Damásio Ascensão Filipe nasceu em Cabo Verde, Ilha da Boavista, em 11 de Dezembro de 1925 e morreu em Lisboa, a 6 de Abril de 1964.
Combatente contra a ditadura de Salazar, perseguido e torturado pela PIDE, é um poeta nascido em Cabo Verde e que faz parte da história da Literatura Portuguesa do século XX.
Obras publicadas: Missiva (1946), Marinheiro em Terra (1949), O Viageiro Solitário (1951), Recado para a Amiga Distante (1956), A Ilha e a Solidão (1957), O Manuscrito na Garrafa (romance, 1960 - censurado pela PIDE), A Invenção do Amor (1961), Pátria, Lugar de Exílio (1963).



A Invenção do Amor

Em todas as esquinas da cidade
nas paredes dos bares à porta dos edifícios públicos nas
janelas dos autocarros
mesmo naquele muro arruinado por entre anúncios de aparelhos de rádio e detergentes
na vitrine da pequena loja onde não entra ninguém
no átrio da estação de caminhos de ferro que foi o lar da
nossa esperança de fuga
um cartaz denuncia o nosso amor

Em letras enormes do tamanho
do medo da solidão da angústia
um cartaz denuncia que um homem e uma mulher
se encontraram num bar de hotel
numa tarde de chuva
entre zunidos de conversa
e inventaram o amor com carácter de urgência
deixando cair dos ombros o fardo incómodo da monotonia
quotidiana

Um homem e uma mulher que tinham olhos e coração e
fome de ternura
e souberam entender-se sem palavras inúteis
Apenas o silêncio A descoberta A estranheza
de um sorriso natural e inesperado

Não saíram de mãos dadas para a humidade diurna
Despediram-se e cada um tomou um rumo diferente
embora subterraneamente unidos pela invenção conjunta
de um amor subitamente imperativo

Um homem uma mulher um cartaz de denúncia
colado em todas as esquinas da cidade
A rádio já falou A TV anuncia
iminente a captura A polícia de costumes avisada
procura os dois amantes nos becos e avenidas
Onde houver uma flor rubra e essencial
é possível que se escondam tremendo a cada batida na porta
fechada para o mundo
É preciso encontrá-los antes que seja tarde
Antes que o exemplo frutifique Antes
que a invenção do amor se processe em cadeia

Há pesadas sanções para os que auxiliarem os fugitivos

(...) Daniel Filipe, in 'A Invenção do Amor e Outros Poemas'



https://www.youtube.com/watch?v=ne13E7LzEYI

1964 - Luís Cília - "Meu país"

Esta é a primeira canção do seu primeiro disco "Portugal Angola - Chants de Lutte" de 1964 e reeditada no LP "Meu País" de 1970. Poema do seu grande amigo e poeta, Daniel Filipe.

Meu país meu pais
Do céu límpido calmo
De campos cultivados
De praias e montanhas.

É para ti meu canto
A minha esperança.

Ouço a tua voz triste
Oh, meu país sem culpa
Ouço-a nos dias mornos
No amanhecer cinzento.

E é para ti meu canto
A minha esperança.

Meu país onde a traição domina
E o medo assoma nas encruzilhadas
Meu país de prisões e covardias
E de ladrões de estradas.

Meu país de operários
Cavadores, marinheiros
Meu país de mãos grossas
Plebeu, sensual, resistente.

É para ti meu canto
A minha esperança.

Para ti meu país
Levanto a minha voz sobre o silêncio
Desta noite de angústias
E de medos.

Nada pode calar
O nosso riso aberto
Ei-lo que invade
A terra portuguesa
E vozes juvenis formam o coro.

Por isso é para ti meu canto
A minha esperança.

Já ouço passos,
Veem na distância
Desfraldando bandeiras e cantando
E é para ti oh! meu país liberto
O seu canto de esperança e claridade.

Para saber mais sobre Luís Cília aceda a: www.luiscilia.com.