Cabral, Alexandre - Livros Proibidos
Alexandre Cabral - pseudónimo de José dos Santos Cabral - frequentou o Instituto Profissional dos Pupilos do Exército e exerceu várias profissões até emigrar para África, onde permaneceu três anos. De regresso a Portugal, foi redator de uma agência noticiosa, propagandista de produtos farmacêuticos e publicitário. Formou-se, ao mesmo tempo, em Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras de Lisboa. Teve um papel de relevo na formação da Sociedade Portuguesa de Escritores e colaborou em inúmeras publicações periódicas. Dedicou grande parte da sua vida à investigação da obra e vida de Camilo Castelo Branco, devendo-se-lhe a edição anotada da novelística, correspondência e polémicas camilianas, e um Dicionário de Camilo Castelo Branco. Na criação literária, a sua ficção manteve-se ligada ao ideário neorrealista e ao memorialismo da resistência.
Alexandre Cabral de seu verdadeiro nome José dos Santos Cabral, natural da Freguesia da Ajuda (Lisboa) (17-10-1917 – 21-11-1996). Aos 14 anos, abandonou os estud os no Instituto Profissional dos Pupilos do Exército (o pai era oficial de carreira) e transformou-se num verdadeiro homem dos sete ofícios. Foi paquete numa agência de leilões, apontador na Carris de Lisboa, empregado de balcão e comercial. Empregou-se aos 15 anos e acabou por emigrar para África, onde permaneceu três anos. Frequentou Ciências Histórico-Filosóficas na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi Redactor de uma Agência Noticiosa, Delegado de Propaganda Médica e Chefe de Escritório. Trabalhou depois numa Agência de Publicidade antes de se consagrar em exclusivo à actividade literária.
Em 1936, foi Director do periódico juvenil A Voz da Mocidade, extinto ao nono número, por ordem dos serviços de censura.
Militante comunista desde a juventude, foi preso três vezes, em 1952, 1963 e 1964, acusado de crimes contra a segurança do Estado, mas nunca julgado, a última das quais no regresso de uma viagem a Cuba, de que resultou um livro: Um Português em Cuba, só publicado em 1969.
Em 1959, assinou, com outros oposicionistas, um documento, datado de 18 de Março, em que se pedia a Salazar que, por ocasião da sua última lição em Coimbra, «se verifique também o seu afastamento da vida política».
Em Maio de 1972, foi um dos subscritores de um manifesto intitulado «A Situação Política Portuguesa e o Fracasso do Reformismo», apreendido pela DGS, e, por isso, interrogado.
Em 1973, fez parte da comissão nacional do III Congresso da Oposição Democrática, realizado em Aveiro.
Em 1978, assinou um manifesto dirigidi «Ao Povo Português», protestando contra o governo de coligação entre o Partido Socialista e o CDS, que estava prestes a constituir-se.
Artisticamente, inseriu-se na corrente neo-realista e dedicou-se à investigação histórico-literária. Colaborou em diversos jornais e revistas, como Democracia do Sul, República, O Comércio do Porto, Vértice e Seara Nova.
Estreou-se com “Cinzas da Nossa Alma”, (1937). Publicou contos e romances de feição neo-realista, como “Contos Sombrios”, (1938), “O Sol Nascerá Um Dia”, (1942), “Contos da Europa e da África”, (1947), “Fonte da Telha”, (1949), “Terra Quente”, (1953), “Malta Brava”, (1955), “Histórias do Zaire”, (1956), e “Margem Norte” , (1961). Merecem referência os estudos que consagrado à vida e obra de Camilo Castelo Branco, entre os quais: “Estudos Camilianos”, (1978), “Escritos Diversos de Camilo Castelo Branco, (1979), e “Dicionário de Camilo Castelo Branco”, (1989).
O Sol Nascerá um Dia, Alexandre Cabral
Foi num dia de Natal. O Pai Noel, apesar do burgo ser pobríssimo, apareceu também por ali com o saco recheado. Ao Paulo, deixou-lhe uma meningite que o rapou em três dias. A mãe abria casas em coletes. Ganhava vinte e cinco tostões em cada peça. Tivera-o de um hóspede que abalara antes mesmo do parto. Ao filho da peixeira, o aleijadinho, dera-lhe pelas mãos paternas uma sova que o ia matando. À Maria, que estava grávida outra vez, Papá Noel trouxera-lhe a nova de que o homem fora despedido da Companhia por roubar uns canos de chumbo.
Foi um autêntico bodo.
- Bandido! A lei tem de ser inexorável. Mas porquê? Porque somos vadios! E porque é que somos vadios?… Além disso, lembra-te que a tua vida tem, a este respeito, muitos pontos de contacto com a minha – mas a verdade é que jamais conhecemos o benefício da lei ou daquilo que a representa, quando somos ou quando fomos bons. A lei ou essa coisa que vocês inventaram para nos trazer de rédea curta e para o vosso sossego lembra-se que existimos, precisamente no momento em que se lembra que pecamos.
“Desempregado!”
Que antagonismo entre estes dois aspectos da vida de um indivíduo: empregado – desempregado. O empregado recebe ao fim do mês o ordenado, magro embora. Em contra-partida vê no prato da balança os dias preenchidos por essa obrigação. Levanta-se da cama, come apressadamente, mete ao caminho mais curto, pois vai já na hora do patrão. Pelo dia fora, se sai, leva os passos contados, do escritório ou da loja ao destino e volta. E o desempregado? Este, mãos nos bolsos, não tem assalariadas as pernas. Caminham ao acaso, em todos os sentidos, consoante o capricho do momento; não procuram as travessas que encurtam distâncias; metem-se, pelo contrário, às ruas longas que se afastam sempre do ponto de partida, no prazer de alargar a roda da caminhada, de tomar conta, o pobre diabo, de toda a cidade. Tem um dia inteiro ao seu dispor para essa conquista – um dia, um mês, um ano, quase toda a vida. O desempregado goza a liberdade, aspira a pulmões cheios o ar das manhãs, disfruta as sombras das tardinhas. Passa fome e não ganha salário.
O Sol Nascerá um Dia, Alexandre Cabral