Difference between revisions of "Costa, Orlando da - Livros Proibidos"

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'''Orlando da Costa'''escritor goês tagoreano, que nasceu em Moçambique, embora morasse em criança e jovem em Goa e mais tarde viesse para Portugal, o pai do primeiro-ministro português António Costa, e do jornalista Ricardo Costa.<br />Iniciou a sua carreira literária com a publicação de obras de poesia situadas no contexto de uma segunda geração neorrealista, '''A Estrada e a Voz''' (1951), '''Os Olhos sem Fronteira''' (1953) e '''Sete Odes do Canto Comum''' (1955), todos editados pela coleção “Cancioneiro Geral” e proibida a sua difusão pela PIDE. Nessas coletâneas, dá continuidade a uma poesia empenhada, de exortação fraterna e de esperança, evocando os “homens que a estrada juntou” e “que a estrada batizou” (Batismo), caminhando para um “horizonte (que) será de espigas” (“Vertente”). Afirmou-se, na década seguinte, no domínio da ficção com '''O Signo da Ira''' (1961) e '''Podem Chamar-me Eurídice''' (1964), romances de intenção social que seriam proibidos pela censura, sendo, ao primeiro romance, só levantada a sua proibição após ter recebido o Prémio Ricardo Malheiros, em 1962. As mesmas dificuldades seriam levantadas a '''Podem Chamar-me Eurídice''', apenas amplamente difundido em 1974.<br />Foi preso três vezes pela Pide. Da última vez, permaneceu no cárcere em Caxias por cinco meses e uma semana, acusado de militar em defesa da paz”<br />
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*'''Orlando da Costa''' (1929 — 2006)
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Romancista, poeta e ''copywritter''. Nasceu em Moçambique, viveu em Goa e mais tarde em Portugal, pai do primeiro-ministro português António Costa e do jornalista Ricardo Costa. Licenciado em Ciências Histórico-Filosóficas foi professor até a PIDE o proibir de ensinar. Defensor de ideais democráticos e progressista esteve sempre na linha da frente dos combates antifascistas, militou no MUD Juvenil, envolveu-se em iniciativas antifascistas e em candidaturas eleitorais. Esteve preso três vezes pela Pide. Na última prisão permaneceu na cadeia de Caxias durante cinco meses, acusado de militar em defesa da Paz.
  
Os seus livros de poesia, como '''A Estrada e a Voz''', '''Os Olhos sem Fronteira''' e '''Sete Odes do Canto Comum''' circularam amiúde entre os amigos e os intelectuais, mas '''O Signo da Ira''', totalmente passado em Goa (Prémio Ricardo Malheiros, Academia das Ciências de Lisboa, 1961), vendeu dez mil exemplares, apesar de a PIDE o ter proibido de circular. A mulher, em seus anseios, fragilidades e força, esteve sempre no centro da sua prosa, como em '''Podem Chamar-me Eurídice''' (outro dos seus livros que foram proibidos pela polícia política portuguesa) ou em '''Os Netos de Norton''', livro que lhe valeu o Prémio Eça de Queiroz, da Câmara Municipal de Lisboa. Orlando converteu-se no sétimo autor português com mais livros proibidos pela censura do Estado Novo (cinco no total).
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*Livro proibido - '''Sete Odes do Canto Comum'''
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'''Orlando da Costa''' foi um dos autores portugueses com mais livros proibidos pela censura do Estado Novo (cinco no total). Em relação à obra '''Sete Odes do Canto Comum''', o leitor dos Serviços de Censura sugeriu a sua proibição por serem «sete poesias de índole pacifista e comunista, e dedicadas a pessoas que professam ideias comunistas». Essas pessoas eram o escritor '''Armindo Rodrigues''' (1904-1993), o poeta francês '''Paul Éluard''' (1895-1952), a jornalista '''Maria Antónia Palla''' (que veio a ser sua mulher), os militantes comunistas '''Carlos e Maria Adelaide Aboim Inglez''' e a feminista '''Maria Lamas''' (1893-1983). Nesse tempo, eram suficientes as '''Dedicatórias''' para se proibir um livro! [https://www.uc.pt/bguc/atividades/livros-proibidos-durante-o-estado-novo/sete-odes-do-canto-comum/]<br />[[File:Costa, Orlando da - Sete Odes do Canto Comum - censura-excerto.jpg|600px]]
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*'''''Ode Quarta''''' À Maria Antónia'' (pág. 25 e 26) [[File:Ouvir-.png|18px|link=https://agr-tc.pt/bibliotecas/leituras-em-liberdade-25deabril50anos/Costa_Orlando-da-Livro-SeteOdesDoCantoComum-PoemaOdeComum-AMariaAntonia-lido-por-EvaAgostinho-e-CarinSilva.wav]]&nbsp; [https://agr-tc.pt/bibliotecas/leituras-em-liberdade-25deabril50anos/Costa_Orlando-da-Livro-SeteOdesDoCantoComum-PoemaOdeComum-AMariaAntonia-lido-por-EvaAgostinho-e-CarinSilva.wav lido por Eva Agostinho e Carina Silva da turma PIA3]&nbsp;&nbsp;
  
'''Sete Odes do Canto Comum, Orlando da Costa'''<br />
 
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'''Ode Quarta'''<br />
 
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Em cada instante de vida<br />
 
Em cada instante de vida<br />
 
Cabe a pátria do nosso amor<br />
 
Cabe a pátria do nosso amor<br />
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E neles a sede que transforma os rios<br />
 
E neles a sede que transforma os rios<br />
 
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Em cada instante de vida<br />
 
Em cada instante de vida<br />
 
Cabe a pátria do nosso amor<br />
 
Cabe a pátria do nosso amor<br />
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Cabe a pátria do nosso amor<br />
 
Cabe a pátria do nosso amor<br />
 
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*'''''Ode Sexta''''' (Pág. 33 e 34).
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''À Maria Lamas''<br />
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«Porque trazes na voz a voz das companheiras<br />
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Companheira te chamamos<br />
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Porque no teu olhar se alargam os olhos que semeiam e vigiam<br />
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O sol a todas as alturas o sol dos meninos e das colheitas<br />
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Porque nele se tornam mais límpidos os límpidos olhos das namoradas<br />
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Companheira te chamamos<br />
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(…)<br />
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Porque até o sol remoça na neve tranquila dos teus cabelos<br />
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E o vento sopra-te com a mesma força que a nós<br />
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Companheira te chamamos<br />
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Porque as palavras na tua boca<br />
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Têm a medida do mundo e a face dos mortais<br />
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Porque no teu ventre a fome e a vida se completaram<br />
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Porque no teu rosto fala o tempo até nós<br />
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Mãe te chamaríamos<br />
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Companheira te chamamos.»<br />
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Primeira edição de uma das mais importantes obras de '''Orlando da Costa''' publicada em 1964. Lê-se no Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, que «Podem Chamar-me Eurídice... apresenta-se como um romance cujas linguagem e temática não devem ser desligadas da circunstância que as incubou: as perseguições político-domiciliárias da polícia salazarista, a clandestinidade, o cinzentismo da Lisboa dos anos sessenta – o amor, apesar de tudo.» Não surpreende, assim, que este livro tenha sido proibido pela Censura e apreendido pela PIDE aquando da sua publicação.[https://oeiras-a-ler.blogspot.com/2016/03/livros-proibidos-ciclo-de-conversas.html]<br />Trata-se de uma obra publicada em 1964, que relata uma história de amor que tem no contexto histórico a vivência da clandestinidade e repressão da subversão universitária dos anos 60. É também uma metáfora do assassínio do escultor José Dias Coelho, abatido a tiro por agentes da PIDE. Todo este contexto literário e a força narrativa, na defesa de um Estado onde os valores da liberdade, da solidariedade e da democracia fossem efetivamente uma realidade, motivaram um processo de censura e proibição acérrimo, transformando este livro num dos textos capitais do Index do Estado Novo em Portugal.[https://horasextraordinarias.blogs.sapo.pt/livros-proibidos-353823]
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OrlandodaCostafoto.jpg Costa-OrlandoDa-seteOdesDoCantoComum-capa.jpg Costa, Orlando da - Sete Odes do Canto Comum - censura.jpg

  • Orlando da Costa (1929 — 2006)
Romancista, poeta e copywritter. Nasceu em Moçambique, viveu em Goa e mais tarde em Portugal, pai do primeiro-ministro português António Costa e do jornalista Ricardo Costa. Licenciado em Ciências Histórico-Filosóficas foi professor até a PIDE o proibir de ensinar. Defensor de ideais democráticos e progressista esteve sempre na linha da frente dos combates antifascistas, militou no MUD Juvenil, envolveu-se em iniciativas antifascistas e em candidaturas eleitorais. Esteve preso três vezes pela Pide. Na última prisão permaneceu na cadeia de Caxias durante cinco meses, acusado de militar em defesa da Paz.
  • Livro proibido - Sete Odes do Canto Comum
Orlando da Costa foi um dos autores portugueses com mais livros proibidos pela censura do Estado Novo (cinco no total). Em relação à obra Sete Odes do Canto Comum, o leitor dos Serviços de Censura sugeriu a sua proibição por serem «sete poesias de índole pacifista e comunista, e dedicadas a pessoas que professam ideias comunistas». Essas pessoas eram o escritor Armindo Rodrigues (1904-1993), o poeta francês Paul Éluard (1895-1952), a jornalista Maria Antónia Palla (que veio a ser sua mulher), os militantes comunistas Carlos e Maria Adelaide Aboim Inglez e a feminista Maria Lamas (1893-1983). Nesse tempo, eram suficientes as Dedicatórias para se proibir um livro! [1]
Costa, Orlando da - Sete Odes do Canto Comum - censura-excerto.jpg

Em cada instante de vida
Cabe a pátria do nosso amor

Cabe o rosto das papoilas na fome das raízes
O vento que ronda as margens mais sombrias
Que ronda e não chora nos teus olhos
O rosto das companheiras

Como se regressasses de uma noite indefesa
A serena esperança das manhãs
Eu bebo o vento despido nos teus olhos
E nele o sol bravio dos vinhedos

Bebo o vento despido nos teus olhos
Desgrenhado e rumoroso o vento das noites decepadas
Ao dorso magoado dos dias

Como se regressasse de uma noite indefesa
E no teu rosto amanhecesse de repente
A alegria dos homens e dos bichos
Eu bebo nos teus lábios as palavras
E nelas a firmeza da terra renovada
Bebo o vento despido nos teus olhos
E neles a sede que transforma os rios

Em cada instante de vida
Cabe a pátria do nosso amor

Cabe a linguagem dos homens
E o canto das aves que se encontram pressurosas
A linguagem dos homens nas máquinas de paz
Onde no esforço das madrugadas
Renascem as vozes do canto comum

Em cada instante de vida
Cabe a pátria do nosso amor

  • Ode Sexta (Pág. 33 e 34).

À Maria Lamas

«Porque trazes na voz a voz das companheiras
Companheira te chamamos
Porque no teu olhar se alargam os olhos que semeiam e vigiam
O sol a todas as alturas o sol dos meninos e das colheitas
Porque nele se tornam mais límpidos os límpidos olhos das namoradas
Companheira te chamamos
(…)
Porque até o sol remoça na neve tranquila dos teus cabelos
E o vento sopra-te com a mesma força que a nós
Companheira te chamamos
Porque as palavras na tua boca
Têm a medida do mundo e a face dos mortais
Porque no teu ventre a fome e a vida se completaram
Porque no teu rosto fala o tempo até nós
Mãe te chamaríamos
Companheira te chamamos.»

OrlandoCostaEurídice.jpg

Primeira edição de uma das mais importantes obras de Orlando da Costa publicada em 1964. Lê-se no Dicionário Cronológico de Autores Portugueses, que «Podem Chamar-me Eurídice... apresenta-se como um romance cujas linguagem e temática não devem ser desligadas da circunstância que as incubou: as perseguições político-domiciliárias da polícia salazarista, a clandestinidade, o cinzentismo da Lisboa dos anos sessenta – o amor, apesar de tudo.» Não surpreende, assim, que este livro tenha sido proibido pela Censura e apreendido pela PIDE aquando da sua publicação.[2]
Trata-se de uma obra publicada em 1964, que relata uma história de amor que tem no contexto histórico a vivência da clandestinidade e repressão da subversão universitária dos anos 60. É também uma metáfora do assassínio do escultor José Dias Coelho, abatido a tiro por agentes da PIDE. Todo este contexto literário e a força narrativa, na defesa de um Estado onde os valores da liberdade, da solidariedade e da democracia fossem efetivamente uma realidade, motivaram um processo de censura e proibição acérrimo, transformando este livro num dos textos capitais do Index do Estado Novo em Portugal.[3]



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