Lusíadas

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A epopeia Os Lusíadas, publicada há 450 anos, (...) é a primeira obra da literatura europeia que descreve o subcontinente indiano.

A Índia só reaparece na literatura europeia dois séculos mais tarde, com a publicação, na década de 1780, em Inglaterra, das primeiras “narrativas indianas”. No entanto, o género só em 1888 viria a popularizar-se com as Plain Tales from the Hills, de Rudyard Kipling (Buda, 1985), uma antologia de contos, dois dos quais estão publicados, em Portugal, nos Três Contos da Índia (1998) – “Para lá da cerca” e “O portão das cem mágoas” sendo este último considerado um dos melhores romances alguma vez escritos sobre a Índia (Buda, 1985). Em 1907, Kipling foi o primeiro escritor de língua inglesa a ser galardoado com o Prémio Nobel.


1.1. A Índia em 1498 (VII.16-22) Na sua descrição da Índia à chegada de Vasco da Gama, em 1498, Camões assinala as principais características geográficas (VII.17; VII.18) – os rios Indo e Ganges, os Himalaias, a península e o oceano Índico –, refere oito povos e/ou reinos cujos territórios correspondem à quase totalidade do subcontinente indiano, o que é hoje o Paquistão, o Nepal, o Butão, o Bangladeche e a Índia, e identifica quatro religiões dos

Os oito reinos indianos, em 1498, eram, de norte para sul, os seguintes. Ao longo do vale do Ganges, do Paquistão ao estado indiano do Bihar atuais, estendia-se o vasto e poderoso Sultanato de Deli (1206-1526), em declínio desde 1351 (VII.20.3, Delis) (Watson, 1974: 95, 97-98, 100). Neste reino islâmico do norte do subcontinente indiano, a língua oficial e a cultura da elite eram persas, enquanto a população era maioritariamente hindu (Watson, 1974: 102). Nele desenvolveu-se a arquitetura indo�

17

Além do Indo jaz e aquém do Gange
Um terreno mui grande e assaz famoso
Que pela parte Austral o mar abrange
E pera o Norte o Emódio cavernoso.
Jugo de Reis diversos o constrange
A várias leis: alguns o vicioso
Mahoma, alguns os Ídolos adoram,
Alguns os animais que entre eles moram.

18

Lá bem no grande monte que, cortando
Tão larga terra, toda Ásia discorre,
Que nomes tão diversos vai tomando
Segundo as regiões por onde corre,
As fontes saem donde vêm manando
Os rios cuja grão corrente morre
No mar Índico, e cercam todo o peso
Do terreno, fazendo-o quersoneso

19

Entre um e o outro rio, em grande espaço
Sai da larga terra ũa longa ponta,
Quási piramidal, que, no regaço
Do mar, com Ceilão ínsula confronta;
E junto donde nasce o largo braço
Gangético, o rumor antigo conta
Que os vizinhos, da terra moradores,
Do cheiro se mantêm das finas flores.


Notas:

17.1-7
“Além do Indo jaz e aquém do Gange”: o Poeta traça os limites da Índia. Para o norte o “Emódio” (Hemodus ou Emodus), parte do Himalaia; envolve-o a oriente e a ocidente o oceano Índico (golfo de Bengala a oriente e mar Arábico a ocidente);

18.1-8
“Lá bem no grande monte que, cortando”: só pode tratar-se do Emódio cavernoso” ou Himalaia, donde saem as fontes do Indo e do Ganges; “... e cercam todo o peso / Do terreno, fazendo-o quersoneso”: o Indo vem de norte para ocidente e o Ganges de norte para oriente. Toda a terra da Índia abaixo desses rios até ao Índico forma uma península (quersoneso). “A qual região as correntes destes dous rios per hũa parte, & o grãde Oceano Indico per outra a cercão de maneira, q} quasi fica hũa chersoneso” (Barros, I.IV.Vll).
19.1-8
“Entre um e o outro rio, ... / Sai da larga terra ũa longa ponta, / Quási piramidal, ...”: desde as margens dos dois grandes rios a terra da Índia vem-se estreitando até tomar quase a forma de pirâmide, cuja ponta confronta com a ilha de Ceilão; “... o rumor antigo conta / Que os vizinhos, ... / Do cheiro se mantêm das finas flores”: na composição Querendo escrever um dia o Poeta refere a lenda nestes termos:

Escrevem vários autores,
que, junto da clara fonte
do Ganges, os moradores
vivem do cheiro das flores
que nacem naquele monte.
Se os sentidos podem dar
mantimento ao viver,
não é, logo, d’ espantar,
se estes vivem de cheirar,
que viv’eu só de vos ver.
(Rimas, mihi, p. 8)

“ad extremos fines Indiae ab oriente circa fontem Gangis Astomorum gentem sine ore, corpore toto hirtam, vestiri frondium lanugine, halitu tantum viventem et odore quem naribus trahant; nullum illis cibum nullumque potum, radicum tantum florumque varios odores et silvestrium malorum, quae secum portant longiore itinere ne desit olfactus» (Plínio, NH, VII.25).