Difference between revisions of "Rosa, António Ramos - Obras Proibidas"

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*'''Obras Proibidas'''
 
*'''Obras Proibidas'''
  '''António Ramos Rosa'''  publicou mais de 50 livros de poesia, mas não encontramos indicação de que foram censurados. Nesta wiki iremos ler o poema de ARR publicado na censurada '''Antologia da Poesia Erótica e Satírica''' de Natália Correia e de um poema da revista '''Árvore'''.<br />ARR em entrevista ao Expresso, em 1988,[https://expresso.pt/premio-pessoa/laureados/2010-10-31-Laureado-Premio-Pessoa-1988---Antonio-Ramos-Rosa] diz:<br />"Vim para Lisboa em 1945. Estive cá dois anos. Depois voltei para Faro. Integrei-me então no Movimento de Unidade Democrática - o MUD Juvenil, onde tive uma grande atividade militante, tendo por isso estado preso [1947];"A primeira delas [das revistas literárias de que fui diretor] foi a Árvore, e foi a mais importante. Foi proibida pela Censura, pela PIDE".
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  '''António Ramos Rosa'''  publicou mais de 50 livros de poesia, mas não encontramos indicação de que foram censurados. Nesta wiki iremos ler o poema de ARR publicado na censurada '''Antologia da Poesia Erótica e Satírica''' de Natália Correia e de um poema da revista '''Árvore'''.<br />ARR em entrevista ao Expresso, em 1988,[https://expresso.pt/premio-pessoa/laureados/2010-10-31-Laureado-Premio-Pessoa-1988---Antonio-Ramos-Rosa] diz:<br />"Vim para Lisboa em 1945. Estive cá dois anos. Depois voltei para Faro. Integrei-me então no Movimento de Unidade Democrática - o MUD Juvenil, onde tive uma grande atividade militante, tendo por isso estado preso [1947];<br />"A primeira delas [das revistas literárias de que fui diretor] foi a Árvore, e foi a mais importante. Foi proibida pela Censura, pela PIDE".
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Revision as of 14:41, 12 June 2024

António Ramos Rosa - Retrato por Gracinda Candeias no seu facebook.PNG ARR-Arvore.jpg ARR-poema-Dia-de-Verao.jpg

  • António Vitor Ramos Rosa (Faro, 1924 - Lisboa, 2013)
Poeta, escritor, ensaísta, crítico literário, tradutor e desenhador. Fez parte do MUD Juvenil e por isso esteve preso. Foi diretor de várias revistas literárias [Árvore, Cassiopeia, Cadernos do Meio-Dia, ...) que sofreram algum tipo de censura.
  • Obras Proibidas
António Ramos Rosa  publicou mais de 50 livros de poesia, mas não encontramos indicação de que foram censurados. Nesta wiki iremos ler o poema de ARR publicado na censurada Antologia da Poesia Erótica e Satírica de Natália Correia e de um poema da revista Árvore.
ARR em entrevista ao Expresso, em 1988,[1] diz:
"Vim para Lisboa em 1945. Estive cá dois anos. Depois voltei para Faro. Integrei-me então no Movimento de Unidade Democrática - o MUD Juvenil, onde tive uma grande atividade militante, tendo por isso estado preso [1947];
"A primeira delas [das revistas literárias de que fui diretor] foi a Árvore, e foi a mais importante. Foi proibida pela Censura, pela PIDE".
  • Poema 1
  • Dia de Verão

Contra a muralha de ar
desfaço os nós da cinza dura
a ânsia larga larga
lucidamente embarco no meu corpo
e no ar
onde mulheres vivas rompem
com o sangue do Verão
rodopiando ancas sonoras
giram na vertigem direitas contra
a força do ar caindo como uma onda
sobre o sexo que respira violentamente
abertas vulvas felizes na febre fresca
corpos de seda e sede
livres em cada poro que o ar e a luz penetram
desfazendo todos os nós no ar
altas frescas fortalezas
Correia-Natalia-capafoto-antologiadepoesiaerotivaportuguesa.jpgARR-poema-Dia-de-Verao.jpg
in Antologia da Poesia Erótica e Satírica, página 482.

  • Poema 2
  • Mãe

Conheço a tua força, mãe, e a tua fragilidade.
Uma e outra têm a tua coragem, o teu alento vital.
Estou contigo mãe, no teu sonho permanente na tua esperança incerta
Estou contigo na tua simplicidade e nos teus gestos generosos.
Vejo-te menina e noiva, vejo-te mãe mulher de trabalho
Sempre frágil e forte. Quantos problemas enfrentaste,
Quantas aflições! Sempre uma força te erguia vertical,
sempre o alento da tua fé, o prodigioso alento
a que se chama Deus. Que existe porque tu o amas,
tu o desejas. Deus alimenta-te e inunda a tua fragilidade.
E assim estás no meio do amor como o centro da rosa.
Essa ânsia de amor de toda a tua vida é uma onda incandescente.
Com o teu amor humano e divino
quero fundir o diamante do fogo universal.

in Antologia poética


  • Poema 3
  • Não posso adiar o amor


Não posso adiar o amor
para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque
na garganta
ainda que o ódio estale
e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese
séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore,
não posso adiar para
outro século a minha
vida
nem o meu amor
nem o meu grito de
libertação
Não posso adiar o coração

In Viagem Através de Uma Nebulosa

  • Poema 4

Rotações

Como num ritual litúrgico-pagão:
se reparte O alimento elementar
à chama que nos anima.
O pomo sazonado ou o sabor primeiro.
A seiva inebriante. A palavra reveladora
Corrente transmissível no círculo iniciático.
Recolhimento-expansão. Polaridade no Uno.
E a unanimidade se estende aos objetos
de sustentação do culto: a matéria ainda
tão próxima das fontes que se pressente
nela a mesma vibração.
Respiram amplamente em nós os elementos
na mais perfeita osmose. Sortilégio este:
a aliança cósmica em louvor da vida.

  • Poema 5
  • Rotações 2

Se o repouso demorasse sobre a fronte
como um dom imanente. E a visão
distendida refletisse os veios de água,
os tufos das sementes emergindo com
seus frutos sobre a terra num manto
de esplendor como um brocado
E por toda a planura despertassem
modulações serenas de uma manhã de estio.
Se o horizonte se oferecesse como um
livro à dilatada, perene respiração.
Se transfigurado o imo ardente
em constelação perfeita culminasse.

  • Poema 6
  • Telegrama sem Classificação Especial

Ao Egito Gonçalves

Estamos nus e gramamos.

Na grama secular um passarinho verde
canta para um poema lírico, para um poeta lírico,
que se nasceu
é certo que não cantou.

As paisagens continuam a existir.
As paisagens são suaves.
Continuam também a existir
outras coisas
que dão matéria para poemas.
A vida continua.
Felizmente que há ódios, comichões, vaidades.
A estupidez, esta crassa crença intratável, esta confiança
indestrutível em si mesmo,
é o que felizmente dá uma densidade, uma plenitude a isto.

Num mundo descoroçoante de puras imagens
é bom este banho de resistências, pressões, vontades, atritos,
é bom navegar.
porque este presente é logo saudoso.

Na grama um passarinho canta.
Evidentemente que o poeta suicidou-se.

A vida continua.
Certas coisas que pareciam mortas
estão agora vivas ou, pelo menos, mexem-se.
Ausentes, dominam-nos.
Não é para nós que utilizam as palavras,
que insistem,
não é para nós!
Estes grandes ornamentos, estes sábios discursos
fluem em visões, em ondas, como se não no presente.
Ter-se-á o presente extinguido?
A vida continua tão improvávelmente.

Na grama um passarinho canta.
Canta por cantar, ou não, canta.

Eu poderia, com rigor, agora
cantar:

Os anjos exactos
que empunham tesouras
de encontro aos factos
- ó minhas senhoras!

Ou rigorosamente ainda,
com veemente exactidão,
inutilizar o poema,
todos os poemas
porque

Estamos nus e gramamos.

ARR-Arvore.jpgAntonioramosrosa-Telegrama.jpg
in Revista Árvore, Volume II - Primeiro Fascículo, pág. 30 e 31.
Nota: a Hemeroteca Digital de Lisboa disponibiliza aqui este n.º da Revista Árvore

  • 'Outros poemas

Antonioramorosa-livros-na-wook.png

  • Poema 7
  • Amor da palavra, amor do corpo

A nudez da palavra que te despe.
Que treme, esquiva.
Com os olhos dela te quero ver,
que não te vejo.
Boca na boca através de que boca
posso eu abrir-te e ver-te?
É meu receio que escreve e não o gosto
do sol de ver-te?
Todo o espaço dou ao espelho vivo
e do vazio te escuto.
Silêncio de vertigem, pausa, côncavo
de onde nasces, morres, brilhas, branca?
És palavra ou és corpo unido em nada?
É de mim que nasces ou do mundo solta?
Amorosa confusão, te perco e te acho,
à beira de nasceres tua boca toco
e o beijo é já perder-te.

  • Poema 8


PERDE-SE COM A IDADE um não sei quê
que era talvez sombra e sabor e até tristeza
e assim temos outra paz de inclinação
em clareiras limpas tocadas de algum eco
melancólico e lúcido E quase sem ilusão
entregamo-nos ao âmbito de uma paz
que é a medida do mundo quando nada
se nos oferece senão o habitar
aquelas horas de um universo que 
é no silêncio glória obscura e transparente

  • Poema 9


Dizem que é jardim
porque repousa
E diz-se também que se ilumina
em pausas
repentinas
Mas que dizer da trama
em movimento?
Que dizer do vento?
Que se prepara o incêndio
aqui na folha


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