Difference between revisions of "Venda, António Manuel"

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Escritor. Fez o ensino Primário em Monchique. É licenciado em Gestão de Empresas e pós-graduado em Marketing e Mercados Financeiros. Monchique, 1968.
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'''António Manuel Venda''' <br />
  
António Manuel Venda nasceu em Monchique, no sul de Portugal, em 1968. Publicou uma dezena e meia de livros de ficção e alguns títulos de outros géneros. Recebeu prémios literários de várias instituições: Centro Nacional de Cultura, Câmara Municipal de Almada, Instituto Abel Salazar, Secretaria de Estado da Cultura e Sociedade Portuguesa de Autores. Já houve quem escrevesse que «nos habituámos a ir descobrindo os seus livros como se fôssemos exploradores em busca da última mina perdida da escrita».
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Nasceu em Monchique, no sul de Portugal, em 1968.<br />
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Fez o ensino Primário em Monchique. <br />
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É licenciado em Gestão de Empresas e pós-graduado em Marketing e Mercados Financeiros. <br />
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Publicou uma dezena e meia de livros de ficção - romances, novelas, livros de contos e poesia.<br />
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Recebeu prémios literários de várias instituições: Centro Nacional de Cultura, Câmara Municipal de Almada, Instituto Abel Salazar, Secretaria de Estado da Cultura e Sociedade Portuguesa de Autores.<br />
  
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*'''A BRUXA DO BAIRRO ALTO DE S. ROQUE'''<br />
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(conto incluído no livro "Quando o Presidente da República Visitou Monchique por Mera Curiosidade", de António Manuel Venda - Editora Pergaminho, Portugal, 1996)<br />
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"O século ainda ia novo mas a vida, que às idades não parecia ligar muito, já andava outra vez agitada por Lisboa. Ele era milagres de Santo António dia sim dia não, ele era as pessoas a falarem do anjo que alguém tinha avistado no alto da torre da igreja de Nossa Senhora da Graça, ele era ainda outras criaturas, talvez mandadas por Deus e observadas por quem jurava a pés juntos que não eram foliões mascarados. E o bispo inquisidor, enquanto tão grandes maravilhas eram relatadas, lá se ia entretendo a mandar queimar hereges e judeus, uns por coisas vistas, outros porque, bem vistas as coisas, não haveria no reino deles necessidade.<br />
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Tudo isto, que já não era pouco, ia acontecendo ao mesmo tempo que os castelhanos arranhavam por terra a toda a hora e os franceses picavam por mar de vez em quando. E para ajudar à festa, El-Rei Todo Poderoso, o quinto João com que o reino alombava, ainda se punha a morder dentro das próprias fronteiras com impostos tais que a riqueza de jóias e vestes que à corte se via nunca antes fora assim notada. Mas o povo não era tão desligado como deixava parecer a quem o observava das varandas reais, e por isso nem a desculpa do ouro de terras de Santa Cruz o convencia de que nesses altos enxovais não figurava moeda plebeia.<br />
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Os casos de admirar eram tantos que os novos logo abafavam outros já bem repisados. E conseguiam-no mais pela força que tinham do que pela falta dela nos anteriores, pois cada um que surgia deixava três ou quatro para trás em matéria de falatórios. Nunca se pensara que no reino pudessem vir a caber todos, mas eles iam cabendo, e isso era uma coisa que ninguém desmentia, tanto mais que Deus também não dava mostras de querer fazê-lo.<br />
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Foi por esses tempos que se começou a falar na Bruxa do Bairro Alto de S. Roque. Inês Duarte, que tinha sido o nome que ao baptismo lhe calhara, apareceu de repente aos olhos de todos como uma criatura destinada a tornar ainda mais notável aquele ano de mil setecentos e seis. Deu-se isso de forma tão espantosa que o bispo inquisidor se encarregou de a levar assim que o caso lhe chegou aos ouvidos. E decerto que não iria tardar muito a mandar queimá-la no Rossio, de bruxas e feiticeiros acompanhada, numa fogueira bem grande, que assim era ao gosto do povo, assim D. João aprovava, assim Deus não se opunha, tão-pouco o Diabo, que esse toda a gente dizia ser das chamas apreciador certo.<br />
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A bruxa saiu à rua só com a pele do corpo, despida de cima a baixo, ou de baixo acima. Ao povo tanto fazia a subir como a descer, que os olhos viam o mesmo e a nudez não mudava vista de uma maneira ou de outra. E na frente de todos a criatura fartou-se de com as mãos dar prazer ao corpo, enquanto perguntava bem alto se por perto havia alguns homens em jeito de a comerem. E houve muitos, pois a tarde já ia adiantada e andavam muitas almas na rua, como era preceito a uma hora assim na cidade toda. Contaram-se por sete os homens que se lhe atiraram e por muito mais do que essa conta os que com grande pena lugar não conseguiram, e o mulherio gritou impropérios tais à tão diferente Inês que mais diferente a fez ainda. E houve sangue da perda da virgindade, e houve quem dissesse que um bicho assim não podia ser virgem, e houve ainda opiniões de que sendo sete os machos não havia mulher que resistisse por mais de má vida que fosse.<br />
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Ao sangue não ligou o bispo inquisidor, pois esse só queria a bruxa, sangrada ou por sangrar, que não seria por muito sangue ter que a fogueira não iria apresentar boas chamas. Já as mulheres do Bairro Alto de S. Roque ligaram, e assim lavaram a rua e desinfectaram a casa de Inês, e também varreram os vidros partidos do espelho grande do quarto, não fosse algum habitante futuro picar os pés. Para picar já bastavam os franceses, que o levasse o Diabo para bem longe do reino e dos impérios de além-mar.<br />
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O que deixava o povo sem saber ao certo o que pensar era que Inês sempre fora uma rapariga recatada e amiga da vizinhança, tanto que dela nunca tinha havido queixas no Bairro Alto de S. Roque. Chegou a dizer-se em Lisboa que até Frei Geraldo, da Ordem Terceira dos Franciscanos, já andava metido a averiguar por conta própria o mal daquela alma. Disseram-se tantas coisas em Lisboa por esses tempos, que estavam para chegar algarvios do Algarve e nortenhos do Norte e também outros de outros lugares para verem a bruxa. Ou pelo menos a queima, já que depois do que a Frei Geraldo acontecera só os guardas do bispo inquisidor dela se aproximavam.<br />
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- A mulher-bruxa, ou bruxa-mulher, como queira Vossa Alteza, D. João, Nosso Rei e Senhor, atirou-se-me para cima toda nua, pois roupa não quer e se alguém lha dá rasga-a logo! E não parava de me gritar "Padre, sou sua padre!"<br />
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E Frei Geraldo contou outras coisas ainda piores.<br />
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- De três guardas houve precisão para eu daquele tormento sair! E mesmo assim teve um deles que ficar por troca comigo, e depois foi encontrado por dez companheiros que acudiram à gritaria dele, com a roupa rasgada e à bruxa igual em nudez! E o que é certo é que se tratou de um caso de violação das grandes! Até as paredes haveriam de ser testemunhas se alguém tivesse artes para lhes dar voz!<br />
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Andavam todos tão ocupados a falarem do caso que nem estranhavam os ares do filho mais novo do ferreiro do Bairro de S. Roque, sempre metido pelos cantos e sem dizer palavra. Inês, para ele, não era bruxa e tão-pouco iria morrer na fogueira. Inês tinha ido para onde ele nem conseguia imaginar, se calhar definitivamente, e o mais certo era não voltar a vê-la nua como a vira no dia do aparecimento da bruxa ao povo e em tantas outras alturas das quais já perdera a conta.<br />
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Nesse dia, espreitando pelas frestas do telhado da casa de Inês, Crisanto viu-a sair da cama toda nua, como a bruxa tão igual a ela que até o povo fez confusão, e esse engano só ele compreendeu. Ficou de olhar suspenso enquanto ela se mirava ao espelho grande, do qual depois foram jogados os bocados. E viu-a duas vezes, no espelho uma de frente, de costas uma no quarto, e fortes foram as telhas que o impediram de à do quarto se atirar. Mas depois a respiração pareceu-lhe que lhe começava a faltar, pareceu-lhe que tudo dentro de si parava quanto Inês se vestiu e mesmo assim continuou nua no espelho. Viu-a calada e vestida e que os movimentos dela não eram acompanhados pela imagem, e a seguir começaram a sair insultos de dentro do vidro.<br />
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- Estou bem cansada de te seguir, grande vaca! Comida nunca tive, que tu em frente do espelho não comes, homens nunca conheci, que tu nunca tiveste um só que fosse, muito menos em lugar espelhado!<br />
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Inês pegou num espelho pequeno que tinha à cabeceira, mirou-se e não se viu, e do grande veio de novo a voz que a fazia tremer.<br />
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- Estou farta de te seguir! Quero é sair daqui para fora, que ao fim de dezanove anos qualquer uma perde a paciência.<br />
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Depois a imagem calou-se e pôs-se a fazer caretas. E Inês, já em desespero, tentou dar-lhe um pontapé, mas a perna foi-se-lhe através do espelho e a imagem aproveitou para puxá-la toda e saltar para fora ao mesmo tempo. Ficou então em liberdade e logo partiu a prisão de Inês com uma cadeira que estava mais à mão e foi à cozinha encher a barriga com o que havia para comer. Fez cara de quem tinha gostado e saiu à rua na figura que deixou o povo de boca aberta. Chamou pelos homens, sete acudiram, e muitos mais tiveram pena de para eles não haver lugar. Pena não teve Crisanto, que à verdade toda assistiu e só desceu do telhado quando a noite chegou à cidade.<br />
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In; http://www.portugal-linha.pt/contos/AVenda/avct1.html<br />
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António Manuel Venda nasceu em Monchique, no Algarve (sul de Portugal), em 1968. É licenciado em Gestão de Empresas e pós-graduado em Marketing e Mercados Financeiros. Desde muito novo que escreve, tendo publicado contos, crónicas e artigos em jornais e revistas.
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Em 1989, foi-lhe atribuído o Prémio Literatura na Universidade, do Instituto Abel Salazar, na cidade do Porto. No ano seguinte, no âmbito do Programa Cultura e Desenvolvimento, recebeu o Prémio de Literatura da Secretaria de Estado da Cultura e da Sociedade Portuguesa de Autores. Ainda em 1990, foi-lhe atribuído o Prémio DN Jovem «Descobrimentos Portugueses», que a Comissão para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses nunca lhe entregou. Foi ainda distinguido com o Prémio Revelação Inasset, do Centro Nacional de Cultura, em 1991, e com o Prémio Literário Cidade de Almada, em 1996. Publicou as seguintes obras: "Quando o Presidente da República Visitou Monchique por Mera Curiosidade", contos, Ed. Pergaminho, Portugal, 1996; "Os Abençoados Fiéis do Senhor S. Romão", novela, Ed. Pergaminho, Portugal, 1997; "Até Acabar com o Diabo", romance, Ed. Pergaminho, Portugal, 1998; "O Velho que Esperava por D. Sebastião", contos, Ed. Pergaminho, Portugal, 1999.
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http://www.portugal-linha.pt/opiniao/AVenda/index.html
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*'''Bibliografia'''
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1 - Uma noite com o fogo / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2018.
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2 - Uma visita aos algarves / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2018.
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3 - António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2017. 
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4 - O sorriso enigmático do javali / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2017.
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5 - O livrinho dos campeões : e outras histórias de um adepto do melhor clube do mundo / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2017.
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6 - O meu ídolo Sporting : e outras histórias de um adepto do melhor clube do mundo / António Manuel Venda ; pref. Augusto Inácio. - 1ª ed. - Barreiro : Topbooks, 2015.
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7 - Quando o Presidente da República visitou Monchique por mera curiosidade / António Manuel Venda. - 3ª ed. - Lisboa : Just Media, 2013. - 94, [2] p. 
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8 - EPUL : 40 anos / textos António Manuel Venda, João Carlos Fonseca ; fot. Arquivo da Câmara Municipal de Lisboa. - Lisboa : EPUL, cop. 2011.
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9 - O sorriso enigmático do javali : primeiras aventuras do pequeno Tukie / António Manuel Venda ; rev. Carlos Pinheiro. - Lisboa : Quetzal, D.L. 2010.
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10 - Respeitinho, que sou tua mãe! / Hernán Casciari ; trad. António Manuel Venda ; il. Bernardo Erlich ; rev. Isabel Piçarra Haber. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2008.
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11 - A história da Papisa Joana : romance / Arturo Ortega Blake ; trad. António Manuel Venda ; rev. Eda Lyra. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2008. - 370 p. ; 24 cm. -  - Tít. orig.: Ioannes Angelicus.
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12 - Human : recursos humanos e gestão / propr. Just Media ; dir. António Manuel Venda. - Lisboa : J.M., D.L. 2008-.
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13 - Uma noite com o fogo / António Manuel Venda ; rev. Carlos Pinheiro. - Lisboa : Quetzal, cop. 2009.
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14 - O que entra nos livros : romance / António Manuel Venda. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2007.
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15 - Contos de adúlteros desorientados / Juan José Millás ; trad. António Manuel Venda ; rev. Franscisca Rodrigues. - 1ª ed. - Lisboa : Temas e Debates, 2006.
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16 - O amor por entre os dedos / António Manuel Venda. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2005.
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17 - 40 anos de gestão das pessoas em Portugal / Associação Portuguesa dos Gestores e Técnicos dos Recursos Humanos ; texto António Manuel Venda. - 1ª ed. 
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18 - O medo longe de ti / António Manuel Venda. - 1ª ed. - Lisboa : Temas e Debates, 2003. - 178 p. ; 24 cm.
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19 - A família horrível / Thomas Brezina ; trad. António Manuel Venda ; il. Bernhard Förth. - 1ª ed. - Cascais : Arteplural, 2003.
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20 - Os sonhos e outras perigosas embirrações / António Manuel Venda. - [Lisboa] : Círculo de Leitores, imp. 2001.
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In: http://bibliografia.bnportugal.gov.pt/bnp/bnp.exe/q?mfn=53436&qf_AU==VENDA%2C%20ANTONIO%20MANUEL%2C%201968-
  
 
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Uma dezena de  publicados desde 1996. Nesse ano surgiu o surpreendente "Quando o Presidente da República visitou Monchique por Mera Curiosidade". O seu segundo romance, "Os Abençoados Fiéis do Senhor São Romão" (cuja acção decorre em Alferce, em 1911), acaba de ser reeditado na On Y Va. Com a mesma chancela acaba de sair o primeiro livro de poemas deste autor, "O cão atravessa a cidade".
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É com a leitura de um dos poemas desse livro que começa uma conversa sobre bichos e homens da serra algarvia e as estranhas histórias com ou sem mão de bruxa que por lá sucedem.
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"Esse cão que atravessa a cidade", confidencia o escritor à conversa com o jornalista Fernando Alves, "é o mesmo com que me cruzo quando ando pelas montanhas do sul. Ele veio com o dono à cidade".
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Ouça o programa "A Rede Social" com o escritor António Manuel Venda
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Nos romances de António Manuel Venda há sempre cães ladrando ao fundo dos povoados ou metidos em sarilhos. Assim os homens. Daí a pergunta do editor da "Rede Social": A homens e bichos podem acontecer as mesmas desditas? "Foi assim que aconteceu à minha vida", responde o escritor. "Isso é algo absolutamente normal, para mim. Reconheço que há muita tendência inventiva em muito do que escrevi, mas com frequência aquilo que escrevo parte do que me aconteceu. Ao contrário do que alguns possam pensar", remata António Manuel Venda, "não sou sequer muito imaginativo.
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Quando a vaca de Manuel Pizão perdeu o mugir, começou Severino Castanho a mugir. Mão de bruxa, claro. Quando a bruxa desfez o feitiço, Severino recuperou a fala, mas ganhou uma cauda de cão. "Aí, apanhou-me", responde António Manuel Venda. "Eu lembro-me exactamente do momento em que escrevi isso. Eu estava em Lisboa, era um jovem universitário com dificuldade em acordar, aparecia geralmente a meio da primeira aula, mas lembro-me desse dia em que acordei às cinco da manhã e tive de escrever esse capítulo. Essa história foi inventada. Mas a maioria das histórias contadas nesse e noutros livros resultam do que me era contado pela minha avó materna. As histórias da bruxa remetiam para uma bruxa que havia no sítio da Pedra Branca. O que eu fiz foi chamar ao lugar Corte da Pomba. Só lhe mudei o sítio.". Recentemente, António Manuel Venda convidou um homem antigo do Alferce para a apresentação da reedição do romance. "Aquilo era uma realidade muito próxima para ele. E ele disse-me que ainda gostava de conhecer a família da bruxa da Corte da Pomba".
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E o santo de São Romão, tantas vezes encontrado num faval, nunca mais fugiu? "Agora está na igreja da aldeia e nunca mais fugiu. Mas no tempo da minha avó, quando o traziam de volta, da Umbria ou de outros lugares, fugia logo. Até que um dia asselhou".
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O verbo asselhar, tal como era usado pela avó do escritor, leva dois ésses, sim senhor. "Foi assim que a minha avó contou. O santo fugia, iam buscá-lo, fugia de novo, até que um dia asselhou".
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Não é a única estranha palavra nesta conversa que se perde pelos caminhos da serra de Monchique, habitada por escalavardos e cujos pontos mais altos, a Fóia e a Picota são, tal como os descreve o escritor, dois dinossauros adormecidos.
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Contos Portugal  - O Ponto de Encontro da Lusofonia
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António Manuel Venda – assombramentos abençoados
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By hbarbasIn romancePosted on 27/09/2019
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António Manuel Venda nasceu em Monchique, no Sul de Portugal, em 1968. Publicou vários livros de ficção, alguns deles premiados. Já houve quem assinalasse que «nos habituámos a descobrir o seu mundo como se fôssemos exploradores em busca da última mina perdida da escrita». Daqui concordamos.
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Na circunstância do re-lançamento de «Os Abençoados Fiéis do Senhor S. Romão» (1997, 2019), tive oportunidade de revisitar algumas críticas que havia feito a livros deste autor, e recordar os outros – tenho sido uma leitora fiel. Lembro-me que me zanguei com «O Velho que esperava por D. Sebastião» e vejo agora que o motivo – sem justeza – era que tivesse abandonado o seu estilo e registo tão próprios. A escrita de A. M. V. continuou a caracterizar-se por um sistemático delírio narrativo. Histórias absurdas sucedem-se a um ritmo alucinante, cheias de humor e ironia, contadas numa linguagem rigorosa, que enfeitiçam o leitor.
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Mantém-se o jogo com os géneros literários – sabotando as várias determinações do “pacto narrativo” : oferece romance e são contos, capítulos e secções, vários episódios. Fragmentos, de onde o narrador nos fala das aventuras e desventuras vividas pelas várias personagens. Uma potencialidade do insólito só oferecida pela escrita. Este jogo com as expectativas, e a sua frustração a suscitar um sorriso, é a grande arma que encontramos nos primórdios do romance: recordo agora « The Life and Opinions of Tristram Shandy, Gentleman» (1759) de Laurence Sterne, «Jacques Le Fataliste et son maître» (1765-80) de Denis Diderot.
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Estreou-se, e assombrou-nos, com o premiado «Quando o Presidente da República Visitou Monchique por Mera Curiosidade» (1996, 1997, 2016), uma colectânea de contos insólitos, onde mistura regionalismo com surrealismo, o realismo com o fantástico, a uma cadência vertiginosa e numa linguagem primorosamente trabalhada. Em 1997, sobre «Os Abençoados Fiéis do Senhor S. Romão» disse: «já é possível falar de um universo ficcional particular com características próprias, de um tipo de escrita pessoal, de um «estilo» (pese embora a palavra estar teoricamente fora de moda), regidos por uma invulgar maturidade, um profundo conhecimento e uma brilhante exploração da língua portuguesa».
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A.M.V. joga com a grande necessidade humana – do leitor – de que as “coisas” façam sentido. O acto de leitura cria uma união lógica entre os fragmentos – que é proporcionada pela linguagem em si. Evoca uma «never ending story». Também a estratégia próxima dos contos, de «Short Cuts», ou «The Cathedral», de Raymond Carver, que aspiram à encenação, em filme (dir. Robert Altman, 1993) ou teatro. Ali, os episódios desgarrados unificam-se no cenário, no palco. Em «Os Abençoados Fiéis» também se unem pelo espaço – mas as cenas passam-se numa mesma aldeia no início do século. É também por intermédio da vizinhança, e dos encontros por ela suscitados, que são criadas as ligações das histórias entre si. Não se descobre, pois, uma intriga unificadora – nem mesmo através da suposta devoção ao Santo da terra que, neste caso, dá o título ao livro.
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A partir daqui evoluem os encadeamentos – entrelaçam-se momentos e episódios, e depois dos vários livros entre si, reescrevendo-os e reinscrevendo-os num novo contexto. Atribuindo velhos sonhos a novos sonhadores, instituiem-se como auto-citação. A união entre os diversos elementos parcelares alicerça-se também pelos tempos, e mais que tudo ainda pelo espaço – Monchique: um Algarve que se esquece que ainda pode existir no meio da invasão de estrangeiros que o vem ocupando. O autor convencionou pois interligá-los com um nome, Monchique –  lugar da sua infância. Mas a recorrência dos mesmos lugares, dos mesmos sítios, exibe-se como uma mesma geografia muito imaginária. Nunca nos é oferecida uma descrição específica que permita restringir, exclusivamente, qualquer das suas narrativas a coordenadas geográficas – nem mesmo quando das «experiências» de ficção científica. A.M.V. não faz descrições: os cenários são referidos pelas personagens, uma casa, uma árvore, um rio.
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Neste universo pseudo-cosmopolita, em Monchique, há poucas distracções: «entre o bordel e rádio – às vezes até com apoio da televisão cujas reportagens transformam em principais os conflitos secundários – aqui a embrenharem-se e interferirem com a história primeira, dá-se outra atenção aos pormenores da vida. Espia-se, coscuvilha-se, provoca-se, deduzem-se umas coisas e inventam-se outras» («Até acabar com o diabo Diabo» p.25). A linguagem continua dominada com a mesma maestria, a mesma oportunidade, a mistura de matizes e intenções: «Em meia hora se está na praça, isto no burro de Libório Arlindo, porque através da escrita é apenas uma questão de linhas. Aqui está o sapateiro a apregoar os seus artigos bem fresquinhos, ele chegou agora mesmo.» («Os Abençoados Fiéis» p.83).
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Os regionalismos das figuras e temas – que associei a Júlio Dinis, José do Riço Direitinho, João Aguiar – sabotam as comparações pelos seus anseios peculiares: as personagens humanas aspiram (algumas conseguem) ter as faculdades dos animais – voar, por exemplo; e as do reino animal exibem características humanóides – sabem falar, assobiar. Semelhantes entre si nos comportamentos e imaginário, desviam-se em direcção a um real mais supersticioso do que fantástico. Também mais verosímil,  o insólito é suscitado pela crueldade nascida da ignorância – chegando a um trágico muito próprio. Assim, as personagens – caracterizadas pelo nome-alcunha, pela profissão, pela linguagem, aqui e à distância ficam tão mais próximas de Gil Vicente. Usam de uma linguagem e de um mundo atávicos, essencialmente portugueses (o que quer que isso ainda hoje queira dizer neste agora).
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Helena Barbas, 4 de Julho de 2019
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https://www.helenabarbas.net/antonio-manuel-venda-assombramentos-abencoados/
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https://www.youtube.com/watch?v=rok12KKd2wg - António Manuel Venda lê um poema de "O Cão Atravessa a Cidade"
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SÁBADO, 12 DE OUTUBRO DE 2019
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ANTÓNIO MANUEL VENDA LANÇA SEGUNDO LIVRO DA SÉRIE «PEQUENO TUKIE»
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O escritor monchiquense António Manuel Venda apresentou hoje, na Galeria Santo António, em Monchique, o seu segundo livro da série «Pequeno Tukie», intitulado Uma serpente de luzes na planície.
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Nove anos depois da edição de O sorriso enigmático do javali, o pequeno Tukie volta ao convívio com os leitores de António Manuel Venda, esperando-se, novamente, um conjunto de histórias «feitas de espanto» e, como afirmava então Inês Fonseca Santos, «uma narrativa para partilhar e ler devagarinho».
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Publicada por Biblioteclando à(s) 20:08
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http://biblioteclando2.blogspot.com/2019/10/antonio-manuel-venda-lanca-segundo.html
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e pesquisa
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Autor:=VENDA, ANTONIO MANUEL, 1968-
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Revision as of 11:34, 28 June 2021

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António Manuel Venda

Nasceu em Monchique, no sul de Portugal, em 1968.
Fez o ensino Primário em Monchique.
É licenciado em Gestão de Empresas e pós-graduado em Marketing e Mercados Financeiros.
Publicou uma dezena e meia de livros de ficção - romances, novelas, livros de contos e poesia.
Recebeu prémios literários de várias instituições: Centro Nacional de Cultura, Câmara Municipal de Almada, Instituto Abel Salazar, Secretaria de Estado da Cultura e Sociedade Portuguesa de Autores.

  • A BRUXA DO BAIRRO ALTO DE S. ROQUE

(conto incluído no livro "Quando o Presidente da República Visitou Monchique por Mera Curiosidade", de António Manuel Venda - Editora Pergaminho, Portugal, 1996)

"O século ainda ia novo mas a vida, que às idades não parecia ligar muito, já andava outra vez agitada por Lisboa. Ele era milagres de Santo António dia sim dia não, ele era as pessoas a falarem do anjo que alguém tinha avistado no alto da torre da igreja de Nossa Senhora da Graça, ele era ainda outras criaturas, talvez mandadas por Deus e observadas por quem jurava a pés juntos que não eram foliões mascarados. E o bispo inquisidor, enquanto tão grandes maravilhas eram relatadas, lá se ia entretendo a mandar queimar hereges e judeus, uns por coisas vistas, outros porque, bem vistas as coisas, não haveria no reino deles necessidade.
Tudo isto, que já não era pouco, ia acontecendo ao mesmo tempo que os castelhanos arranhavam por terra a toda a hora e os franceses picavam por mar de vez em quando. E para ajudar à festa, El-Rei Todo Poderoso, o quinto João com que o reino alombava, ainda se punha a morder dentro das próprias fronteiras com impostos tais que a riqueza de jóias e vestes que à corte se via nunca antes fora assim notada. Mas o povo não era tão desligado como deixava parecer a quem o observava das varandas reais, e por isso nem a desculpa do ouro de terras de Santa Cruz o convencia de que nesses altos enxovais não figurava moeda plebeia.
Os casos de admirar eram tantos que os novos logo abafavam outros já bem repisados. E conseguiam-no mais pela força que tinham do que pela falta dela nos anteriores, pois cada um que surgia deixava três ou quatro para trás em matéria de falatórios. Nunca se pensara que no reino pudessem vir a caber todos, mas eles iam cabendo, e isso era uma coisa que ninguém desmentia, tanto mais que Deus também não dava mostras de querer fazê-lo.
Foi por esses tempos que se começou a falar na Bruxa do Bairro Alto de S. Roque. Inês Duarte, que tinha sido o nome que ao baptismo lhe calhara, apareceu de repente aos olhos de todos como uma criatura destinada a tornar ainda mais notável aquele ano de mil setecentos e seis. Deu-se isso de forma tão espantosa que o bispo inquisidor se encarregou de a levar assim que o caso lhe chegou aos ouvidos. E decerto que não iria tardar muito a mandar queimá-la no Rossio, de bruxas e feiticeiros acompanhada, numa fogueira bem grande, que assim era ao gosto do povo, assim D. João aprovava, assim Deus não se opunha, tão-pouco o Diabo, que esse toda a gente dizia ser das chamas apreciador certo.
A bruxa saiu à rua só com a pele do corpo, despida de cima a baixo, ou de baixo acima. Ao povo tanto fazia a subir como a descer, que os olhos viam o mesmo e a nudez não mudava vista de uma maneira ou de outra. E na frente de todos a criatura fartou-se de com as mãos dar prazer ao corpo, enquanto perguntava bem alto se por perto havia alguns homens em jeito de a comerem. E houve muitos, pois a tarde já ia adiantada e andavam muitas almas na rua, como era preceito a uma hora assim na cidade toda. Contaram-se por sete os homens que se lhe atiraram e por muito mais do que essa conta os que com grande pena lugar não conseguiram, e o mulherio gritou impropérios tais à tão diferente Inês que mais diferente a fez ainda. E houve sangue da perda da virgindade, e houve quem dissesse que um bicho assim não podia ser virgem, e houve ainda opiniões de que sendo sete os machos não havia mulher que resistisse por mais de má vida que fosse.
Ao sangue não ligou o bispo inquisidor, pois esse só queria a bruxa, sangrada ou por sangrar, que não seria por muito sangue ter que a fogueira não iria apresentar boas chamas. Já as mulheres do Bairro Alto de S. Roque ligaram, e assim lavaram a rua e desinfectaram a casa de Inês, e também varreram os vidros partidos do espelho grande do quarto, não fosse algum habitante futuro picar os pés. Para picar já bastavam os franceses, que o levasse o Diabo para bem longe do reino e dos impérios de além-mar.
O que deixava o povo sem saber ao certo o que pensar era que Inês sempre fora uma rapariga recatada e amiga da vizinhança, tanto que dela nunca tinha havido queixas no Bairro Alto de S. Roque. Chegou a dizer-se em Lisboa que até Frei Geraldo, da Ordem Terceira dos Franciscanos, já andava metido a averiguar por conta própria o mal daquela alma. Disseram-se tantas coisas em Lisboa por esses tempos, que estavam para chegar algarvios do Algarve e nortenhos do Norte e também outros de outros lugares para verem a bruxa. Ou pelo menos a queima, já que depois do que a Frei Geraldo acontecera só os guardas do bispo inquisidor dela se aproximavam.
- A mulher-bruxa, ou bruxa-mulher, como queira Vossa Alteza, D. João, Nosso Rei e Senhor, atirou-se-me para cima toda nua, pois roupa não quer e se alguém lha dá rasga-a logo! E não parava de me gritar "Padre, sou sua padre!"
E Frei Geraldo contou outras coisas ainda piores.
- De três guardas houve precisão para eu daquele tormento sair! E mesmo assim teve um deles que ficar por troca comigo, e depois foi encontrado por dez companheiros que acudiram à gritaria dele, com a roupa rasgada e à bruxa igual em nudez! E o que é certo é que se tratou de um caso de violação das grandes! Até as paredes haveriam de ser testemunhas se alguém tivesse artes para lhes dar voz!
Andavam todos tão ocupados a falarem do caso que nem estranhavam os ares do filho mais novo do ferreiro do Bairro de S. Roque, sempre metido pelos cantos e sem dizer palavra. Inês, para ele, não era bruxa e tão-pouco iria morrer na fogueira. Inês tinha ido para onde ele nem conseguia imaginar, se calhar definitivamente, e o mais certo era não voltar a vê-la nua como a vira no dia do aparecimento da bruxa ao povo e em tantas outras alturas das quais já perdera a conta.
Nesse dia, espreitando pelas frestas do telhado da casa de Inês, Crisanto viu-a sair da cama toda nua, como a bruxa tão igual a ela que até o povo fez confusão, e esse engano só ele compreendeu. Ficou de olhar suspenso enquanto ela se mirava ao espelho grande, do qual depois foram jogados os bocados. E viu-a duas vezes, no espelho uma de frente, de costas uma no quarto, e fortes foram as telhas que o impediram de à do quarto se atirar. Mas depois a respiração pareceu-lhe que lhe começava a faltar, pareceu-lhe que tudo dentro de si parava quanto Inês se vestiu e mesmo assim continuou nua no espelho. Viu-a calada e vestida e que os movimentos dela não eram acompanhados pela imagem, e a seguir começaram a sair insultos de dentro do vidro.
- Estou bem cansada de te seguir, grande vaca! Comida nunca tive, que tu em frente do espelho não comes, homens nunca conheci, que tu nunca tiveste um só que fosse, muito menos em lugar espelhado!
Inês pegou num espelho pequeno que tinha à cabeceira, mirou-se e não se viu, e do grande veio de novo a voz que a fazia tremer.
- Estou farta de te seguir! Quero é sair daqui para fora, que ao fim de dezanove anos qualquer uma perde a paciência.

Depois a imagem calou-se e pôs-se a fazer caretas. E Inês, já em desespero, tentou dar-lhe um pontapé, mas a perna foi-se-lhe através do espelho e a imagem aproveitou para puxá-la toda e saltar para fora ao mesmo tempo. Ficou então em liberdade e logo partiu a prisão de Inês com uma cadeira que estava mais à mão e foi à cozinha encher a barriga com o que havia para comer. Fez cara de quem tinha gostado e saiu à rua na figura que deixou o povo de boca aberta. Chamou pelos homens, sete acudiram, e muitos mais tiveram pena de para eles não haver lugar. Pena não teve Crisanto, que à verdade toda assistiu e só desceu do telhado quando a noite chegou à cidade.
In; http://www.portugal-linha.pt/contos/AVenda/avct1.html




António Manuel Venda nasceu em Monchique, no Algarve (sul de Portugal), em 1968. É licenciado em Gestão de Empresas e pós-graduado em Marketing e Mercados Financeiros. Desde muito novo que escreve, tendo publicado contos, crónicas e artigos em jornais e revistas. Em 1989, foi-lhe atribuído o Prémio Literatura na Universidade, do Instituto Abel Salazar, na cidade do Porto. No ano seguinte, no âmbito do Programa Cultura e Desenvolvimento, recebeu o Prémio de Literatura da Secretaria de Estado da Cultura e da Sociedade Portuguesa de Autores. Ainda em 1990, foi-lhe atribuído o Prémio DN Jovem «Descobrimentos Portugueses», que a Comissão para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses nunca lhe entregou. Foi ainda distinguido com o Prémio Revelação Inasset, do Centro Nacional de Cultura, em 1991, e com o Prémio Literário Cidade de Almada, em 1996. Publicou as seguintes obras: "Quando o Presidente da República Visitou Monchique por Mera Curiosidade", contos, Ed. Pergaminho, Portugal, 1996; "Os Abençoados Fiéis do Senhor S. Romão", novela, Ed. Pergaminho, Portugal, 1997; "Até Acabar com o Diabo", romance, Ed. Pergaminho, Portugal, 1998; "O Velho que Esperava por D. Sebastião", contos, Ed. Pergaminho, Portugal, 1999.

http://www.portugal-linha.pt/opiniao/AVenda/index.html


  • Bibliografia

1 - Uma noite com o fogo / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2018. 2 - Uma visita aos algarves / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2018. 3 - António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2017. 4 - O sorriso enigmático do javali / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2017. 5 - O livrinho dos campeões : e outras histórias de um adepto do melhor clube do mundo / António Manuel Venda. - 1ª ed. - [S.l.] : On y va, 2017. 6 - O meu ídolo Sporting : e outras histórias de um adepto do melhor clube do mundo / António Manuel Venda ; pref. Augusto Inácio. - 1ª ed. - Barreiro : Topbooks, 2015. 7 - Quando o Presidente da República visitou Monchique por mera curiosidade / António Manuel Venda. - 3ª ed. - Lisboa : Just Media, 2013. - 94, [2] p. 8 - EPUL : 40 anos / textos António Manuel Venda, João Carlos Fonseca ; fot. Arquivo da Câmara Municipal de Lisboa. - Lisboa : EPUL, cop. 2011. 9 - O sorriso enigmático do javali : primeiras aventuras do pequeno Tukie / António Manuel Venda ; rev. Carlos Pinheiro. - Lisboa : Quetzal, D.L. 2010. 10 - Respeitinho, que sou tua mãe! / Hernán Casciari ; trad. António Manuel Venda ; il. Bernardo Erlich ; rev. Isabel Piçarra Haber. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2008. 11 - A história da Papisa Joana : romance / Arturo Ortega Blake ; trad. António Manuel Venda ; rev. Eda Lyra. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2008. - 370 p. ; 24 cm. - - Tít. orig.: Ioannes Angelicus. 12 - Human : recursos humanos e gestão / propr. Just Media ; dir. António Manuel Venda. - Lisboa : J.M., D.L. 2008-. 13 - Uma noite com o fogo / António Manuel Venda ; rev. Carlos Pinheiro. - Lisboa : Quetzal, cop. 2009. 14 - O que entra nos livros : romance / António Manuel Venda. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2007. 15 - Contos de adúlteros desorientados / Juan José Millás ; trad. António Manuel Venda ; rev. Franscisca Rodrigues. - 1ª ed. - Lisboa : Temas e Debates, 2006. 16 - O amor por entre os dedos / António Manuel Venda. - 1ª ed. - Porto : Ambar, 2005. 17 - 40 anos de gestão das pessoas em Portugal / Associação Portuguesa dos Gestores e Técnicos dos Recursos Humanos ; texto António Manuel Venda. - 1ª ed. 18 - O medo longe de ti / António Manuel Venda. - 1ª ed. - Lisboa : Temas e Debates, 2003. - 178 p. ; 24 cm. 19 - A família horrível / Thomas Brezina ; trad. António Manuel Venda ; il. Bernhard Förth. - 1ª ed. - Cascais : Arteplural, 2003. 20 - Os sonhos e outras perigosas embirrações / António Manuel Venda. - [Lisboa] : Círculo de Leitores, imp. 2001.

In: http://bibliografia.bnportugal.gov.pt/bnp/bnp.exe/q?mfn=53436&qf_AU==VENDA%2C%20ANTONIO%20MANUEL%2C%201968-

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Uma dezena de publicados desde 1996. Nesse ano surgiu o surpreendente "Quando o Presidente da República visitou Monchique por Mera Curiosidade". O seu segundo romance, "Os Abençoados Fiéis do Senhor São Romão" (cuja acção decorre em Alferce, em 1911), acaba de ser reeditado na On Y Va. Com a mesma chancela acaba de sair o primeiro livro de poemas deste autor, "O cão atravessa a cidade".

É com a leitura de um dos poemas desse livro que começa uma conversa sobre bichos e homens da serra algarvia e as estranhas histórias com ou sem mão de bruxa que por lá sucedem.

"Esse cão que atravessa a cidade", confidencia o escritor à conversa com o jornalista Fernando Alves, "é o mesmo com que me cruzo quando ando pelas montanhas do sul. Ele veio com o dono à cidade".


Ouça o programa "A Rede Social" com o escritor António Manuel Venda


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Endereço de e-mail SUBSCREVER Nos romances de António Manuel Venda há sempre cães ladrando ao fundo dos povoados ou metidos em sarilhos. Assim os homens. Daí a pergunta do editor da "Rede Social": A homens e bichos podem acontecer as mesmas desditas? "Foi assim que aconteceu à minha vida", responde o escritor. "Isso é algo absolutamente normal, para mim. Reconheço que há muita tendência inventiva em muito do que escrevi, mas com frequência aquilo que escrevo parte do que me aconteceu. Ao contrário do que alguns possam pensar", remata António Manuel Venda, "não sou sequer muito imaginativo.

Quando a vaca de Manuel Pizão perdeu o mugir, começou Severino Castanho a mugir. Mão de bruxa, claro. Quando a bruxa desfez o feitiço, Severino recuperou a fala, mas ganhou uma cauda de cão. "Aí, apanhou-me", responde António Manuel Venda. "Eu lembro-me exactamente do momento em que escrevi isso. Eu estava em Lisboa, era um jovem universitário com dificuldade em acordar, aparecia geralmente a meio da primeira aula, mas lembro-me desse dia em que acordei às cinco da manhã e tive de escrever esse capítulo. Essa história foi inventada. Mas a maioria das histórias contadas nesse e noutros livros resultam do que me era contado pela minha avó materna. As histórias da bruxa remetiam para uma bruxa que havia no sítio da Pedra Branca. O que eu fiz foi chamar ao lugar Corte da Pomba. Só lhe mudei o sítio.". Recentemente, António Manuel Venda convidou um homem antigo do Alferce para a apresentação da reedição do romance. "Aquilo era uma realidade muito próxima para ele. E ele disse-me que ainda gostava de conhecer a família da bruxa da Corte da Pomba".

E o santo de São Romão, tantas vezes encontrado num faval, nunca mais fugiu? "Agora está na igreja da aldeia e nunca mais fugiu. Mas no tempo da minha avó, quando o traziam de volta, da Umbria ou de outros lugares, fugia logo. Até que um dia asselhou".

O verbo asselhar, tal como era usado pela avó do escritor, leva dois ésses, sim senhor. "Foi assim que a minha avó contou. O santo fugia, iam buscá-lo, fugia de novo, até que um dia asselhou".

Não é a única estranha palavra nesta conversa que se perde pelos caminhos da serra de Monchique, habitada por escalavardos e cujos pontos mais altos, a Fóia e a Picota são, tal como os descreve o escritor, dois dinossauros adormecidos.


Contos Portugal - O Ponto de Encontro da Lusofonia

António Manuel Venda Helena Barbas

Home ensino investigação artigos livros traduções jornalismo links vita António Manuel Venda – assombramentos abençoados By hbarbasIn romancePosted on 27/09/2019


António Manuel Venda nasceu em Monchique, no Sul de Portugal, em 1968. Publicou vários livros de ficção, alguns deles premiados. Já houve quem assinalasse que «nos habituámos a descobrir o seu mundo como se fôssemos exploradores em busca da última mina perdida da escrita». Daqui concordamos.

Na circunstância do re-lançamento de «Os Abençoados Fiéis do Senhor S. Romão» (1997, 2019), tive oportunidade de revisitar algumas críticas que havia feito a livros deste autor, e recordar os outros – tenho sido uma leitora fiel. Lembro-me que me zanguei com «O Velho que esperava por D. Sebastião» e vejo agora que o motivo – sem justeza – era que tivesse abandonado o seu estilo e registo tão próprios. A escrita de A. M. V. continuou a caracterizar-se por um sistemático delírio narrativo. Histórias absurdas sucedem-se a um ritmo alucinante, cheias de humor e ironia, contadas numa linguagem rigorosa, que enfeitiçam o leitor.

Mantém-se o jogo com os géneros literários – sabotando as várias determinações do “pacto narrativo” : oferece romance e são contos, capítulos e secções, vários episódios. Fragmentos, de onde o narrador nos fala das aventuras e desventuras vividas pelas várias personagens. Uma potencialidade do insólito só oferecida pela escrita. Este jogo com as expectativas, e a sua frustração a suscitar um sorriso, é a grande arma que encontramos nos primórdios do romance: recordo agora « The Life and Opinions of Tristram Shandy, Gentleman» (1759) de Laurence Sterne, «Jacques Le Fataliste et son maître» (1765-80) de Denis Diderot.

Estreou-se, e assombrou-nos, com o premiado «Quando o Presidente da República Visitou Monchique por Mera Curiosidade» (1996, 1997, 2016), uma colectânea de contos insólitos, onde mistura regionalismo com surrealismo, o realismo com o fantástico, a uma cadência vertiginosa e numa linguagem primorosamente trabalhada. Em 1997, sobre «Os Abençoados Fiéis do Senhor S. Romão» disse: «já é possível falar de um universo ficcional particular com características próprias, de um tipo de escrita pessoal, de um «estilo» (pese embora a palavra estar teoricamente fora de moda), regidos por uma invulgar maturidade, um profundo conhecimento e uma brilhante exploração da língua portuguesa».

A.M.V. joga com a grande necessidade humana – do leitor – de que as “coisas” façam sentido. O acto de leitura cria uma união lógica entre os fragmentos – que é proporcionada pela linguagem em si. Evoca uma «never ending story». Também a estratégia próxima dos contos, de «Short Cuts», ou «The Cathedral», de Raymond Carver, que aspiram à encenação, em filme (dir. Robert Altman, 1993) ou teatro. Ali, os episódios desgarrados unificam-se no cenário, no palco. Em «Os Abençoados Fiéis» também se unem pelo espaço – mas as cenas passam-se numa mesma aldeia no início do século. É também por intermédio da vizinhança, e dos encontros por ela suscitados, que são criadas as ligações das histórias entre si. Não se descobre, pois, uma intriga unificadora – nem mesmo através da suposta devoção ao Santo da terra que, neste caso, dá o título ao livro.

A partir daqui evoluem os encadeamentos – entrelaçam-se momentos e episódios, e depois dos vários livros entre si, reescrevendo-os e reinscrevendo-os num novo contexto. Atribuindo velhos sonhos a novos sonhadores, instituiem-se como auto-citação. A união entre os diversos elementos parcelares alicerça-se também pelos tempos, e mais que tudo ainda pelo espaço – Monchique: um Algarve que se esquece que ainda pode existir no meio da invasão de estrangeiros que o vem ocupando. O autor convencionou pois interligá-los com um nome, Monchique – lugar da sua infância. Mas a recorrência dos mesmos lugares, dos mesmos sítios, exibe-se como uma mesma geografia muito imaginária. Nunca nos é oferecida uma descrição específica que permita restringir, exclusivamente, qualquer das suas narrativas a coordenadas geográficas – nem mesmo quando das «experiências» de ficção científica. A.M.V. não faz descrições: os cenários são referidos pelas personagens, uma casa, uma árvore, um rio.

Neste universo pseudo-cosmopolita, em Monchique, há poucas distracções: «entre o bordel e rádio – às vezes até com apoio da televisão cujas reportagens transformam em principais os conflitos secundários – aqui a embrenharem-se e interferirem com a história primeira, dá-se outra atenção aos pormenores da vida. Espia-se, coscuvilha-se, provoca-se, deduzem-se umas coisas e inventam-se outras» («Até acabar com o diabo Diabo» p.25). A linguagem continua dominada com a mesma maestria, a mesma oportunidade, a mistura de matizes e intenções: «Em meia hora se está na praça, isto no burro de Libório Arlindo, porque através da escrita é apenas uma questão de linhas. Aqui está o sapateiro a apregoar os seus artigos bem fresquinhos, ele chegou agora mesmo.» («Os Abençoados Fiéis» p.83).

Os regionalismos das figuras e temas – que associei a Júlio Dinis, José do Riço Direitinho, João Aguiar – sabotam as comparações pelos seus anseios peculiares: as personagens humanas aspiram (algumas conseguem) ter as faculdades dos animais – voar, por exemplo; e as do reino animal exibem características humanóides – sabem falar, assobiar. Semelhantes entre si nos comportamentos e imaginário, desviam-se em direcção a um real mais supersticioso do que fantástico. Também mais verosímil, o insólito é suscitado pela crueldade nascida da ignorância – chegando a um trágico muito próprio. Assim, as personagens – caracterizadas pelo nome-alcunha, pela profissão, pela linguagem, aqui e à distância ficam tão mais próximas de Gil Vicente. Usam de uma linguagem e de um mundo atávicos, essencialmente portugueses (o que quer que isso ainda hoje queira dizer neste agora).

Helena Barbas, 4 de Julho de 2019 https://www.helenabarbas.net/antonio-manuel-venda-assombramentos-abencoados/

https://www.youtube.com/watch?v=rok12KKd2wg - António Manuel Venda lê um poema de "O Cão Atravessa a Cidade"


SÁBADO, 12 DE OUTUBRO DE 2019 ANTÓNIO MANUEL VENDA LANÇA SEGUNDO LIVRO DA SÉRIE «PEQUENO TUKIE»


O escritor monchiquense António Manuel Venda apresentou hoje, na Galeria Santo António, em Monchique, o seu segundo livro da série «Pequeno Tukie», intitulado Uma serpente de luzes na planície. Nove anos depois da edição de O sorriso enigmático do javali, o pequeno Tukie volta ao convívio com os leitores de António Manuel Venda, esperando-se, novamente, um conjunto de histórias «feitas de espanto» e, como afirmava então Inês Fonseca Santos, «uma narrativa para partilhar e ler devagarinho». Publicada por Biblioteclando à(s) 20:08 http://biblioteclando2.blogspot.com/2019/10/antonio-manuel-venda-lanca-segundo.html e pesquisa Autor:=VENDA, ANTONIO MANUEL, 1968- 20 registos encontrados ADICIONAR TODOS | RETIRAR TODOS