Difference between revisions of "Sena, Jorge de - Livro Proibido"

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*'''Jorge de Sena''' (1919-1978)<br />
 
*'''Jorge de Sena''' (1919-1978)<br />
  
  '''Jorge de Sena''', um dos mais relevantes escritores de língua portuguesa do século XX.<br />Opositor à ditadura, com obras apreendidas pela Censura por se tratarem de “subversivas” e “pornográficas”, foi um dos protagonistas da Revolta da Sé, e “com ordem de prisão” pela PIDE, em agosto de 1959, exila-se no Brasil. Fugindo também à ditadura no Brasil, parte para os Estados Unidos, em 1965.<br />Tentado regressar à Europa, no dia 22 de dezembro de 1965 foi detido pela PIDE, durante 24 horas, quando tentava entrar em Portugal pela fronteira espanhola.<br />Depois do 25 de Abril de 1974, regressou a Portugal mas ficou apenas durante dois meses.<br />Acabou por falecer no dia 4 de Junho de, em Santa Bárbara, na Califórnia.
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  Escritor, poeta e professor. '''Jorge de Sena''' foi um dos mais relevantes escritores de língua portuguesa do século XX.<br />Opositor à ditadura, com obras apreendidas pela Censura por serem consideradas “subversivas” e “pornográficas”, foi um dos protagonistas da Revolta da Sé. “Com ordem de prisão” pela PIDE, em agosto de 1959, exilou-se no Brasil. Fugiu também da ditadura no Brasil e foi para os Estados Unidos, em 1965.<br />Tentou regressar à Europa, mas foi detido pela PIDE durante 24 horas, quando tentava entrar em Portugal pela fronteira espanhola. Depois do 25 de Abril de 1974, regressou a Portugal, mas ficou apenas dois meses. Faleceu no dia 4 de Junho de 1978, em Santa Bárbara, na Califórnia.<br />No documento acima reproduzido, pode ler a Declaração subscrita por vários oposicionistas portugueses, entre eles, Adolfo Casais Monteiro, Augusto Aragão e Jorge de Sena, dando o seu apoio à organização de um Movimento de oposição ao salazarismo, no Brasil .(Documento de 22/10/1961 do site da Fundação Mário Soares.)<br />[[File:Sena-jorge-excertodedocumento.PNG|600px]]<br />
  
*Livro Proibido: '''As Evidências - Vinte e um sonetos de um poema só'''<br />
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*'''Livro Proibido - AS EVIDÊNCIAS  Poema em Vinte e um Sonetos'''(1955)
  
  Livro de poesia publicado em 1955, classificado por David Mourão-Ferreira como uma "obra de categoria excecional" (cf. Vinte Poetas Contemporâneos, 2.ª ed., Lisboa, Ática, 1980, p. 168), e que obrigou o autor a sucessivas visitas à  sede da pide/censura para desbloquear a publicação da obra, que deixaria transparecer um certo inconformismo político, quase marxista pela emancipação em prol da liberdade.<br /> No Prefácio à obra, o próprio Jorge de Sena afirma que '''''Vinte e um sonetos de um poema só''''', ''foram fruto angustiosamente amadurecido de uma outra sinceridade; aquela que devemos a nós próprios e à nossa própria expressão, naqueles momentos, como que revelados, de aceitação transcendente, demasiado áspera para ser lembrada todos os dias, mesmo em presença da poesia, e de objetividade em face do mundo, demasiado incómoda para as vantagens quotidianas de sermos apenas nós próprios.''<br />
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  Livro de poesia publicado em 1955, classificado por '''David Mourão-Ferreira''' como uma "obra de categoria excecional", mas que obrigou o autor a sucessivas visitas à  sede da pide, para desbloquear a publicação da obra, por ser acusado de "subversivo" e "pornográfico", como se conta numa cronologia na exposição sobre o espólio de '''Jorge de Sena''' da Biblioteca Nacional de Portugal (BNP). <br />No Prefácio à obra, o próprio '''Jorge de Sena''' afirma que: '''Vinte e um sonetos de um poema só''' ''foram fruto angustiosamente amadurecido de uma outra sinceridade: aquela que devemos a nós próprios e à nossa própria expressão, naqueles momentos, como que revelados, de aceitação transcendente, demasiado áspera para ser lembrada todos os dias, mesmo em presença da poesia, e de objetividade em face do mundo, demasiado incómoda para as vantagens quotidianas de sermos apenas nós próprios.''(pág.14)
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*'''Poema 1 - V (Pág. 22)'''
  
 
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Da solidão que o vosso mal povoa<br />
Deixai que a vida sobre vós repouse<br />
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de monstruosas mãos e duros dentes,<br />
qual como só de vós é consentida<br />
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lá onde agudo um latido ecoa,<br />
enquanto em vós o que não sois não ouse<br />
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e o amor se esconde em piolhosos pentes;<br />
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Do vácuo fedorento, excrementício,<br />
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com que de roubos vosso rasto acaba<br />
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idêntico a vós próprios desde o início,<br />
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que desde sempre foi a mesma baba;<br />
 
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erguê-la ao nada a que regressa a vida.<br />
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Da solidão que dais e que roubais,<br />
Que única seja, e uma vez mais aquela<br />
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do vácuo que levais e que deixais,<br />
que nunca veio e nunca foi perdida.<br />
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do pavoroso nada que imitais<br />
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quando cobris dos ouropéis legais<br />
 
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Deixai-a ser a que se não revela<br />
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o horror de estardes sós em companhia -<br />
senão no ardor de não supor iguais<br />
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o mal que sois em mim se refugia. <br />  
seus olhos de pensá-la outra mais bela.<br />
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*'''Poema 2 - XIX'''
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Perdidas uma a uma as coisas todas,<br />
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os corpos e as estrelas, flores e rios<br />
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na construção do espírito sonhado,<br />
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humanamente vos haveis unido,<br />
 
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Deixai-a ser a que não volta mais,<br />
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para de além de tudo ainda regerdes<br />
a ansiosa, inadiável, insegura,<br />
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apenas pó a ser cindido um dia,<br />
a que se esquece dos sinais fatais,<br />
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que o que ficava, dissoluto o mundo,<br />
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a morte humana assim éreis num só,<br />
 
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a que é do tempo a ideada formosura,<br />
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ó deuses, formas de existir, presença,<br />
a que se encontra se se não procura.<br />
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tão sempre jovens e dourados mortos<br />
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de morte que é sol-posto ou madrugada,<br />
 
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“As Evidências” (1955)
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ó deuses do universo! – a tarde cai,<br />
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e, em vagas vozes de crianças rindo,<br />
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cindido tudo, ó deuses, regressai.<br />
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*'''Outros poemas de Jorge de Sena'''<br />
  
  
Mas o que evidencia esse poema em 21 sonetos tão pouco evidentes ao
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*'''Poema 3 - A Cor da Liberdade''' '''Lido por Turma 3 do PLA'''<br />
primeiro approach? Não é despiciendo o relato do autor quanto à «recepção»
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institucional que o livro sofreu ao ser publicado:
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Não hei de morrer sem saber<br />
O livrinho ficou impresso nos primeiros dias de Janeiro de 1955, foi logo apreendido pela pide […] e só pôde ser distribuído um mês depois de repetidas visitas à
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qual a cor da liberdade.<br />
Censura […]. O livro era, além de subversivo, pornográfico, segundo me repetia
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sistematicamente, com um sorriso ameno e algum sarcasmo nos olhos […] supo‑
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Eu não posso senão ser<br />
nho que o subdiretor que era um major ou tenente­‑coronel. Eu contestava que o
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desta terra em que nasci.<br />
livro, ora essa, não era nem uma coisa nem outra, e ele, dando­‑me palmadinhas
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Embora ao mundo pertença<br />
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e sempre a verdade vença,<br />
no joelho mais próximo, dizia: — Ora, ora… nós sabemos —. Ao fim de um
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qual será ser livre aqui,<br />
mês destas periódicas sessões, o livro foi libertado, e para dizer a pura verdade
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não hei de morrer sem saber.<br />
evidente, era realmente subversivo e, se não propriamente pornográfico, sem
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dúvida que respeitavelmente obsceno.14
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Trocaram tudo em maldade,<br />
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é quase um crime viver.<br />
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Mas, embora escondam tudo<br />
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e me queiram cego e mudo,<br />
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não hei de morrer sem saber<br />
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qual a cor da liberdade.<br />
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*Para saber mais:
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*'''Para saber mais:'''
  
 
https://comunidadeculturaearte.com/a-liberdade-na-vida-e-obra-de-jorge-de-sena/
 
https://comunidadeculturaearte.com/a-liberdade-na-vida-e-obra-de-jorge-de-sena/
  
 
https://xdata.bookmarc.pt/gulbenkian/cl/pdfs/172/PT.FCG.RCL.8904.pdf
 
https://xdata.bookmarc.pt/gulbenkian/cl/pdfs/172/PT.FCG.RCL.8904.pdf
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https://www.publico.pt/2009/09/11/jornal/o-regresso-de-jorge-de-sena-17772400

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  • Jorge de Sena (1919-1978)
Escritor, poeta e professor. Jorge de Sena foi um dos mais relevantes escritores de língua portuguesa do século XX.
Opositor à ditadura, com obras apreendidas pela Censura por serem consideradas “subversivas” e “pornográficas”, foi um dos protagonistas da Revolta da Sé. “Com ordem de prisão” pela PIDE, em agosto de 1959, exilou-se no Brasil. Fugiu também da ditadura no Brasil e foi para os Estados Unidos, em 1965.
Tentou regressar à Europa, mas foi detido pela PIDE durante 24 horas, quando tentava entrar em Portugal pela fronteira espanhola. Depois do 25 de Abril de 1974, regressou a Portugal, mas ficou apenas dois meses. Faleceu no dia 4 de Junho de 1978, em Santa Bárbara, na Califórnia.
No documento acima reproduzido, pode ler a Declaração subscrita por vários oposicionistas portugueses, entre eles, Adolfo Casais Monteiro, Augusto Aragão e Jorge de Sena, dando o seu apoio à organização de um Movimento de oposição ao salazarismo, no Brasil .(Documento de 22/10/1961 do site da Fundação Mário Soares.)
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  • Livro Proibido - AS EVIDÊNCIAS Poema em Vinte e um Sonetos(1955)
Livro de poesia publicado em 1955, classificado por David Mourão-Ferreira como uma "obra de categoria excecional", mas que obrigou o autor a sucessivas visitas à  sede da pide, para desbloquear a publicação da obra, por ser acusado de "subversivo" e "pornográfico", como se conta numa cronologia na exposição sobre o espólio de Jorge de Sena da Biblioteca Nacional de Portugal (BNP). 
No Prefácio à obra, o próprio Jorge de Sena afirma que: Vinte e um sonetos de um poema só foram fruto angustiosamente amadurecido de uma outra sinceridade: aquela que devemos a nós próprios e à nossa própria expressão, naqueles momentos, como que revelados, de aceitação transcendente, demasiado áspera para ser lembrada todos os dias, mesmo em presença da poesia, e de objetividade em face do mundo, demasiado incómoda para as vantagens quotidianas de sermos apenas nós próprios.(pág.14)
  • Poema 1 - V (Pág. 22)

Da solidão que o vosso mal povoa
de monstruosas mãos e duros dentes,
lá onde agudo um só latido ecoa,
e o amor se esconde em piolhosos pentes;

Do vácuo fedorento, excrementício,
com que de roubos vosso rasto acaba
idêntico a vós próprios desde o início,
que desde sempre foi a mesma baba;

Da solidão que dais e que roubais,
do vácuo que levais e que deixais,
do pavoroso nada que imitais
quando cobris dos ouropéis legais

o horror de estardes sós em companhia -
o mal que sois em mim se refugia.


  • Poema 2 - XIX

Perdidas uma a uma as coisas todas,
os corpos e as estrelas, flores e rios
na construção do espírito sonhado,
humanamente vos haveis unido,

para de além de tudo ainda regerdes
apenas pó a ser cindido um dia,
que o que ficava, dissoluto o mundo,
a morte humana assim éreis num só,

ó deuses, formas de existir, presença,
tão sempre jovens e dourados mortos
de morte que é sol-posto ou madrugada,

ó deuses do universo! – a tarde cai,
e, em vagas vozes de crianças rindo,
cindido tudo, ó deuses, regressai.


  • Outros poemas de Jorge de Sena


  • Poema 3 - A Cor da Liberdade Lido por Turma 3 do PLA

Não hei de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.

Eu não posso senão ser
desta terra em que nasci.
Embora ao mundo pertença
e sempre a verdade vença,
qual será ser livre aqui,
não hei de morrer sem saber.

Trocaram tudo em maldade,
é quase um crime viver.
Mas, embora escondam tudo
e me queiram cego e mudo,
não hei de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.

  • Para saber mais:

https://comunidadeculturaearte.com/a-liberdade-na-vida-e-obra-de-jorge-de-sena/

https://xdata.bookmarc.pt/gulbenkian/cl/pdfs/172/PT.FCG.RCL.8904.pdf

https://www.publico.pt/2009/09/11/jornal/o-regresso-de-jorge-de-sena-17772400