Andrade, Eugénio - Livros Proibidos
Urgentemente
É urgente o Amor,
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros,
e a luz impura até doer.
É urgente o amor,
É urgente permanecer.
No melancólico poema “Sobre o Tejo”, o poeta aponta especificamente para um
conflito, a Guerra Colonial Portuguesa, que decorreu nas frentes de Moçambique, Guiné e
Angola, entre 1961 e 1974. O texto concentra-se num soldado que, sendo anónimo,
representa todo um universo de jovens recrutas, tantas vezes alheios às razões de um
combate que não é o seu:
Que soldado tão triste esta chuva
sobre as sílabas escuras do Outono
sobre o Tejo as últimas barcas
sobre as barcas uma luz de desterro.
Já foi lugar de amor o Tejo a boca
as mãos foram já fogo de abelhas
não eram o corpo então dura e amarga
pedra do frio.
Sobre o Tejo cai a luz das fardas
É tempo de dizer adeus.
(Andrade, 2005: 200)
https://ubibliorum.ubi.pt/bitstream/10400.6/4323/1/umapalavrapreocupada.pdf