Andrade, Eugénio - Livros Proibidos

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  • Eugénio de Andrade, 1923-2005.
Poeta, escritor, tradutor, funcionário público / inspetor administrativo. Odiou a ditadura salazarista-marcelista, tendo dedicado textos a vários lutadores antifascistas, e afirmou-se como radicalmente antibelicista e como um cantor da liberdade. A liberdade de ver, de ouvir e de sentir, a liberdade de amar.
  • Livro Proibido - Encontro - Antologia de Autores Modernos
No livro censurado Encontro - Antologia de Autores Modernos estão reproduzidos dois poemas do autor - Urgentemente e Mar, Mar e Mar.

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  • 1. Urgentemente


É urgente o Amor,
É urgente um barco no mar.

É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.

É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros,
e a luz impura até doer.
É urgente o amor,
É urgente permanecer.

Este poema foi publicado originalmente no livro Até Amanhã de 1951 e posteriormente no livro "Eugénio de Andrade Poesia e Prosa[ 1940-1979] I Vol."(pág.118)

  • Leituras de outros poemas socialmente interventivos publicados noutras obras suas:
  • 2. Sobre o Tejo


Que soldado tão triste esta chuva
sobre as sílabas escuras do Outono
sobre o Tejo as últimas barcas
sobre as barcas uma luz de desterro.

Já foi lugar de amor o Tejo a boca
as mãos foram já fogo de abelhas
não eram o corpo então dura e amarga
pedra do frio.

Sobre o Tejo cai a luz das fardas
É tempo de dizer adeus.

O poema Sobre o Tejo” publicado originalmente no livro Véspera de Água"' e posteriormente no livro "Eugénio de Andrade Poesia e Prosa[ 1940-1979] II Vol."(pág.124) aponta especificamente para um conflito, a Guerra Colonial Portuguesa, que decorreu nas frentes de Moçambique, Guiné e Angola, entre 1961 e 1974. O texto concentra-se num soldado que, sendo anónimo, representa todo um universo de jovens recrutas, tantas vezes alheios às razões de um combate que não é o seu:

  • 3. As Palavras Interditas


Os navios existem, e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades,
partem no vento, regressam nos rios.

Na areia branca, onde o tempo começa,
uma criança passa de costas para o mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.

Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te… E entram pela janela
as primeiras luzes das colinas.

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos noturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.

Publicado pela primeira vez no livro As Palavras Interditas, cujo título nos remete para o seu duplo sentido: o mais imediato - o contexto censório da época e outro mais profundo, em que a associação das palavras dá ao leitor uma escolha poética sem reduzir o poema ao seu sentido imediato e sem complicar a sua compreensão.

Para saber mais:
https://ubibliorum.ubi.pt/bitstream/10400.6/4323/1/umapalavrapreocupada.pdf

https://recursos.portoeditora.pt/recurso?id=23830277



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