Difference between revisions of "Elegias escolhidas"

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Elegiafavoritos
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'''Elegia'''<br />
Termo de origem grega (elegeía - "lamentação", "canto lúgubre") que designa uma composição poética lírica, em tom melancólico e terno.
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Termo de origem grega (elegeía - "lamentação", "canto lúgubre") que designa uma composição poética lírica, em tom melancólico e terno.<br />(...) Quanto aos temas deste tipo de poesia, encontram-se exemplos de exaltações guerreiras ou patrióticas, de moralidades, com carácter reflexivo e doutrinário, e de narrativas. Relativamente a esta tipologia textual, pode encontrar-se referências à mitologia, ao amor, ao prazer, à juventude, à efemeridade e fragilidade da condição humana, entre outras.<br /> No final da Idade Média e já por influência do Classicismo, a elegia é retomada por François Villon, Jorge Manrique, Petarca e Jacopo Sannazaro. Em Portugal, esta composição poética é cultivada por Sá de Miranda, Camões, Diogo Bernardes, António Ferreira e, mais tarde, pelos poetas da Arcádia Lusitana, por Bocage e pela Marquesa de Alorna.
O termo elegia surge pela primeira vez no século VII a. C., considerando-se que o seu mais antigo cultor foi provavelmente Calino. Na Grécia, outros poetas também a cultivaram, como Arquíloco, Tirteu, Mimnermo, Teógnis de Mégara, Sólon e, em Roma, aparece representada em Catulo, Ovídio, Propércio ou Tíbulo.
 
Na Antiguidade Clássica, a elegia era formada por estrofes de dois dísticos, um hexâmetro, seguido de um pentâmetro, rompendo assim com a monotonia das sequências dos hexâmetros das epopeias. Inicialmente, a elegia era cantada com acompanhamento de flauta, mas lentamente foi perdendo a associação musical para passar a ser recitada ou simplesmente lida.
 
Quanto aos temas deste tipo de poesia, encontram-se exemplos de exaltações guerreiras ou patrióticas, de moralidades, com carácter reflexivo e doutrinário, e de narrativas. Relativamente a esta tipologia textual, pode encontrar-se referências à mitologia, ao amor, ao prazer, à juventude, à efemeridade e fragilidade da condição humana, entre outras.
 
No final da Idade Média e já por influência do Classicismo, a elegia é retomada por François Villon, Jorge Manrique, Petarca e Jacopo Sannazaro. Em Portugal, esta composição poética é cultivada por Sá de Miranda, Camões, Diogo Bernardes, António Ferreira e, mais tarde, pelos poetas da Arcádia Lusitana, por Bocage e pela Marquesa de Alorna.
 
 
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Porto Editora – Elegia na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2024-11-14 12:49:52]. Disponível em https://www.infopedia.pt/$elegia
 
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Revision as of 14:01, 14 November 2024

Elegia
Termo de origem grega (elegeía - "lamentação", "canto lúgubre") que designa uma composição poética lírica, em tom melancólico e terno.
(...) Quanto aos temas deste tipo de poesia, encontram-se exemplos de exaltações guerreiras ou patrióticas, de moralidades, com carácter reflexivo e doutrinário, e de narrativas. Relativamente a esta tipologia textual, pode encontrar-se referências à mitologia, ao amor, ao prazer, à juventude, à efemeridade e fragilidade da condição humana, entre outras.
No final da Idade Média e já por influência do Classicismo, a elegia é retomada por François Villon, Jorge Manrique, Petarca e Jacopo Sannazaro. Em Portugal, esta composição poética é cultivada por Sá de Miranda, Camões, Diogo Bernardes, António Ferreira e, mais tarde, pelos poetas da Arcádia Lusitana, por Bocage e pela Marquesa de Alorna. Partilhar partilhar facebook partilhar X partilhar whatsapp partilhar email Como referenciar Porto Editora – Elegia na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2024-11-14 12:49:52]. Disponível em https://www.infopedia.pt/$elegia



Destemido e aventureiro, Camões abraça o exílio em 1553, depois de ter ferido o arrieiro do rei. Deixa a pátria lusitana, enfrenta os mares navegados por Vasco da Gama até alcançar a Índia. Em Goa escreve uma elegia, um poema embrião dos Lusíadas.

Anos depois de ter iniciado carreira militar numa expedição a Ceuta, onde é ferido num olho durante uma batalha, Luís de Camões regressa à vida de soldado, desta vez em terras do Oriente. A 24 de março de 1553 deixa “a ocidental praia lusitana” e parte para a Índia na armada de Fernão Álvares Cabral. Porventura nesta viagem, encontra ou reencontra mais profundamente o sentido do trajeto histórico do capitão Vasco da Gama, que irá imortalizar com um poema épico de mil cento e uma estrofes.

Em Goa escreve a elegia “O poeta Simónides falando”, que o ensaísta Helder Macedo, especialista camoniano, diz ser “um embrião de alguns dos momentos culminantes dos Lusíadas”.

https://ensina.rtp.pt/artigo/a-elegia-autobiografica-de-camoes/


XI

Elegia


O Poeta Simónides, falando

co capitão Temístocles, um dia,

em cusas de ciência praticando,

ü a arte singular lhe prometia,

que então compunha, com que lhe ensinasse

a se lembrar de tudo o que fazia;

onde tão sutis regras lhe mostrasse

que nunca lhe passasse da memória

em nenhum tempo as cousas que passasse.

Bem merecia, certo, fama e glória

quem dava regra contra o esquecimento

que enterra em si qualquer antiga história.

Mas o capitão claro, cujo intento

bem diferente estava, porque havia

as passadas lembranças por tormento;

ilustre Simónides! (dezia)

Pois tanto em teu engenho te confias

que mostras à memória nova via,

e me desses üa arte que em meus dias

me não lembrasse nada do passado,

oh! quanto milhor obra me farias!

Se este excelente dito ponderado
fosse por quem se visse estar ausente,

em longas esperanças degradado,

ah! como bradaria justamente:

Simónides, inventa novas artes;

não meças o passado co presente!

Que, se é forçado andar por várias partes

buscando à vida algum descanso honesto,

que tu, Fortuna injusta, mal repartes;

se o duro trabalho é manifesto

que por grave que seja, há-de passar-se


com animoso esprito e ledo gesto;

de que serve às pessoas alembrar-se

do que se passou já, pois tudo passa,

senão de entristecer-se e magoar-se?

Se noutro corpo üa alma se traspassa,

não, como quis Pitágoras, na morte

mas como manda Amor na vida escassa;

e se este Amor no mundo está de sorte

que na virtude só dum lindo objecto

tem um corpo sem alma, vivo e forte;

onde este objecto falta, que é defecto

tamanho para a vida, que já nela

me está chamando à pena a dura Alecto;

porque me não criara minha estrela

selvático no mundo, e habitante

na dura Cítia, ou na aspereza dela,

ou no Cáucaso horrendo? Fraco infante,

criado ao peito d'algüa tigre hircana,

homem fora formado de diamante,

porque a cerviz ferina e inumana

não sometera ao jugo e dura lei

daquele que dá vida quando engana.

Ou, em pago das águas qu'estilei,

as que do mar passei foram de Lete, p

ara que me esquecera o que passei.

Que o bem que a esperança vã promete,

ou a morte o estorva, ou a mudança,

que é mal que ua alma em lágrimas derrete.

Já, Senhor, cairá como a lembrança,

no mal, do bem passado é triste e dura,

pois nasce aonde morre a esperança.

E se quiser saber como se apura

nua alma saudosa, não se enfade

de ler tão longa e mísera escritura.

Soltava Eolo a rédea e liberdade

ao manso Favónio brandamente,

e eu já tinha solta a saudade.

Neptuno tinha posto o seu tridente;

a proa a branca escuma dividia,

co a gente marítima contente.

O coro das Nereidas nos seguia,

os ventos, namorada Galateia

consigo, sossegados, os movia.

Das argênteas conchinhas, Panopeia

andava pelo mar fazendo molhos,

Melanto, Dinamene, com Ligeia.

Eu, trazendo lembranças por antolhos,

trazia os olhos na água sossegada,

e a água sem sossego nos meus olhos.

A bem-aventurança já passada

diante mim tinha tão presente

como se não mudasse o tempo nada.

E com o gesto imoto e descontente,

cum suspiro profundo, e mal ouvido,

por não mostrar meu mal a toda a gente,

dezia: Ó claras Ninfas! Se o sentido

em puro amor tivestes, e inda agora

da memória o não tendes esquecido;

se, porventura, fordes algüa hora

aonde entra o grão Tejo a dar tributo


a Tétis, que vós tendes por Senhora;

ou por verdes o prado verde enxuto,

ou por colherdes ouro rutilante,

das tágicas areias rico fruto;

nelas em verso heróico e elegante,

escrevei cüa concha o que em mim vistes:

pode ser que algum peito se quebrante.

E contando de mim memórias tristes,

os pastores do Tejo, que me ouviam,

ouçam de vós as mágoas que me ouvistes.

Elas, que já no gesto me entendiam,

nos meneios das ondas me mostravam

que em quanto lhe pedia consentiam.

Estas lembranças, que me acompanhavam

pola tranquilidade da bonança,

nem na tormenta grave me deixavam.

Porque, chegado ao Cabo da Esperança,

começo da saudade que renova,

lembrando a longa e áspera mudança;

debaixo estando já da Estrela nova,

que no novo Hemisfério resplandece,

dando do segundo axe certa prova;

eis a noite com nuvens escurece,

do ar supitamente foge o dia,

e o largo oceano se embravece.

A máquina do Mundo parecia

que em tormenta se vinha desfazendo,

em serras todo o mar se convertia.

Lutando Bóreas fero e Noto horrendo,

sonoras tempestades levantavam,

das naus as velas côncavas rompendo.

As cordas, ao ruído, associavam,

os marinheiros, já desesperados,

com gritos para o Céu o ar coalhavam.

Os raios por Vulcano fabricados

vibrava o fero e áspero Tonante,

tremendo os Pólos ambos, de assombrados!

Ali Amor mostrando-se possante

e que por nenhum modo não fugia,

mas quanto mais trabalho, mais constante;

vendo a morte diante, em mim dezia:

Se algüa hora, Senhora, vos lembrasse,

nada do que passei me lembraria.

Enfim, nunca houve cousa que mudasse

o firme Amor do intrínseco daquele

em cujo peito üa vez de siso entrasse.

üa cousa, Senhor, por certo assele;

que nunca Amor se afina, nem se apura,

enquanto está presente a causa dele.

Dest'arte me chegou minha ventura

a esta desejada e longa terra,

de todo o pobre honrado sepultura.

Vi quanta vaïdade em nós se encerra,

e dos próprios quão pouca; contra quem

foi logo necessário termos guerra.

Que üa ilha que o rei de Porcá tem,

que o rei da Pimenta lhe tomara,

fomos tomar-lha, e sucedeu-nos bem.

Com üa armada grossa, que ajuntara

o vizo-rei de Goa, nos partimos


com toda a gente d'armas que se achara,

e com pouco trabalho destruímos

a gente no curvo arco exercitada;

com mortes, com incêndios, os punimos.

Era a ilha com águas alagada,

de modo que se andava em almadias;

enfim, outra Veneza trasladada.

Nela nos detivemos sós dous dias,

que foram para alguns os derradeiros,

que passaram de Estige as águas frias.

Que estes são os remédios verdadeiros

que para a vida estão aparelhados

aos que a querem ter por cavaleiros.

Oh, lavradores bem-aventurados!

Se conhecessem seu contentamento,

como vivem no campo sossegados!

Dá-lhes a justa terra o mantimento,

dá-lhes a fonte clara a água pura,

mungem suas ovelhas cento a cento.

Não vêm o mar irado, a noite escura,

por ir buscar a pedra do Oriente;

não temem o furor da guerra dura.

Vive um com suas árvores contente,

sem lhe quebrar o sono sossegado

o cuidado do ouro reluzente.

Se lhe falta o vestido perfumado,

e da fermosa cor assíria tinto,

e dos torçais atálicos lavrado;

se não tem as delicias de Corinto,

e se de Pário os mármores lhe faltam,

o piropo, a esmeralda, e o jacinto;

se suas casas d'ouro não se esmaltam,

esmalta-se-lhe o campo de mil flores,

onde os cabritos seus, comendo, saltam.

Ali amostra o campo várias cores,

vêm-se os ramos pender co fruto ameno,

ali se afina o canto dos pastores:

ali cantara Títiro e Sileno.

Enfim, por estas partes caminhou

a sã justiça para o Céu sereno.

Ditoso seja aquele que alcançou

poder viver na doce companhia

das mansas ovelhinhas que criou!

Este, bem facilmente alcançaria

as causas naturais de toda a cousa:

como se gera a chuva e neve fria;

os trabalhos do Sol, que não repousa;

e porque nos dá a Lua a luz alheia,

se tolher-nos de Febo os raios ousa;

e como tão depressa o Céu rodeia;

e como um só, os outros traz consigo;

e se é benina ou dura Citereia.

Bem mal pode entender isto que digo

quem há-de andar seguindo o fero Marte,

que traz os olhos sempre em seu perigo.

Porém seja, Senhor, de qualquer arte,

que, posto que a Fortuna possa tanto,

que tão longe de todo o bem me aparte,

não poderá apartar meu duro canto

desta obrigação sua, enquanto a morte


me não entrega ao duro Radamanto,

—se para tristes há tão leda sorte.