Difference between revisions of "Sena, Jorge de - Livro Proibido"
Line 30: | Line 30: | ||
a que se encontra se se não procura.<br /> | a que se encontra se se não procura.<br /> | ||
<br /> | <br /> | ||
− | “As Evidências” (1955) | + | “As Evidências” (1955)<br /> |
− | Não hei-de morrer sem saber | + | Não hei-de morrer sem saber<br /> |
− | qual a cor da liberdade” | + | qual a cor da liberdade”<br /> |
− | J. de S. | + | J. de S.<br /> |
− | Qual a cor da liberdade? | + | Qual a cor da liberdade?<br /> |
+ | É verde, verde e vermelha.<br /> | ||
+ | <br /> | ||
+ | Quase, quase cinquenta anos<br /> | ||
+ | reinaram neste país,<br /> | ||
+ | e conta de tantos danos,<br /> | ||
+ | de tantos crimes e enganos,<br /> | ||
+ | chegava até à raiz.<br /> | ||
+ | <br /> | ||
+ | Qual a cor da liberdade?<br /> | ||
+ | É verde, verde e vermelha.<br /> | ||
+ | <br /> | ||
+ | Tantos morreram sem ver<br /> | ||
+ | o dia do despertar!<br /> | ||
+ | Tantos sem poder saber<br /> | ||
+ | com que letras escrever,<br /> | ||
+ | com que palavras gritar!<br /> | ||
+ | <br /> | ||
+ | Qual a cor da liberdade?<br /> | ||
+ | É verde, verde e vermelha.<br /> | ||
+ | <br /> | ||
+ | Essa paz de cemitério<br /> | ||
+ | toda prisão ou censura.<br /> | ||
+ | e o poder feito galdério,<br /> | ||
+ | sem limite e sem cautério,<br /> | ||
+ | todo embófio e sinecura.<br /> | ||
+ | <br /> | ||
+ | Qual a cor da liberdade?<br /> | ||
É verde, verde e vermelha. | É verde, verde e vermelha. | ||
− | + | Esses ricos sem vergonha,<br /> | |
− | + | esses pobres sem futuro,<br /> | |
− | + | essa emigração medonha,<br /> | |
− | + | e a tristeza uma peçonha<br /> | |
− | + | envenenando o ar puro.<br /> | |
− | + | <br /> | |
− | + | Qual a cor da liberdade?<br /> | |
− | + | É verde, verde e vermelha.<br /> | |
− | + | <br /> | |
− | + | Essas guerra de além-mar<br /> | |
− | + | gastando as armas e a gente,<br /> | |
− | + | esse morrer e matar<br /> | |
− | + | sem sinal de se acabar<br /> | |
− | + | por política demente.<br /> | |
− | + | <br /> | |
− | + | Qual a cor da liberdade?<br /> | |
− | + | É verde, verde e vermelha.<br /> | |
− | + | <br /> | |
− | + | Esse perder-se no mundo<br /> | |
− | + | o nome de Portugal,<br /> | |
− | + | essa amargura sem fundo,<br /> | |
− | + | só miséria sem segundo,<br /> | |
− | + | só desespero fatal.<br /> | |
− | + | <br /> | |
− | + | Qual a cor da liberdade?<br /> | |
− | + | É verde, verde e vermelha.<br /> | |
− | + | <br /> | |
− | Esses ricos sem vergonha, | + | Quase, quase cinquenta anos<br /> |
− | esses pobres sem futuro, | + | durou esta eternidade,<br /> |
− | essa emigração medonha, | + | numa sombra de gusanos<br /> |
− | e a tristeza uma peçonha | + | e em negócios de ciganos,<br /> |
− | envenenando o ar puro. | + | entre mentira e maldade.<br /> |
− | + | <br /> | |
− | Qual a cor da liberdade? | + | Qual a cor da liberdade?<br /> |
− | É verde, verde e vermelha. | + | É verde, verde e vermelha.<br /> |
− | + | <br /> | |
− | Essas guerra de além-mar | + | Saem tanques para a rua,<br /> |
− | gastando as armas e a gente, | + | sai o povo logo atrás:<br /> |
− | esse morrer e matar | + | estala enfim, altiva e nua,<br /> |
− | sem sinal de se acabar | + | com força que não recua,<br /> |
− | por política demente. | + | a verdade mais veraz.<br /> |
− | + | <br /> | |
− | Qual a cor da liberdade? | + | Qual a cor da liberdade?<br /> |
− | É verde, verde e vermelha. | + | É verde, verde e vermelha.<br /> |
− | + | <br /> | |
− | Esse perder-se no mundo | + | JORGE DE SENA<br /> |
− | o nome de Portugal, | + | https://revolucaoparaiso.wordpress.com/tag/jorge-de-sena/<br /> |
− | essa amargura sem fundo, | ||
− | só miséria sem segundo, | ||
− | só desespero fatal. | ||
− | |||
− | Qual a cor da liberdade? | ||
− | É verde, verde e vermelha. | ||
− | |||
− | Quase, quase cinquenta anos | ||
− | durou esta eternidade, | ||
− | numa sombra de gusanos | ||
− | e em negócios de ciganos, | ||
− | entre mentira e maldade. | ||
− | |||
− | Qual a cor da liberdade? | ||
− | É verde, verde e vermelha. | ||
− | |||
− | Saem tanques para a rua, | ||
− | sai o povo logo atrás: | ||
− | estala enfim, altiva e nua, | ||
− | com força que não recua, | ||
− | a verdade mais veraz. | ||
− | |||
− | Qual a cor da liberdade? | ||
− | É verde, verde e vermelha. | ||
− | |||
− | JORGE DE SENA | ||
− | https://revolucaoparaiso.wordpress.com/tag/jorge-de-sena/ | ||
Revision as of 12:49, 16 May 2024
- Jorge de Sena (1919-1978)
Jorge de Sena, um dos mais relevantes escritores de língua portuguesa do século XX.
Opositor à ditadura, com obras apreendidas pela Censura por se tratarem de “subversivas” e “pornográficas”, foi um dos protagonistas da Revolta da Sé, e “com ordem de prisão” pela PIDE, em agosto de 1959, exila-se no Brasil. Fugindo também à ditadura no Brasil, parte para os Estados Unidos, em 1965.
Tentado regressar à Europa, no dia 22 de dezembro de 1965 foi detido pela PIDE, durante 24 horas, quando tentava entrar em Portugal pela fronteira espanhola.
Depois do 25 de Abril de 1974, regressou a Portugal mas ficou apenas durante dois meses.
Acabou por falecer no dia 4 de Junho de 1978, em Santa Bárbara, na Califórnia.
- Livro Proibido: As Evidências - Vinte e um sonetos de um poema só
Livro de poesia publicado em 1955, classificado por David Mourão-Ferreira como uma "obra de categoria excecional" (cf. Vinte Poetas Contemporâneos, 2.ª ed., Lisboa, Ática, 1980, p. 168), e que obrigou o autor a sucessivas visitas à sede da pide/censura para desbloquear a publicação da obra, que deixaria transparecer um certo inconformismo político, quase marxista pela emancipação em prol da liberdade.
O poeta publicou As Evidências (Poema em 21 Sonetos) em Janeiro de 1955. O livro foi apreendido pela polícia política PIDE sob a acusação de "subversivo" e "pornográfico", conta-se numa cronologia na exposição sobre o espólio de Jorge de Sena, que pode ser visitada até hoje, na Biblioteca Nacional de Portugal (BNP).
No Prefácio à obra, o próprio Jorge de Sena afirma que Vinte e um sonetos de um poema só, foram fruto angustiosamente amadurecido de uma outra sinceridade: aquela que devemos a nós próprios e à nossa própria expressão, naqueles momentos, como que revelados, de aceitação transcendente, demasiado áspera para ser lembrada todos os dias, mesmo em presença da poesia, e de objetividade em face do mundo, demasiado incómoda para as vantagens quotidianas de sermos apenas nós próprios.(pág.14)
Deixai que a vida sobre vós repouse
qual como só de vós é consentida
enquanto em vós o que não sois não ouse
erguê-la ao nada a que regressa a vida.
Que única seja, e uma vez mais aquela
que nunca veio e nunca foi perdida.
Deixai-a ser a que se não revela
senão no ardor de não supor iguais
seus olhos de pensá-la outra mais bela.
Deixai-a ser a que não volta mais,
a ansiosa, inadiável, insegura,
a que se esquece dos sinais fatais,
a que é do tempo a ideada formosura,
a que se encontra se se não procura.
“As Evidências” (1955)
Não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade”
J. de S.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Quase, quase cinquenta anos
reinaram neste país,
e conta de tantos danos,
de tantos crimes e enganos,
chegava até à raiz.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Tantos morreram sem ver
o dia do despertar!
Tantos sem poder saber
com que letras escrever,
com que palavras gritar!
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Essa paz de cemitério
toda prisão ou censura.
e o poder feito galdério,
sem limite e sem cautério,
todo embófio e sinecura.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Esses ricos sem vergonha,
esses pobres sem futuro,
essa emigração medonha,
e a tristeza uma peçonha
envenenando o ar puro.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Essas guerra de além-mar
gastando as armas e a gente,
esse morrer e matar
sem sinal de se acabar
por política demente.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Esse perder-se no mundo
o nome de Portugal,
essa amargura sem fundo,
só miséria sem segundo,
só desespero fatal.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Quase, quase cinquenta anos
durou esta eternidade,
numa sombra de gusanos
e em negócios de ciganos,
entre mentira e maldade.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
Saem tanques para a rua,
sai o povo logo atrás:
estala enfim, altiva e nua,
com força que não recua,
a verdade mais veraz.
Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.
JORGE DE SENA
https://revolucaoparaiso.wordpress.com/tag/jorge-de-sena/
- Para saber mais:
https://comunidadeculturaearte.com/a-liberdade-na-vida-e-obra-de-jorge-de-sena/
https://xdata.bookmarc.pt/gulbenkian/cl/pdfs/172/PT.FCG.RCL.8904.pdf
https://www.publico.pt/2009/09/11/jornal/o-regresso-de-jorge-de-sena-17772400