Difference between revisions of "Afonso, José - Obras Proibidas"

From Wikipédia de Autores Algarvios
Jump to: navigation, search
 
(32 intermediate revisions by the same user not shown)
Line 1: Line 1:
Pequeno texto sobre zeca censurado e copiar para aqui os poemas/canções escolhidos
+
[[File:Joseafonso.png]][[File:zecaafonso58_59_faro.jpg|205px]]<br />
 +
*'''José''' Manuel Cerqueira '''Afonso''' dos Santos ('''Zeca Afonso''')
  
Mantém, no seu grupo de amigos, uma série de autores, como António Ramos Rosa ou Luiza Neto Jorge, que procuravam o mesmo caminho que Zeca: o de uma contestação que conseguisse levar de vencida o poder da pólvora com o poder da palavra. Continua ativo na Tuna Académica até meados da década, em que procura um caminho mais a solo, sem a guitarra coimbrã tão presente, pouco tempo depois de terminar o seu curso, em 1963, com uma tese sobre a filosofia de Jean-Paul Sartre. No plano pessoal, conhece a algarvia Zélia Afonso, com quem casaria.<br />
+
 
A música de intervenção que tanto o caraterizou nasce, precisamente, neste período, fértil em baladas inspiradas pelas vivências e pelas convivências coimbrãs. Um dos seus principais colaboradores seria um estudante de medicina à data, o guitarrista Rui Pato. Com ele, grava dezenas de temas e viaja pelo país em diferentes festividades, nomeadamente aqueles que procuravam assumir uma postura anti-regime. Zeca dedicava-se à composição lírica, deixando os arranjos e a parte musical a cargo de Pato. “Os Vampiros” e “Menino do Bairro Negro” são os primeiros grandes temas de contestação que o cantautor desenhou, juntando-se ao contributo de Correia de Oliveira que adaptou o célebre poema de Manuel Alegre “Trova do Vento que Passa”.<br />
+
'''"Cantares"'''<br />
Entretanto, lançara “Cantares de José Afonso” (1964) e “Baladas e Canções” (do mesmo ano, pautada por tons mais contemplativos mas interrogativos da sua realidade). Aqui, ficaram temas como “Canção Longe”, “Canto da Primavera” ou “Ó Vila de Olhão” no ouvido, juntando-se aos já apresentados “Minha Mãe” e “Os Bravos”. Zeca emigraria com Zélia para Moçambique, onde daria aulas e onde reencontraria os seus filhos. Procura, através da música e do próprio teatro – chega a colaborar com um grupo local -, dar resposta aos desafios impostos pela sociedade, procurando opor-se ao colonialismo (“Menina dos Olhos Tristes” é uma composição que reflete este descontentamento, que é amadurecido pela Guerra Colonial que deflagrava e da qual Zeca acabou por escapar). Joana juntar-se-ia à família em 1965, sendo filha do casal, assim como se juntaria Pedro, mas nem isso o impediria de pugnar pela livre determinação das então colónias portuguesas.<br />
 
 
<br />
 
<br />
*Cantar Alentejano<br />
+
*1.'''Cantar Alentejano'''<br />
<br />
+
 
<br />
+
Chamava-se Catarina<br />
Chamava-se Catarina o Alentejo a viu nascer<br />
+
O Alentejo a viu nascer<br />
Chamava-se Catarina o Alentejo a viu nascer<br />
+
Serranas viram-na em vida<br />
Serranas viram na em vida<br />
 
Baleizão a viu morrer<br />
 
Serranas viram na em vida<br />
 
 
Baleizão a viu morrer<br />
 
Baleizão a viu morrer<br />
<br />
 
 
<br />
 
<br />
Ceifeiras na manhã fria<br />
 
Flores na campa lhe vão pôr<br />
 
 
Ceifeiras na manhã fria<br />
 
Ceifeiras na manhã fria<br />
 
Flores na campa lhe vão pôr<br />
 
Flores na campa lhe vão pôr<br />
Ficou vermelha a campina<br />
 
Do sangue que então brotou<br />
 
 
Ficou vermelha a campina<br />
 
Ficou vermelha a campina<br />
 
Do sangue que então brotou<br />
 
Do sangue que então brotou<br />
<br />
 
 
<br />
 
<br />
Acalma o furor campina<br />
 
Que o teu pranto não findou<br />
 
 
Acalma o furor campina<br />
 
Acalma o furor campina<br />
 
Que o teu pranto não findou<br />
 
Que o teu pranto não findou<br />
Line 33: Line 22:
 
Não perdoa a quem matou<br />
 
Não perdoa a quem matou<br />
 
<br />
 
<br />
<br />
 
Quem viu morrer Catarina<br />
 
Não perdoa a quem matou<br />
 
 
Aquela pomba tão branca<br />
 
Aquela pomba tão branca<br />
 
Todos a querem p'ra si<br />
 
Todos a querem p'ra si<br />
Aquela pomba tão branca<br />
+
Ó Alentejo queimado<br />
Todos a querem p'ra si ó Alentejo queimado<br />
 
Ninguém se lembra de ti ó Alentejo queimado<br />
 
 
Ninguém se lembra de ti<br />
 
Ninguém se lembra de ti<br />
<br />
 
 
<br />
 
<br />
 
Aquela andorinha negra<br />
 
Aquela andorinha negra<br />
 
Bate as asas p'ra voar<br />
 
Bate as asas p'ra voar<br />
Aquela andorinha negra<br />
 
Bate as asas p'ra voar ó Alentejo esquecido<br />
 
'Inda um dia hás-de cantar<br />
 
 
Ó Alentejo esquecido<br />
 
Ó Alentejo esquecido<br />
'Inda um dia hás-de cantar<br />
+
Inda um dia hás-de cantar<br />
 
<br />
 
<br />
Fonte: LyricFind
 
 
Leitura – Cantares, José Afonso
 
  
“Os Bravos”<br />
+
*2.'''“Os Bravos”'''<br />
 
<br />
 
<br />
 
Eu fui à terra do bravo<br />
 
Eu fui à terra do bravo<br />
Line 79: Line 56:
 
P'ra morrer no meio delas<br />
 
P'ra morrer no meio delas<br />
 
<br />
 
<br />
Cantares, José Afonso<br />
+
 
 +
'''"Cantar de Novo"'''<br />
 +
<br />
 +
*1.'''“A Morte Saiu à Rua”'''pág. 23-24-25<br />
 +
<br />
 +
A morte<br />
 +
Saiu à rua<br />
 +
Num dia assim<br />
 +
Naquele<br />
 +
Lugar seu nome<br />
 +
P’ra qualquer fim.<br />
 +
<br />
 +
Uma<br />
 +
Gota rubra so-<br />
 +
bre a calçada<br />
 +
Cai<br />
 +
<br />
 +
E um rio<br />
 +
De sangue<br />
 +
Dum<br />
 +
Peito aberto<br />
 +
Sai<br />
 +
<br />
 +
O vento<br />
 +
Que dá nas canas<br />
 +
Do caniçal<br />
 +
<br />
 +
E a foice<br />
 +
Duma ceifeira<br />
 +
De Portugal<br />
 +
<br />
 +
E o som<br />
 +
Da bigorna<br />
 +
Como<br />
 +
Um clarim do céu<br />
 +
<br />
 +
Vão di-<br />
 +
zendo em toda a parte<br />
 +
O pintor morreu<br />
 +
<br />
 +
Teu sangue,<br />
 +
Pintor, reclama<br />
 +
Outra morte<br />
 +
Igual<br />
 +
<br />
 +
Só olho<br />
 +
Por olho e<br />
 +
Dente por dente<br />
 +
Vale<br />
 +
<br />
 +
À lei assassina<br />
 +
À morte<br />
 +
Que te matou<br />
 +
<br />
 +
Teu corpo<br />
 +
Pertence à terra<br />
 +
Que te abraçou<br />
 +
<br />
 +
Aqui<br />
 +
Te afirmamos<br />
 +
Dente por dente<br />
 +
Assim<br />
 +
<br />
 +
Que um dia<br />
 +
Rirá melhor<br />
 +
Quem rirá por fim<br />
 +
<br />
 +
Na curva<br />
 +
Da estrada<br />
 +
Há covas feitas<br />
 +
No chão<br />
 +
<br />
 +
E em todas<br />
 +
Florirão rosas<br />
 +
Duma nação<br />
 +
<br />
 +
 
 +
*'''2.“Canção de Embalar”'''<br />
 +
<br />
 +
Dorme meu menino a estrela d'alva<br />
 +
Já a procurei e não a vi<br />
 +
Se ela não vier de madrugada<br />
 +
Outra que eu souber será pra ti<br />
 +
<br />
 +
Outra que eu souber na noite escura<br />
 +
Sobre o teu sorriso de encantar<br />
 +
Ouvirás cantando nas alturas<br />
 +
Trovas e cantigas de embalar<br />
 +
<br />
 +
Trovas e cantigas muito belas<br />
 +
Afina a garganta meu cantor<br />
 +
Quando a luz se apaga nas janelas<br />
 +
Perde a estrela d'alva o seu fulgor<br />
 +
<br />
 +
Perde a estrela d'alva pequenina<br />
 +
Se outra não vier para a render<br />
 +
Dorme quinda à noite é uma menina<br />
 +
Deixa-a vir também adormecer<br />
 +
                             
 +
*'''3. “Natal dos Mendigos”'''<br />
 +
<br />
 +
Vamos cantar as janeiras<br />
 +
Vamos cantar as janeiras<br />
 +
Por esses quintais adentro vamos<br />
 +
Às raparigas solteiras<br />
 +
<br />
 +
Vamos cantar orvalhadas<br />
 +
Vamos cantar orvalhadas<br />
 +
Por esses quintais adentro vamos<br />
 +
Às raparigas casadas<br />
 +
<br />
 +
Vira o vento e muda a sorte<br />
 +
Vira o vento e muda a sorte<br />
 +
Por aqueles olivais perdidos<br />
 +
Foi-se embora o vento norte<br />
 +
<br />
 +
Muita neve cai na serra<br />
 +
Muita neve cai na serra<br />
 +
Só se lembra dos caminhos velhos<br />
 +
Quem tem saudades da terra<br />
 +
<br />
 +
Quem tem a candeia acesa<br />
 +
Quem tem a candeia acesa<br />
 +
Rabanadas pão e vinho novo<br />
 +
Matava a fome à pobreza<br />
 +
<br />
 +
Já nos cansa esta lonjura<br />
 +
Já nos cansa esta lonjura<br />
 +
Só se lembra dos caminhos velhos<br />
 +
Quem anda à noite à ventura<br />
 +
<br />                     
 +
'''4. “Canto Jovem”'''<br />
 +
<br />
 +
Somos filhos da madrugada<br />
 +
Pelas praias do mar nos vamos<br />
 +
À procura de quem nos traga<br />
 +
Verde oliva de flor nos ramos<br />
 +
Navegámos de vaga em vaga<br />
 +
Não soubemos de dor nem mágoa<br />
 +
Pelas praias do mar nos vamos<br />
 +
À procura da manhã clara<br />
 +
<br />
 +
Lá do cima duma montanha<br />
 +
Acendemos uma fogueira<br />
 +
Para não se apagar a chama<br />
 +
Que dá vida na noite inteira<br />
 +
Mensageira pomba chamada<br />
 +
Companheira da madrugada<br />
 +
Quando a noite vier que venha<br />
 +
Cá do cima duma montanha<br />
 +
<br />
 +
Onde o vento cortou amarras<br />
 +
Largaremos pela noite fora<br />
 +
Onde há sempre uma boa estrela<br />
 +
Noite e dia ao romper da aurora<br />
 +
Vira a proa minha galera<br />
 +
Que a vitória já não espera<br />
 +
Fresca brisa moira encantada<br />
 +
Vira a proa da minha barca<br />
 +
                   
 +
*'''4.“Vampiros”'''<br />
 +
<br />
 +
No céu cinzento<br />
 +
Sob o astro mudo<br />
 +
Batendo as asas<br />
 +
Pela noite calada<br />
 +
Vêm em bandos<br />
 +
Com pés de veludo<br />
 +
Chupar o sangue<br />
 +
Fresco da manada<br />
 +
<br />
 +
Se alguém se engana<br />
 +
Com seu ar sisudo<br />
 +
E lhes franqueia<br />
 +
As portas à chegada<br />
 +
Eles comem tudo,<br />  
 +
Eles comem tudo<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
E não deixam nada<br />
 +
<br />
 +
A toda a parte<br />
 +
Chegam os vampiros<br />
 +
Poisam nos prédios<br />
 +
Poisam nas calçadas<br />
 +
Trazem no ventre<br />
 +
Despojos antigos<br />
 +
Mas nada os prende<br />
 +
Às vidas acabadas<br />
 +
<br />
 +
São os mordomos<br />
 +
Do universo todo<br />
 +
Senhores à força<br />
 +
Mandadores sem lei<br />
 +
Enchem as tulhas<br />
 +
Bebem vinho novo<br />
 +
Dançam a ronda<br />
 +
No pinhal do rei<br />
 +
<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
E não deixam nada<br />
 +
<br />
 +
No chão do medo<br />
 +
Tombam os vencidos<br />
 +
Ouvem-se os gritos<br />
 +
Na noite abafada<br />
 +
Jazem nos fossos<br />
 +
Vítimas de um credo<br />
 +
E não se esgota<br />
 +
O sangue da manada<br />
 +
<br />
 +
Se alguém se engana<br />
 +
Com seu ar sisudo<br />
 +
E lhes franqueia<br />
 +
As portas à chegada<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
E não deixam nada<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
Eles comem tudo<br />
 +
E não deixam nada<br />
 +
<br />                     
 +
'''“Ó Vila de Olhão”'''<br />
 +
<br />
 +
Ó vila de Olhão<br />
 +
Da Restauração<br />
 +
Madrinha do povo<br />
 +
Madrasta é que não<br />
 +
<br />
 +
Com papas e bolos<br />
 +
Engana o burlão<br />
 +
Os que de lá são<br />
 +
E os que pra lá vão<br />
 +
<br />
 +
Ó flor da trapeira<br />
 +
Ó rosa em botão<br />
 +
Tuas cantoneiras<br />
 +
Bem bonitas são<br />
 +
<br />
 +
Larga ó pescador<br />
 +
O que tens na mão<br />
 +
Que o peixe que levas<br />
 +
É do teu patrão<br />
 +
<br />
 +
Limpa o teu suor<br />
 +
No camisolão<br />
 +
Que o peixe que levas<br />
 +
É do cais de Olhão<br />
 +
<br />
 +
Vem o mandarim<br />
 +
Vem o capitão<br />
 +
Paga o pagador<br />
 +
Não paga o ladrão<br />
 +
<br />
 +
Ó vila de Olhão<br />
 +
Da Restauração<br />
 +
Madrinha do povo<br />
 +
Madrasta é que não<br />
 +
<br />
 +
Quem te pôs assim<br />
 +
Mar feito num cão<br />
 +
Foi o tubarão<br />
 +
Foi o tubarão<br />
 +
Foi o tubarão<br />
 +
<br />
 +
Mulher empregada<br />
 +
Diz o povo vão<br />
 +
Que aquela empreitada<br />
 +
Não dá nada não<br />
 +
<br />
 +
Ó vila de Olhão<br />
 +
Da Restauração<br />
 +
Madrinha do povo<br />
 +
Madrasta é que não<br />
 +
Madrasta é que não<br />
 +
<br />                 
 +
'''“Canção de Embalar”'''<br />
 +
<br />
 +
Dorme meu menino a estrela d'alva<br />
 +
Já a procurei e não a vi<br />
 +
Se ela não vier de madrugada<br />
 +
Outra que eu souber será pra ti<br />
 +
<br />
 +
Outra que eu souber na noite escura<br />
 +
Sobre o teu sorriso de encantar<br />
 +
Ouvirás cantando nas alturas<br />
 +
Trovas e cantigas de embalar<br />
 +
<br />
 +
Trovas e cantigas muito belas<br />
 +
Afina a garganta meu cantor<br />
 +
Quando a luz se apaga nas janelas<br />
 +
Perde a estrela d'alva o seu fulgor<br />
 +
<br />
 +
Perde a estrela d'alva pequenina<br />
 +
Se outra não vier para a render<br />
 +
Dorme quinda à noite é uma menina<br />
 +
Deixa-a vir também adormecer<br />
 +
 
 +
<br />
 +
[[File:Logo25abril50anosleiturascensuradas.png|797px|center]]<br />
 +
[[File:Wiki-nao-censurada-lapisazul.png|797px|center]]<br />
 +
<center>[https://wikialgarve.pt/autoresalgarvios/index.php/25_de_Abril_-_50_Anos Voltar à Página Inicial da wiki 25 de Abril - 50 anos - Leituras em Liberdade]</center>
 +
 
 +
[[Category:25 de Abril]][[Category:Poesia Censurada]][[Category:Autores Portugueses Censurados]][[Category:Autores Algarvios Censurados]]

Latest revision as of 02:37, 18 February 2024

Joseafonso.pngZecaafonso58 59 faro.jpg

  • José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos (Zeca Afonso)


"Cantares"

  • 1.Cantar Alentejano

Chamava-se Catarina
O Alentejo a viu nascer
Serranas viram-na em vida
Baleizão a viu morrer

Ceifeiras na manhã fria
Flores na campa lhe vão pôr
Ficou vermelha a campina
Do sangue que então brotou

Acalma o furor campina
Que o teu pranto não findou
Quem viu morrer Catarina
Não perdoa a quem matou

Aquela pomba tão branca
Todos a querem p'ra si
Ó Alentejo queimado
Ninguém se lembra de ti

Aquela andorinha negra
Bate as asas p'ra voar
Ó Alentejo esquecido
Inda um dia hás-de cantar

  • 2.“Os Bravos”


Eu fui à terra do bravo
Bravo meu bem
Para ver se embravecia
Cada vez fiquei mais manso
Bravo meu bem
Para a tua companhia

Eu fui à terra do bravo
Bravo meu bem
Com o meu vestido vermelho
O que eu vi de lá mais bravo
Bravo meu bem
Foi um mansinho coelho

As ondas do mar são brancas
Bravo meu bem
E no meio amarelas
Coitadinho de quem nasce
Bravo meu bem
P'ra morrer no meio delas

"Cantar de Novo"

  • 1.“A Morte Saiu à Rua”pág. 23-24-25


A morte
Saiu à rua
Num dia assim
Naquele
Lugar seu nome
P’ra qualquer fim.

Uma
Gota rubra so-
bre a calçada
Cai

E um rio
De sangue
Dum
Peito aberto
Sai

O vento
Que dá nas canas
Do caniçal

E a foice
Duma ceifeira
De Portugal

E o som
Da bigorna
Como
Um clarim do céu

Vão di-
zendo em toda a parte
O pintor morreu

Teu sangue,
Pintor, reclama
Outra morte
Igual

Só olho
Por olho e
Dente por dente
Vale

À lei assassina
À morte
Que te matou

Teu corpo
Pertence à terra
Que te abraçou

Aqui
Te afirmamos
Dente por dente
Assim

Que um dia
Rirá melhor
Quem rirá por fim

Na curva
Da estrada
Há covas feitas
No chão

E em todas
Florirão rosas
Duma nação

  • 2.“Canção de Embalar”


Dorme meu menino a estrela d'alva
Já a procurei e não a vi
Se ela não vier de madrugada
Outra que eu souber será pra ti

Outra que eu souber na noite escura
Sobre o teu sorriso de encantar
Ouvirás cantando nas alturas
Trovas e cantigas de embalar

Trovas e cantigas muito belas
Afina a garganta meu cantor
Quando a luz se apaga nas janelas
Perde a estrela d'alva o seu fulgor

Perde a estrela d'alva pequenina
Se outra não vier para a render
Dorme quinda à noite é uma menina
Deixa-a vir também adormecer

  • 3. “Natal dos Mendigos”


Vamos cantar as janeiras
Vamos cantar as janeiras
Por esses quintais adentro vamos
Às raparigas solteiras

Vamos cantar orvalhadas
Vamos cantar orvalhadas
Por esses quintais adentro vamos
Às raparigas casadas

Vira o vento e muda a sorte
Vira o vento e muda a sorte
Por aqueles olivais perdidos
Foi-se embora o vento norte

Muita neve cai na serra
Muita neve cai na serra
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem tem saudades da terra

Quem tem a candeia acesa
Quem tem a candeia acesa
Rabanadas pão e vinho novo
Matava a fome à pobreza

Já nos cansa esta lonjura
Já nos cansa esta lonjura
Só se lembra dos caminhos velhos
Quem anda à noite à ventura

4. “Canto Jovem”

Somos filhos da madrugada
Pelas praias do mar nos vamos
À procura de quem nos traga
Verde oliva de flor nos ramos
Navegámos de vaga em vaga
Não soubemos de dor nem mágoa
Pelas praias do mar nos vamos
À procura da manhã clara

Lá do cima duma montanha
Acendemos uma fogueira
Para não se apagar a chama
Que dá vida na noite inteira
Mensageira pomba chamada
Companheira da madrugada
Quando a noite vier que venha
Cá do cima duma montanha

Onde o vento cortou amarras
Largaremos pela noite fora
Onde há sempre uma boa estrela
Noite e dia ao romper da aurora
Vira a proa minha galera
Que a vitória já não espera
Fresca brisa moira encantada
Vira a proa da minha barca

  • 4.“Vampiros”


No céu cinzento
Sob o astro mudo
Batendo as asas
Pela noite calada
Vêm em bandos
Com pés de veludo
Chupar o sangue
Fresco da manada

Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo,
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas

São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas de um credo
E não se esgota
O sangue da manada

Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

“Ó Vila de Olhão”

Ó vila de Olhão
Da Restauração
Madrinha do povo
Madrasta é que não

Com papas e bolos
Engana o burlão
Os que de lá são
E os que pra lá vão

Ó flor da trapeira
Ó rosa em botão
Tuas cantoneiras
Bem bonitas são

Larga ó pescador
O que tens na mão
Que o peixe que levas
É do teu patrão

Limpa o teu suor
No camisolão
Que o peixe que levas
É do cais de Olhão

Vem o mandarim
Vem o capitão
Paga o pagador
Não paga o ladrão

Ó vila de Olhão
Da Restauração
Madrinha do povo
Madrasta é que não

Quem te pôs assim
Mar feito num cão
Foi o tubarão
Foi o tubarão
Foi o tubarão

Mulher empregada
Diz o povo vão
Que aquela empreitada
Não dá nada não

Ó vila de Olhão
Da Restauração
Madrinha do povo
Madrasta é que não
Madrasta é que não

“Canção de Embalar”

Dorme meu menino a estrela d'alva
Já a procurei e não a vi
Se ela não vier de madrugada
Outra que eu souber será pra ti

Outra que eu souber na noite escura
Sobre o teu sorriso de encantar
Ouvirás cantando nas alturas
Trovas e cantigas de embalar

Trovas e cantigas muito belas
Afina a garganta meu cantor
Quando a luz se apaga nas janelas
Perde a estrela d'alva o seu fulgor

Perde a estrela d'alva pequenina
Se outra não vier para a render
Dorme quinda à noite é uma menina
Deixa-a vir também adormecer


Logo25abril50anosleiturascensuradas.png

Wiki-nao-censurada-lapisazul.png

Voltar à Página Inicial da wiki 25 de Abril - 50 anos - Leituras em Liberdade